Professora da
UFSM: Estatuto do Nascituro é retrocesso
Para docente da
Enfermagem, projeto oficializa o estupro
O Estatuto do
Nascituro, aprovado na última quarta-feira, 5, na Comissão de
Finanças da Câmara, põe abaixo as vitórias conquistadas
anteriormente pelas mulheres, representando, na prática, a
oficialização da prática do estupro. A análise é da professora do
departamento de Enfermagem da UFSM, Maria Celeste Landerdahl, e vai
ao encontro do posicionamento defendido pelas organizações de
mulheres trabalhadoras, que entendem o projeto como um retrocesso
para a autonomia e a saúde das mulheres.
A professora
explica que, a partir de 2004, foi instituída uma política de
atenção à saúde da mulher, garantindo a autonomia das mulheres sobre
seu corpo, o protagonismo das mães no ato do parto e o
‘empoderamento’ feminino para que elas tenham conhecimento sobre si
e consigam, assim, influenciar no desenho de políticas públicas que
venham ao encontro de suas necessidades. Numa tentativa de ferir tal
conquista, em 2007, lembra Maria Celeste, já havia sido proposta uma
lei no sentido de criminalizar a prática do aborto, tornando
possível, inclusive, a detenção, por seis meses, de quem se
posicionasse a favor do aborto em lugares públicos.
Em 2013, o
substitutivo à lei de 2007 veio um pouco mais ameno, em função, na
análise da docente, da própria pressão exercida pelos movimentos
organizados das mulheres. Ainda assim, representa uma grande
estupidez: “Vejo muito esse substitutivo como o controle do corpo
das mulheres feito pelos homens. Como se elas não tivessem condições
e direito de escolher. Ao invés de encarar o estupro de frente – ou
seja, como um crime, passível de detenção a quem o cometeu -, passa
a encará-lo como aceitável, quase normal, proibindo a mulher de
abortar. E, não abortando, ela terá uma relação com esse estuprador
pelo resto de sua vida, pois a lei estabelece que ele pague uma
pensão pelo produto desse estupro. Ou seja, a mulher já é violentada
na ocorrência do estupro, e segue violentada no resto de sua vida,
pois terá que manter uma relação com seu estuprador”, analisa Maria
Celeste.
Segundo o
projeto, caso o estuprador não tenha condições de arcar com a bolsa,
os custos serão arcados pelo Estado. Em casos de fetos com
deficiência, o Estatuto prevê que seja dado suporte para que o
quadro seja revertido, “haja ou não expectativa de sobrevida
extra-uterina”. Com isso, a gestante corre o risco de gerar um feto
que pode nascer morto.
Camila Lisboa,
representante do movimento Mulheres em Luta, da CSP-Conlutas,
acredita que, com o Estatuto do Nascituro, a lei do aborto, que já é
limitada, pode sofrer ainda mais restrições. “No ano passado,
tivemos um avanço na luta pela legalização do aborto no Brasil com a
aprovação da medida para os casos de fetos anencéfalos. Neste ano, a
declaração do Conselho Federal de Medicina também ajudou a avançar
nesse debate e nessa luta”, destaca Camila.
‘Aborto não pode
ser questão de polícia’
Para Maria
Celeste, o aborto deve deixar de ser encarado como uma questão de
polícia, uma vez que as mulheres, hoje, vêm morrendo devido à
criminalização dessa prática. O fator de classe tem peso
determinante na análise e reflexão sobre o tema. “Provavelmente as
filhas e mulheres desses homens que estão fazendo a lei podem arcar,
financeiramente, com um aborto em clínica, pagando muito alto. E as
pobres, como ficam?”, questiona a professora, esclarecendo que a
morte decorrente do aborto está entre uma das principais causas de
óbitos por complicações maternas, já que a maioria das mulheres não
tem acesso a clínicas clandestinas, realizando, assim, abortos
caseiros, altamente suscetíveis a riscos.
Apresentado pelo
deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e recebendo o apoio da bancada
evangélica, o projeto segue agora para análise na Comissão de
Constituição e Justiça e no plenário da Câmara. Se aprovado, será
encaminhado ao Senado.
“Nisso tudo, o
mais importante é a necessidade de as mulheres saírem de seu
anonimato, de sua ingenuidade. Elas devem se ver como pessoas que
podem e devem ir contra o instituído”, diz a docente, que questiona,
também, o que o Conselho dos Direitos das Mulheres de Santa Maria
vem fazendo no sentido de tornar público e amplo esse debate. “São
instâncias que devem chamar as mulheres para a discussão”,
complementa.
Texto: Bruna Homrich (estagiária), com informações de CSP-Conlutas
Edição: Fritz Nunes (Jornalista)
Assessoria de Imprensa da Sedufsm, 11/6/13.