Em entrevista
recente, professor Ricardo Antunes diz não se sentir intimidado
Em entrevista
concedida recentemente ao Jornal da Adufrj, o professor titular de
Sociologia da Unicamp, Ricardo Antunes, que foi alvo de uma
interpelação judicial pela Federação de Sindicatos de Professores e
Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior (Proifes),
caracteriza a judicialização deste debate como “um erro grave, uma
perda do senso do que é uma opinião e do debate democrático” e diz
que a interpelação não o deixou intimidado, ao contrário, reforçou a
batalha pela defesa do direito de defender os professores das
universidades públicas.
O motivo da
interpelação judicial seriam algumas declarações de Antunes ao
programa “Roda Viva” de 3 de setembro de 2012, a respeito da intensa
greve das IFES do ano passado, com críticas ao papel daquela
entidade (que assinou o acordo com o governo). Desde a interpelação
e em resposta a este ataque à liberdade de expressão, um manifesto
em apoio ao professor começou a circular na internet e já conta com
milhares de assinaturas. Vários intelectuais de renome, do Brasil e
do exterior, já expressaram seu apoio ao docente. A petição pública
pode ser acessada aqui.
http://www.peticaopublica.com.br/?pi=rantunes
A seguir, a
entrevista completa com o professor Ricardo Antunes sobre a
interpelação judicial movida contra ele pela Proifes.
O manifesto chama
a atenção para o “conteúdo ameaçador da peça inaugural da ação”. O
que diz a interpelação?
A interpelação
afirmava: “No programa Roda Viva, você disse que o Proifes não
representa o conjunto da categoria”, e em seguida apresentava mais
de 30 perguntas, algumas ofensivas a mim, questionando o que eu
queria dizer com essa declaração. Perguntaram, por exemplo, se eu
acho que o Proifes não representa ninguém, e eu nunca disse isso!
É algo elementar
que o Proifes não organiza o conjunto dos professores
universitários, apenas uma parte e, vale dizer, minoritária. A minha
associação na Unicamp, assim como a Adusp e a Adunesp, não fazem
parte do Proifes. Muitas associações de docentes das universidades
federais também não são filiadas ao Proifes. Portanto, é evidente
que a totalidade, o conjunto dos trabalhadores não pertence ao
Proifes. O Andes-SN tem uma representatividade muito mais ampla que
o Proifes. Qualquer estudante de Sociologia do trabalho sabe isso.
Além disso,
também questionaram se eu conhecia o Proifes! Talvez não saibam, mas
meu primeiro livro sobre sindicalismo (O que é o Sindicalismo) data
de 1980. Ou seja, uma coisa é reconhecer o direito da diferença e do
debate; outra é tentar judicializar e criminalizar o debate aberto e
democrático.
Sabemos que a
interpelação judicial não exige resposta. Ela sinaliza para alguém
que não se gostou de uma declaração. Portanto, tem um claro tom
intimidatório.
Como o senhor se
sente em relação ao ocorrido? Já foi interpelado judicialmente antes
pelo fato de alguém contestar suas ideias?
Nunca havia se
passado algo parecido, nem na ditadura militar, que ou matava ou
prendia, mas nunca fui interpelado judicialmente por emitir uma
opinião. Recebi a notícia de que um oficial de justiça me procurava,
com urgência, na Unicamp, em plenas férias docentes. Em fevereiro
recebi o oficial de justiça com a interpelação judicial. Foi algo
que não consigo descrever... muito constrangedor, ainda mais vindo
de uma entidade sindical!
Em geral, se você
emite uma opinião, os que discordam escrevem sobre a sua posição e é
assim que o debate corre, principalmente entre os docentes, que
possuem em sua atividade um profundo sentido pedagógico. Não pude
crer que um sindicato de professores pudesse agir assim. Só posso
entender essa interpelação judicial como um erro grave, como uma
perda do senso do que é uma opinião e do debate democrático.
E diante do apoio
recebido através do manifesto?
Em pouco mais de
uma semana na internet, já são mais de três mil assinaturas no site
Petição Pública, fora as quinhentas iniciais. Recebi apoio de
intelectuais, juízes, advogados, ex-ministros, sindicalistas,
associações, movimentos sociais e, claro, professores do país afora,
assim como da Inglaterra, França, Itália, Portugal, Suiça,
Argentina, México, Uruguai etc etc. Já assinaram István Mészáros,
Michael Löwy, François Chesnais, Atilio Boron, Michel Ralle, Chico
de Oliveira, Leandro Konder e Plínio de Arruda Sampaio, intelectuais
de reconhecimento internacional, além centenas de advogados e
juízes, como Fábio Konder Comparato, Dalmo de Abreu Dallari, Marcus
Orione, Jorge Souto Maior, Tarso de Melo, ex-diretores da Associação
dos Juízes pela Democracia, entre outros grandes juristas. Também
consegui a solidariedade de sindicalistas de várias categorias, da
CSP-Conlutas, da Intersindical, senadores e deputados como Chico
Alencar e dos ex-ministros Walter Barelli e Bresser Pereira.
Recebi também
apoio de simpatizantes do Proifes que repudiaram a interpelação. Por
isso, existia a necessidade de uma resposta política e jurídica
contundente e ela está dada pelo Manifesto feito por meus amigos
juízes e advogados.
O que o senhor
espera como desfecho para essa situação?
Está em questão o
direito constitucional à livre manifestação do pensamento, ameaçado
pela judicialização da política. Lutei por esse direito contra a
ditadura, milhares lutaram, algumas centenas morreram. Jamais
aceitaria o cerceamento da minha liberdade se não ofendi ninguém, e,
vale reiterar, vou sempre externar minha opinião. Essa é a
responsabilidade de quem reflete, pensa e luta.
O Manifesto está
apenas há pouco mais de uma semana na rede e as adesões continuam
ocorrendo. Assim, ao contrário de me intimidar, reforçou nossa
batalha pela defesa do direito de defender os trabalhadores, no caso
concreto os professores das universidades públicas e suas greves,
contra os que tentam limitá-las ou cerceá-las.
Com edição do
ANDES-SN
Fonte: Adufrj-SSind, 1/4/13.