Revista Caros
Amigos demite equipe de redação em greve
Wagner Nabuco,
diretor-geral da publicação, alegou “quebra de confiança” nos
trabalhadores que iniciaram a paralisação no dia 8 após ameaça de
demissão em massa
A equipe de
redação da Revista Caros Amigos, que realizava uma greve desde a
última sexta-feira (8), foi demitida. Em reunião nesta segunda-feira
(11) com os editores, jornalistas e designers gráficos, o
diretor-geral da publicação Wagner Nabuco argumentou “quebra de
confiança” nos profissionais em greve.
A jornalista
Gabriela Moncau afirma que os integrantes da redação foram
convocados por Nabuco através de um e-mail, no domingo (10), para a
reunião desta segunda. “A gente tinha a perspectiva de que fosse uma
reunião para conversar sobre a situação da revista, mas não foi isso
que aconteceu, ele demitiu a todos”, conta.
A paralisação foi
iniciada após o anúncio de um corte de 50% na folha de pagamento da
redação, que passaria de R$ 32 mil para R$ 16 mil. Segundo a
jornalista, o anúncio foi uma surpresa para todos da equipe. “Foi um
comunicado, não foi um convite à conversa para falar sobre a
situação financeira da revista e ver como coletivamente a gente
podia resolver essa situação”, afirma.
Conforme
Gabriela, a decisão pela greve foi tomada devido à falta de diálogo
da administração com os trabalhadores após o anúncio do corte na
folha de pagamento. “A gente achou que a greve era a única forma de
pressionarmos para uma conversa para evitar que boa parte da revista
fosse demitida sumariamente”, explica.
De acordo com
nota divulgada pelos jornalistas, o diretor-geral justificou o corte
na folha de pagamento “devido ao pagamento de dívidas fiscais
acumuladas desde o ano 2000 e ao déficit operacional entre receitas
da editora e custos fixos, incluindo os nossos (baixos) salários”.
Gabriela disse
que a equipe de redação nunca teve acesso às contas da revista, que
é mantida principalmente por anúncios, além da venda em bancas e
assinaturas. Apesar disso, a jornalista afirma que, no último
período, os profissionais se prontificaram a tentar ajudar a
melhorar as condições financeiras da revista com a realização de
mais edições especiais para serem vendidas nas bancas. “Existem uma
série de alternativas para a gente tentar melhorar a situação
financeira da revista”, completa.
Ela relata que
desde a divulgação da nota sobre a greve na sexta-feira (8), a
equipe recebeu diversas manifestações de solidariedade. Nesse
sentido, acredita que alternativas como a publicização da crise
financeira e a criação de uma campanha para ajudar a revista
poderiam ser tomadas para que não fossem necessárias as demissões
dos profissionais. “A gente compreende que existem dificuldades
financeiras na Revista Caros Amigos, como existem dificuldades
financeiras em uma série de outras publicações. Mas isso não
justifica que as condições de trabalho sejam cada vez mais
precarizadas”, argumenta.
Precarização
Na nota divulgada
na sexta-feira (8), os integrantes da equipe denunciaram “a
crescente precarização das nossas condições de trabalho, seja pela
ausência de registro na carteira profissional, o não recolhimento
das contribuições do FGTS e do INSS, e, agora, o agravamento da
situação pela ameaça concreta de corte da folha salarial em 50%, com
a demissão de boa parte da equipe”.
No entanto,
conforme ela, a redação mantinha um diálogo permanente com a
administração da Caros Amigos a fim de melhorar as condições de
trabalho, com alguns pequenos avanços no que diz respeito ao salário
- ainda assim pago abaixo do piso da categoria de R$ 3.504,29 para
7 horas diárias. “Desde 2009, que foi quando essa equipe que há na
redação hoje começou a ser montada, a gente tem se organizado para
conversar com o diretor-geral da revista para ir gradativamente
melhorando as nossas condições de trabalho”, conta.
Segundo a
jornalista, a equipe de redação sempre teve dificuldades com relação
a essas questões trabalhistas. “A gente nunca chegou a ganhar acima
do piso ou teve perspectivas de registro [em carteira]”, afirma.
Veja nota sobre a
demissão em massa divulgada pelos trabalhadores:
DIRETOR DA CAROS AMIGOS DEMITE EQUIPE DA REDAÇÃO EM
GREVE
O
diretor-geral da revista Caros Amigos, Wagner Nabuco,
chamou hoje (11/03/2013) a equipe de redação e anunciou
que a empresa está demitindo todos os trabalhadores que
se encontravam em greve desde sexta-feira, dia 08/03,
alegando "quebra de confiança".
Nós,
integrantes da equipe de redação da revista Caros Amigos
- responsáveis diretos pela publicação da edição mensal,
o site Caros Amigos, as edições especiais e encartes da
Editora Casa Amarela - lamentamos a decisão da Direção.
Consideramos a precarização do trabalho e a atitude
unilateral como passos para trás no fortalecimento do
projeto editorial da revista, que sempre se colocou como
uma publicação independente, de jornalismo crítico e de
qualidade, apoiando por diversas vezes, inclusive, a
luta de trabalhadores de outras áreas contra a
precarização no mercado de trabalho.
A
greve é um instrumento legal, previsto na Constituição
brasileira e direito de todos os trabalhadores. Foi
adotada como medida para tentar melhorar as condições de
trabalho na revista e foi precedida por uma série de
incansáveis diálogos por parte desta equipe, desde que
ela começou a ser montada em 2009. As tentativas foram
sempre no sentido de atingir o piso salarial para todos
os profissionais, encerrar os atrasos no pagamento dos
salários e direitos como férias e 13º, que nos atingiram
por mais de uma vez, de conquistar o registro dos
funcionários fixos e uma melhor relação com
colaboradores freelancers, que também convivem e
conviveram com baixas remunerações e atrasos nos
pagamentos.
Diante de alegações por parte da direção sobre
dificuldades financeiras vividas pela empresa por se
tratar de uma publicação alternativa, convivemos com
salários mais baixos que os pisos e os praticados pelo
mercado, e também com a inexistência de muitos direitos
trabalhistas. Aceitamos negociar gradativamente a
correção desses problemas de forma a fazer com que a
Caros Amigos, "a primeira à esquerda", não se tornasse
agente de exploração de seus funcionários e avançasse
nessa frente conforme suas possibilidades. Trabalhamos
para ampliar a receita da empresa, seja pelo prestígio
do trabalho realizado, muitas vezes premiado, seja pelo
aumento do trabalho em forma de outras publicações como
especiais e encartes.
Em
todos os anos entre 2009 e 2013, mantivemos o diálogo
salutar com a Direção, buscando negociar melhores
condições para desenvolvermos o trabalho com o qual
estávamos comprometidos. Isso foi feito por meio de
cartas de toda a redação à direção, conversas de
comissões da redação com a direção e inúmeras
negociações entre o editor-chefe e diretor-geral.
Apesar de todos nossos esforços em construir uma boa
relação interna, fomos pegos de surpresa com o anúncio
de corte da folha salarial em 50%, com a demissão de boa
parte da equipe ou redução do salário dos 11
funcionários de 32 mil pra 16 mil ao todo, conforme
relatado em nota divulgada na data de anúncio da greve e
que segue novamente ao final desta.
O
anúncio de medida drástica que atinge diretamente os
trabalhadores foi feito em forma de comunicado pelo
diretor-geral, sem margem para negociação. Ainda
buscamos pelo diálogo reverter o problema junto à
direção por uma semana. Sem margem para conversa,
recorremos à paralisação como forma de ampliarmos nossas
vozes, mas fomos surpreendidos mais uma vez com o
comunicado da demissão coletiva.
Nossa
luta não é - e nunca foi - contra a revista Caros
Amigos. Pelo contrario, reforçamos a importância de
publicações contra-hegemônicas e críticas em um cenário
difícil para a democratização da comunicação no Brasil,
que cerceia a variedade de vozes. Nossa luta é,
portanto, para o fortalecimento e a coerência de um
veículo fundamental do qual sempre tivemos o maior
orgulho de participar.
Vimos
a público lamentar profundamente que essa crise
provocada pela direção venha causar sérios prejuízos ao
projeto editorial da Caros Amigos, que contou por todos
esses anos com nossa dedicação.
Saímos desse espaço de forma digna diante de uma
situação que tornou a greve inevitável, na esperança que
nossos apelos sirvam de acúmulo para o futuro da Caros
Amigos de modo que ela se torne exemplo não só no campo
editorial, mas nas relações que mantém com seus
funcionários e colaboradores. Esperamos que o
compromisso assumido com colaboradores durante a gestão
dessa equipe seja louvado e que eles recebam seus
pagamentos sem atrasos. Também que sejam honrados nossos
diretos trabalhistas.
Agradecemos todos que se solidarizaram com nossa
situação e os que seguirão nos apoiando nessa nova
etapa. Esperamos que esta experiência sirva de acúmulo e
motivo de debate sobre a precarização, o achatamento de
salários, a piora nas condições de trabalho e atitudes
patronais - que existem tanto em empresas da grande
imprensa quanto nas da contra-hegemônica - no sentido de
buscarmos melhores condições para todos exercerem suas
profissões. Por fim, esperamos que o exemplo comece pela
imprensa contra-hegemônica com a correção de práticas
como esta.
São
Paulo, 11 de março de 2013.
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Hamilton Octavio de Souza
09 -
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10 –
Paula Salati
11 -
Ricardo Palamartchuk |
Fonte: Brasil de Fato, Michelle Amaral, da Redação, 11/3/13.