Estudantes desocupam direção do IM e publicam manifesto

Rio, 16 de Setembro de 2013


MANIFESTO DO OCUPA  IM

CARTA ABERTA A COMUNIDADE ACADÊMICA

 

O grupo Ocupa IM vem, por intermédio deste expediente, fazer um relato sobre a ocupação e o debate que esta ação desencadeou no interior da Universidade e também para além dos muros desta. Diversas notas já foram lançadas e exaustivamente explicadas sobre o teor da ocupação e a ordem cronológica dos fatos que motivaram esse grupo de estudantes a ocuparem a sala da direção. A luta era e é muito clara: direitos trabalhistas e justiça para os terceirizados, nesse caso especificamente, os funcionários da empresa de limpeza Digna.

É importante ressaltar que no campo onde os antagonismos entre o capital e o trabalho se afloraram, nós, ocupantes, escolhemos o lado do trabalho. Essa localização política fez com que despejássemos nossas energias para combater a maneira mais comum na atual conjuntura social de superexplorar o trabalhador: a terceirização. Não descolamos essa realidade local da realidade nacional. Sabemos que a precarização do trabalho e a superexploração daqueles que mais precisam do seu ganha-pão é uma política de Estado levada a cabo pelo governo Dilma. Essa política se reproduz nas universidades de todo o país, como podemos observar na greve de quatro meses dos técnicos administrativos e professores em 2012, diante do endurecimento do governo em negociar com aqueles. E agora com a abertura da caixa preta da terceirização, onde temos provas cabais de fraude de documentos, problemas gravíssimos em relação ao depósito dos direitos trabalhistas e péssimas condições de trabalho. Todas essas questões podem ser mais bem entendidas em notas já publicadas pelo Ocupa IM, pelo comitê de mobilização da Rural e pela ADUR. Também pelo vídeo que produzimos com as funcionárias demitidas e nos documentos que estão em posse destes companheiros e da assessoria jurídica. 

Além disso, evidenciamos as difíceis condições estruturais nas quais se encontra a Rural. Em menos de seis meses, a Reitoria e as direções do Instituto Multidisciplinar e de Três Rios, foram ocupadas. O Ocupa IM não considera isso uma coincidência e sim um desgaste profundo com um sistema que preza, tanto nas relações com o trabalhador, quanto com os estudantes, por priorizar a precarização do ensino e das condições de trabalho, em benefício de uma minoria. Esse desgaste é notório nas jornadas de junho, onde a população foi às ruas reclamar por direitos e se posicionar contra o sistema que beneficia os empresários em detrimento das camadas populares, e utilizou métodos mais combativos de luta, como resistência com barricadas, ocupações de espaços públicos e etc. Foram essas jornadas que impulsionaram a greve dos profissionais da Educação do Estado e do Município do Rio de Janeiro, que vêm travando uma árdua luta contra o Governo Cabral e Paes. Governo que insiste, de forma ditatorial, em criminalizar professores e ativistas, em fazer ameaças e reprimir o movimento. 
É notória a semelhança, da política aplicada por esse governo, com a que é posta em prática pela Direção do IM. Desde que se deu início a ocupação, a todo o momento, a tentativa foi de nos desgastar, de endurecer e de criminalizar o movimento. Vale ressaltar que em nenhum momento fomos procurados pela direção para dialogar, apesar de nos posicionarmos favoráveis a este diálogo. Pelo contrário, diversos argumentos falaciosos e infundados foram utilizados para diminuir a importância dos questionamentos levantados pelos ocupantes. Argumentos que diziam que éramos um grupo que ainda chorava a perda da eleição, minimizando o debate em torno de uma eleição para direção de instituto.

Como se não bastasse essa maneira personalista de fazer política, a Direção descambou para o autoritarismo onde tentou identificar e criminalizar, de forma baixa, as supostas “lideranças” do movimento, que é e sempre foi horizontal, com ameaças de processo administrativo, reintegração de posse e até processo na esfera cível e criminal, como o próprio Diretor falou em reunião do Consuni, inclusive citando familiares de alunos e suas profissões e com falas por parte de alguns conselheiros que sugeriam o patrulhamento da vida pessoal dos ocupantes. Uma comissão pra “negociar” nossa saída foi criada e nos trouxe apenas uma notificação para que saíssemos em 24 horas impreterivelmente, sem nenhum diálogo ou negociação sobre as pautas levantadas pelos ocupantes. Já a reitoria, com seu já conhecido perfil de esquivar-se dos pontos principais do debate, abriu negociação conosco e se comprometeu com algumas pautas – como pode ser visto na página da Rural – todavia não estabeleceu prazos e nem foi clara a respeito de diversos pontos colocados por nós na reunião e no pedido protocolado junto a ela. Parecem não perceber que são três ocupações em menos de seis meses. Parecem negar que existem sérios problemas estruturais e inexplicáveis na Universidade Rural e que são reflexo do descaso da Administração Central com os recursos que tem e das políticas de Estado reproduzidas na esfera micro. Que arquem com o ônus político de terem virado as costas para movimentos que reivindicavam e reivindicam direitos trabalhistas e estudantis! 

Nossa análise sobre esses vinte e cinco dias de ocupação é extremamente positiva, afinal conseguimos colocar na ordem do dia, debates importantes como o caso da terceirização já relatado nesse manifesto. Entretanto, não esperávamos suscitar outros debates, de cunho institucional, no interior desta comunidade. É aí que nos surpreendemos, negativamente é claro, com a nossa Universidade. Em meio a questionamentos de contratos com as empresas terceirizadas e da estrutura da Rural, vimos uma briga de foice, que em nenhum momento se ligava ao assunto levantado. Era a briga pelo poder institucional da Universidade que fez com que diversos agentes, antes em cima do muro, aparecessem pra se posicionar das formas mais diversas possíveis. Aí sim está explicado o porquê de se desviar o foco das demissões para essa questão interna. Existem projetos políticos pessoais e coletivos que envolvem uma série de coisas que a ocupação de forma indireta inviabiliza. Essa busca pelo poder institucional – ou manutenção dele – fez com que nesse espaço se reproduzisse a velha política clientelista e de cooptação de pessoal para que não fosse confrontado o status quo. E aí vimos as mais grosseiras baixarias já relatadas acima e perseguições de vários tipos. 

Nada disso foi capaz de esconder as contradições que a ocupação revelou nesse processo. Num primeiro momento, em nota emitida no site da Rural, a Pró-reitora de assuntos financeiros, afirmou que não houve aumento no nº de técnicos administrativos necessários para acompanhar a expansão universitária, deixando escapar uma crítica a como se deu o Reuni, processo que visava expandir a Universidade, porém sucateou ainda mais a Educação e o trabalho. A Reitoria em sua resposta ao movimento Ocupa, reconheceu de forma clara que a situação de Seropédica em relação aos direitos trabalhistas dos funcionários da Empresa Digna está muito pior do que a dos funcionários que trabalham no IM, que já é péssima. Já o diretor afirmou em documento emitido por ele próprio que falou para os funcionários da limpeza que “já eram bem grandinhos para se auto representarem”. Logicamente que dentro de uma relação de trabalho muito mais frágil, onde demissões são comuns, essa fala tem qual sentido para os trabalhadores? Conselho de amigo? Achamos que isso é uma forma de coagir e tutelar o movimento. E vamos continuar lutando contra isso dentro da Universidade.

A ocupação proporcionou aos demitidos assistência jurídica via sindicato dos professores para que aqueles pudessem ter o mínimo de seus direitos preservados. Também aqueceu o debate político sobre a terceirização, mesmo que de forma ainda débil, na esfera local, porque apesar de sabermos que a terceirização é um problema nacional, entendemos que é no nosso local de trabalho e de estudo que impulsionamos as lutas e os questionamentos, com o objetivo de combater essa política que desrespeita e marginaliza o trabalhador pobre, tornando-o invisível. Pode até ser assim em outros locais de ensino e trabalho; na Rural não mais! Aqui, graças a essa ocupação, os trabalhadores da limpeza antes invisíveis, agora são protagonistas. Porém, queremos mais.

Queremos que avancem na organização independente e descolada da administração superior, para que possam espontaneamente, como foi em julho, quando procuraram a nós estudantes, se organizar com e como bem entendessem. Conseguimos também mostrar as contradições da empresa Digna e todos os malefícios que ela provoca na comunidade acadêmica. Péssimos produtos, mentiras em pleno Conselho Universitário, perseguição política, demissões à revelia e péssimas condições de trabalho. Até quando o dinheiro público será gasto com essa empresa? O próprio Vice-Reitor reconheceu em reunião com o grupo ocupa IM que esta empresa já fraudou documentos. A Universidade fechará seus olhos para isso? Continuará mantendo um contrato onde os trabalhadores e o povo são sempre os mais prejudicados? Até quando? 

Hoje, estamos desocupando a sala da direção, por entendermos que a ocupação já cumpriu um papel de denúncia e exposição das atrocidades acometidas aos trabalhadores e do descaso da administração para com a permanência estudantil, a mobilidade acadêmica e uma estrutura física compatível com a expansão dos cursos, que é oriunda do Reuni. Não conseguimos o objetivo principal que era a readmissão dos demitidos. Contudo, ainda acreditamos que isso possa acontecer e as afirmações vistas nas notas publicadas pela direção e pela reitoria no que se refere aos contratos com a digna e as fraudes cometidas por esta empresa e, já que a direção insiste que não vai buscar esses documentos na sala ocupada para dar andamento aos processos em outro local, desocupamos a sala da direção com a campanha pela abertura do contrato da Rural com a empresa supracitada, baseados na lei 12.527 de 18 de Novembro de 2011 que regula o acesso à informação, no sentido de esclarecer a comunidade acadêmica sobre o papel da Rural na regulação das atividades da empresa e de seus funcionários e de exigir uma reunião com representantes da empresa digna para esclarecimentos junto à comunidade acadêmica sobre o depósito dos direitos trabalhistas.

Demos um passo importante, com a ocupação, na mudança da nossa Universidade. Estamos montando um calendário de lutas e continuaremos a mobilizar e abalar as estruturas arcaicas e que remontam aos tempos de ditadura desta comunidade a fim de consolidar um projeto de Universidade para o povo! Não nos calaremos diante de perseguições políticas e nem da criminalização imposta ao movimento. Vamos expor tudo que foi levantado nesse tempo nas mídias sociais e em todos os locais, no ministério público e em todos os meios de comunicação possíveis, bem como denunciaremos no ministério público. Repudiamos a difamação imposta aos estudantes ocupantes pelos corredores e lamentamos profundamente a postura da administração superior da Rural. Toda via, temos consciência que proporcionamos uma aliança operário-estudantil no seio da universidade, pois houve uma mobilização enorme por parte da ADUR e do SINTUR, a quem somos extremamente gratos pelo companheirismo e pela unidade, assim como agradecemos a todos os coletivos, DCEs, entidades e movimentos sociais que se solidarizaram e demonstraram todo seu apoio a esta causa.

O fim da ocupação é o início de um novo momento na Rural. Todas as estruturas que outrora eram intocáveis foram abaladas. Conclamamos a todos para fazerem parte dessa ascensão das lutas e da mudança na realidade estudantil e dos trabalhadores pobres dessa universidade. O que faz o “tempo ser melhor” somos nós, estudantes e trabalhadores, organizados e mobilizados em prol da justiça e da dignidade no local de estudo e trabalho. Só assim avançaremos e conquistaremos! Viva a luta dos trabalhadores e a aliança operário-estudantil!

Nossa luta apenas começou!

Ocupa IM

 

 

 


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