Governo de
Honduras destitui diretor da escola que foi centro de resistência ao
golpe
Faltando menos de
40 dias para as eleições presidenciais e frente à iminente derrota
eleitoral, o governo hondurenho destituiu o diretor do Instituto
Central Vicente Cáceres (ICVC), Roberto Armando Ordóñez Flores,
escola de Tegucigalpa que foi o centro da resistência ao golpe
contra o presidente Manuel Zelaya.
“Neste momento,
estou sendo objeto de uma perseguição política por parte do Estado,
feita diretamente pela Secretaria de Educação e pelo ministro Marlon
Escoto Valério”, denunciou Flores, para quem “o objetivo óbvio e
imediato é tomar o centro educacional, que é onde naturalmente se
reunirá a população caso o governo se atreva a trilhar o caminho da
fraude”.
Confira a entrevista.
Brasil de Fato -
A que se deve esta perseguição?
Roberto Armando
Ordóñez Flores
- Tudo começou no golpe de Estado de 28 de junho de 2009, quando a
sociedade se convulsionou. A partir daquele momento o povo saiu às
ruas para defender a constitucionalidade e o direito legítimo do
presidente Manuel Zelaya, que foi tirado do poder e enviado à Costa
Rica pelo poder das armas.
O povo se
organiza na Frente Nacional de Resistência e permanece durante meses
nas ruas, protestando em marchas e mobilizações, enfrentando os
abusos e atropelos dos golpistas. Durante todo este período o
Instituto Central Vicente Cáceres (ICVC), do qual sou diretor,
colocou toda sua enorme infraestrutura, seu ginásio propício a
reuniões e assembleias, à disposição da resistência popular.
O Instituto é uma
referência para a luta democrática em Honduras.
Claro. Foi aqui
que a resistência realizou suas primeiras assembleias e
constituiu-se como uma Frente, como um movimento social que luta
pela democracia em nosso país. Posteriormente, esse movimento deu um
giro político e se conformou no que é hoje o Partido Liberdade e
Refundação (Livre), que com muita evidência, e todas as pesquisas
apontam isso claramente, assumirá o poder no próximo dia 24 de
novembro.
É isso o que
preocupa o atual governo que, sabendo da inviabilidade eleitoral de
seu candidato, o presidente do Congresso, e da iminente vitória
popular, também sabe que este será o centro de organização contra
uma eventual fraude, que será o centro de luta para a garantia de um
futuro melhor para a sociedade hondurenha.
Qual a
justificativa do governo para o seu afastamento?
É uma perseguição
terrível que vem se concretizar com uma justificativa minúscula: a
de que declinamos de um convite do ministro para que participássemos
do desfile de 15 de setembro (dos 192 anos da Independência de
Honduras) que a Secretaria de Educação organiza todos os anos.
Nós informamos ao
ministro que não podíamos participar porque o governo não cumpriu
com suas obrigações de repassar os recursos para a realização das
matrículas. É importante lembrar que a matrícula em nosso país é
gratuita.
O governo do
presidente Zelaya garantia a gratuidade, disponibilizando os
recursos que equivaliam a 300 lempiras (o equivalente a 15 dólares)
para os estudantes da sétima a nona série e a 400 lempiras (20
dólares) para os demais cursos. No nosso Instituto com mais de sete
mil alunos e 322 professores, o total equivale a dois milhões e meio
de lempiras por ano desde 2012. Como não recebemos um único centavo
por parte do Estado não era factível que desfilássemos, pois os
instrumentos da nossa banda precisavam ser consertados, e tínhamos
de priorizar a continuidade dos estudos dos jovens, para comprar
papel, tinta e manter o Instituto funcionando durante os mais de
duzentos dias do ano letivo.
O que o governo
respondeu?
O ministro
contestou dizendo que tínhamos de desfilar, do jeito que fosse. Da
nossa parte foi dada uma resposta diplomática, educada ao ministro,
cordial, apontando as razões pelas quais não iríamos desfilar por
absoluta falta de condições. Como resposta nos enquadrou num
processo de destituição da direção, de afastamento do centro
educativo pelo simples fato de não tê-lo atendido, sem levar em
conta a realidade.
O governo quer me
destituir sem respeitar o processo legal, que não pode ser
arbitrário, pois existem regras disciplinares e prazos. Temos claro
que devemos defender o Estado de direito, embora tantas coisas
tenham passado desde o golpe de Estado... se depuseram um
presidente, se o tiraram de sua casa no meio da madrugada, o que
dizer de um diretor, de um professor de um centro docente? A
resposta é simples, elementar. Sou um perseguido político, submetido
a uma brutal campanha de intimidação, com o governo disparando seus
misseis midiáticos a menos de 40 dias das eleições presidenciais.
O objetivo óbvio
e imediato é tomar o centro educacional, que é onde naturalmente se
reunirá a população caso o governo se atreva a trilhar o caminho da
fraude.
Fonte: Brasil de Fato, Leonardo Wexell Severo (de Honduras),
16/10/13.