“As
transnacionais da comunicação estão em crise”
Celebrando o dia
mundial do rádio, no última quarta-feira (13), esteve nos estúdios
da Associação Latino-americana de Educação Radiofônica (ALER) o
ex-diretor do Le Monde Diplomatique e autor do livro “A explosão do
jornalismo”, Ignacio Ramonet, para ser entrevistado por jornalistas
de veículos latino-americanos que formam parte do Enlace de Medios
para a Democratização da Comunicação. Em uma hora, falou sobre a
crise que vivem os meios transnacionais, o poder dos meios
latinoamericanos, a importância da rádio e a atualidade midiática na
Europa.
Ramonet conversou
com o Enlace de Medios durante sua visita ao Equador como integrante
da delegação de observadores internacionais presentes no país. Os
meios de comunicação e sua relação com o Estado, assim como seu
papel nas campanhas eleitorais foram vários dos temas tocados pelo
jornalista.
Meios
tradicionais e novas tecnologias
Em sua primeira
intervenção, Ramonet enfatizou a importância do rádio. Neste
sentido, destacou que o auge das novas tecnologias causou a
impressão de que o rádio não é tão importante, o que é uma percepção
errada. “Em muitas regiões do mundo onde se chegou a eletricidade
existem transistores que podemos montar a mão e permitem a captura
de ondas. A rádio segue tendo muita importância em muitas partes do
mundo”, afirmou.
Por outro lado,
se referiu ao papel dos meios tradicionais frente às novas
tecnologias como as redes sociais, os blogs e novos sites de
esquerda que têm desafiado o monopólio da informação. “A internet
tem feito com que surjam novos atores no campo da comunicação. Os
atores tradicionais, hoje em dia, estão menos presentes no campo da
comunicação/informação e tem surgido outros como o Google, Facebook,
Microsoft ou Twitter”. Mas Ramonet adverte que estes “são suportes
que vão condicionar o conteúdo em certa medida”.
A partir da
proliferação de fontes informativas na rede, as grandes empresas
transnacionais de comunicação entraram em uma profunda crise. “A
crise geral está causando uma verdadeira extinção de meios de
comunicação. Tiveram que fechar o News of the World; a revista
Newsweek fechou faz duas semanas; então vemos que há uma grande
crise”.
Os meios na
América Latina e na Europa
Ao ser consultado
sobre o papel dos meios de comunicação na América Latina, Ramonet
caracterizou como 'anormal' o comportamento tanto dos meios
comerciais como dos meios púbicos. “Não é normal que lhe deem um
caráter profundamente ideológico e que tenham como objetivo
essencial a derrocada de governos. Estamos falando do que ocorreu
com o periódico ABC Color no Paraguai para derrubar Lugo; o golpe
midiático contra Chávez em 2002. Esta atitude dos meios não é
normal. Isto não quer dizer que a mídia não tenha o direito de
opinar. Do mesmo modo não é normal que os meios públicos sejam meios
do governo, por isso estamos vivendo um momento particular na
América Latina. Há uma guerra midiática, e nesta guerra não há
serenidade nem de um lado e nem do outro”.
Na mesma linha de
pensamento, Ramonet afirmou que o papel dos meios públicos e seu
posicionamento a favor do governo não pode ser considerado um
elemento decisivo em termos eleitorais já que a campanha que fazem
os meios de direita – que atuam como um partido de oposição – é
permanente.
O diretor da
Alai, Osvaldo León, trouxe à conversa o caso do império de Rupert
Murdoch, que foi investigado na Inglaterra, onde o informe do juiz
Leveson questionou a efetividade da chamada autorregulação
midiática. Como bem assinalou León, “isso nunca foi notícia por
estes lados. Como esse tema se apresenta na Europa? Está na agenda?
Diante desta
interrogação, Ramonet explicou que “o que ocorreu na Inglaterra é
que, agora, o próprio David Cameron, um primeiro ministro
conservador, planeja um projeto de criar um limite concreto à
liberdade de expressão”. Neste sentido, assinalou como o conceito de
liberdade de expressão tem sido tergiversado para sustentar uma
espécie de direito ilimitado.“O melhor sempre é a autorregulação, é
dizer que há alguns princípios que se deve respeitar e que quando
esses princípios forem transgredidos, que haja a resposta para
isso”, defende Ramonet.
O exemplo da
legislação francesa acerca da liberdade de expressão – vigente desde
1881 – foi utilizado pelo entrevistado para demonstrar que em
democracias consolidadas existem mecanismos de regulação. “Na
França, por exemplo, há uma lei no Código Penal que proíbe insultar
um chefe de estado estrangeiro. Imagine se isso se aplicasse em
vários países da América Latina com relação a Chávez ou a Fidel
Castro, sabendo que aqui, em muitos periódicos de toda a América
Latina tratam esses dirigentes de uma maneira perfeitamente
desrespeitosa”.
El País, Assange
e Chávez
Referindo-se ao
diário madrilenho El País, Ramonet descreveu o comportamento do
periódico frente ao caso de Julian Assange, o australiano fundador
do Wikileaks hoje asilado na Embaixada do Equador em Londres. “Faz
um ano, ou um ano e meio que Julian Assange era tratado como um
herói. A partir do momento em que o Equador lhe deu asilo
diplomático, ele se transformou numa espécie de diabo, e já não
volta a falar, porque evidentemente o presidente Correa é a pessoa
que obrigatoriamente deve ser criticada, segundo esse diário”.
O caso da falsa
foto do presidente Chávez publicada na capa do diário madrilenho
também foi aludido pelo ex-diretor do Le Monde Diplomatique, que
assinalou: “Claro, dizem que eles ignoravam que era falsa, mas
evidentemente se, em sendo falsa, não despenderam o tempo necessário
para verificar se era falsa, é porque, em definitivo, tinham o
desejo de causar danos. Isso porque levam muito tempo tratando de
prejudicar revolução bolivariana, como há tempos tratam de
prejudicar a revolução cidadã”.
Tradução: Eduardo
Sales de Lima
Fonte: Brasil de Fato, Gustavo J. Fuchs, Enlace de Medios, 18/2/13.