Militantes do MST são inocentados após oito anos de processo ilegal

 

"Os trabalhadores foram acusados de colocar em risco o Estado Democrático de Direito, o que é uma visão autoritária e equivocada, vinculada às decisões usadas nos anos de chumbo no Brasil”, diz advogada do movimento

A Justiça Federal de Carazinho (RS) inocentou em primeira instância os militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Isaias Antonio Vedovatto, Silvio Luciano dos Santos, Edemir Fransisco Valsoler, Ivan Moroso de Oliveira, Vladimir Maier e os apoiadores do Movimento, Arno Maier e Jandir Celso, após oito anos da abertura de um processo, que teve como base um dossiê ilegal, feito a pedido do então Coronel da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, Waldir João Reis Cerutti.

O documento, intitulado “Situação do MST na região norte do RS” também traz investigações contra o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária  (Incra), a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e a Via Campesina.

As acusações ao MST vão desde ligações com Primeiro Comando da Capital (PCC) até a presença de estrangeiros junto aos acampados para oferecer treinamento militar em guerrilha rural, “com o objetivo de criar uma zona de domínio, de controle através do domínio territorial, onde o MST substituiria o Estado”.

O Estado Maior da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, a pedido do então Subcomandante Geral da Brigada Militar Cel. Paulo Roberto Mendes Rodrigues, autorizou a realização de investigações com base em diversas ações desenvolvidas pelo MST na época.

Para Giane Alvarez, advogada do MST, a existência desse processo faz parte de um contexto de criminalização do Movimento no estado do Rio Grande do Sul.

“Esse é um caso bastante emblemático em relação as formas de criminalização que o MST sofre ao longo da sua existência. Esses trabalhadores foram acusados com base na Lei de Segurança Nacional, uma lei muito criticada por diversos juristas de todos os matizes, que a consideram uma das heranças da ditadura militar. Os trabalhadores foram acusados de colocar em risco o Estado Democrático de Direito, o que é uma visão autoritária e equivocada, vinculada às decisões usadas nos anos de chumbo no Brasil”, diz Giane.

Embora o processo que se arrasta desde 2006 tenha gerado, sem provas individualizadas, decretos de prisões preventivas dos envolvidos, Giane considera que essa foi uma vitória importante para o Movimento e para a democracia.

“Esse foi um processo que continha a argumentação da existência da teoria do Domínio do Fato, ou seja, como não existiam provas, foram imputadas a algumas lideranças a responsabilidade pela prática eventual de alguns crimes que o Ministério Público alegou que havia ocorrido”, explica.

Na sentença, ao reconhecer a inocência dos acusados, o juiz declarou que a Lei de Segurança Nacional - muito utilizada na criminalização dos movimentos sociais brasileiros - é incompatível com a atual Constituição Federal.

A advogada cita ainda a importância da mobilização social na luta contra as injustiças e contra o ato de tornar crime a luta do povo.

“Esse foi um processo que contou com a atuação de advogados da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap) e do jurista Nilo Batista, mas muito ainda precisa ser feito para que ilegalidades como essa não voltem a acontecer”, finaliza.

 

 

Fonte: Brasil de Fato, 29/8/14.

 

 


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