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Pré-vestibular popular mobiliza comunidade Bosque dos Caboclos, na Zona Oeste

No final de março, em uma assembleia geral da ADUR, estudantes pediram o apoio do sindicato para a construção de um pré-vestibular popular na localidade do Bosque dos Caboclos, em Campo Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro. A solicitação foi atendida e, três meses depois, o curso está em pleno funcionamento.

Sede da Associação de Moradores foi construída no início dos anos 2000 e abriga projetos de agricultura urbana, militância feminista, entre outros.

As aulas acontecem na Associação de Moradores e Amigos do Bosque dos Caboclos. Os encontros ocorrem nas noites de sextas-feiras e aos sábados durante todo o dia, de 10h às 19h. Os professores são voluntários, a maioria reside na Zona Oeste. Do lado de fora da sala de aula, tem sempre uma mesa com café e biscoitos e também é servido, gratuitamente, almoço para estudantes e professores. A comida é bem temperada e feita com dedicação e cuidado por moradoras da localidade.

Todos os sábados é servido almoço para estudantes e professores.

Rosangela Maria Oliveira de Souza é uma das voluntárias na cozinha. Enquanto prepara a comida, ela conta que desde que o pré-vestibular começou, seus sábados tem sim sido assim. “Eu estou adorando porque a comunidade nunca teve a chance de ter um pré-vestibular na associação. E a comunidade apoia a iniciativa. Essa pintura que você está vendo, nós compramos o material com o dinheiro do sindicato e os próprios alunos que fizeram”.

A filha de Rosangela, Eduarda Castro, é estudante de História da UFRRJ e foi quem iniciou a articulação para a construção do pré-vestibular popular. Ela conta que tentou iniciar um projeto de reforço escolar para adultos em 2012, mas que não durou muito tempo. No entanto, o projeto proporcionou que ela conhecesse Dona Rose, uma senhora que estava voltando a estudar, e desde então manteve contato.

“Dona Rose tem uma filha de 17 anos, a Jéssica, que já terminou o terceiro ano, mas com pendência em matemática. Ela tá bem perdida, querendo arrumar um emprego, sem saber onde procurar, sem conseguir terminar a matéria para pegar o diploma porque nunca tem professor. E eu nem posso ajudar em matemática porque não é minha área. Aí veio a ideia do pré vestibular, porque a Jéssica com certeza não é a única”, constatou Eduarda.

Uma das estudantes do pré-vestibular é Alessandra de Souza Neves, que cursa o terceiro ano do Ensino Médio no Colégio Estadual Profª. Jeanette de Souza Coelho Mannarino. Ela mora no centro de Campo Grande, mas a família não tem condições de pagar um pré-vestibular particular.

“E eu estou gostando. Como lá no colégio falta tempo para os professores ensinarem todas as coisas, eles aqui tem mais tempo, a gente entende um pouco mais. E eu gosto de perguntar, eu gosto de entender um pouquinho mais”, contou.

Decidida, Alessandra quer cursar Medicina e se especializar em oftalmologia cirúrgica. “Eu vi numa novela, essas novelas mexicanas, e achei interessante. Nas minhas férias eu busquei no Google o que era isso. Fui vendo que tem uma coisa que eu adoro. Eu sei que não posso sair curando todo mundo, mas eu queria muito operar as pessoas que sofreram acidentes ou têm doenças crônicas que dá para salvar a vista. Eu não posso salvar todo mundo, mas eu posso tentar, posso fazer a minha parte”, contou.

Outra aluna, bem diferente, mas também com a mesma certeza, é Selma Soares Rodrigues. Agora que os filhos já estão crescidos ela resolveu retomar os estudos e deseja cursar História. Selma soube do pré-vestibular porque integra o grupo Militância Feminista Bosque das Caboclas, que também acontece na Associação de Moradores, e convidou a amiga, Maria Alice de Freitas Monteiro, que mora em um bairro vizinho e deseja cursar Serviço Social.

“Eu acho a iniciativa legal. Dá oportunidade da gente realizar nossos sonhos, nossos projetos de progredir. Muitos não têm condições de pagar um curso e se preparar bem. E a gente sabe que a concorrência é grande. Mas os professores se mobilizaram para ajudar e eu estou aí para aprender”, assegurou Selma.

“Eu estou de boca aberta com a motivação dos professores. Porque é difícil não ganhar nada e, mesmo ganhando, ter a dedicação que eles têm. Não faltam, vem de longe e se a gente tem dúvidas eles estão sempre dispostos a explicar, a indicar sites. Me surpreendeu. E isso motiva a gente”, salientou Maria Alice.

Dentre os educadores está Camila Alves, que é moradora de Sepetiba e também atua como professora voluntária no Instituto de Formação Humana e Educação Popular (IFHEP) em Campo Grande. Ela conta que teve sua primeira experiência docente lecionando em um pré-vestibular comunitário quando ainda estava no primeiro ano de graduação. Envolvida em grupos de militância da Zona Oeste, ela fala sobre a importância do pré-vestibular para a localidade:

Camila é professora de geografia formada pela UERJ e atua, desde a graduação em pré-vestibulares comunitários.

“O acesso aqui é muito difícil, tanto a mobilidade quanto a questão socioeconômica. Esse movimento do pré-vestibular é histórico, nós estamos sendo pioneiros em trazer, minimamente, o acesso a informação para essas pessoas terem a oportunidade de ingressar numa universidade pública. E trazer isso para cá é um orgulho imenso, uma vitória muito grande”.

 

Protagonismo feminino

Bosque dos Caboclos é uma localidade em Campo Grande fruto de uma ocupação urbana. Na década de 1990 trabalhadores ocuparam o espaço, montaram barracas e depois construíram as primeiras casas da região.

Dona Hellen promoveu oficinas artísticas diversas na Associação de Moradores desde que assumiu a presidência.

“Aqui é uma ocupação urbana que tem mais de 20 anos e foi liderada por mulheres. Dona Hellen, que hoje é a presidente, foi uma dessas mulheres que fizeram esse movimento de conquista do território”, contou Camila.

Hellen Andrews é a presidenta da Associação de Moradores desde 2006. Ela nasceu em Uganda, mas veio para o Brasil ainda criança. No dia da ocupação seu papel foi tocar e cantar para manter as pessoas despertas. Artista autodidata (ela pinta, canta, toca instrumentos, compõe), desde que assumiu a presidência da associação, ela promoveu e incentivou oficinas gratuitas de desenho artístico e publicitário, balé, hip-hop, capoeira, jazz, aulas de inglês, de espanhol, de teclado, entre outros.

Dana Hellen fala sobre a criação do pré-vestibular popular na comunidade:

Grupo se reúne, após o almoço, na sala com a pintura feita pelo estudante e morador da comunidade.

“Eu dei aula de inglês para a Eduarda como explicadora e quando ela veio com essa proposta do pré-vestibular dizendo que tinha a ajuda do sindicato eu falei com ela que: esse é o momento! Esse primeiro pré-vestibular popular do Bosque dos Caboclos é um grande benefício para muita gente. Eu me sinto realizada com relação ao que eu queria mesmo”.


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