Comissão da Verdade
atesta que Rubens Paiva foi morto no DOI-Codi
O deputado federal Rubens
Paiva foi assassinado nas instalações cariocas do Destacamento de Operações
e Informações e Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), órgão de
repressão do Exército brasileiro durante a ditadura. De acordo com a Rede
Brasil Atual, o que já era uma certeza para amigos e familiares, e uma
mentira para militares ligado ao regime, agora é conclusão de um estudo
divulgado nesta segunda-feira 4 pela Comissão Nacional da Verdade (CNV).
O coordenador do grupo,
Cláudio Fonteles, encontrou novos documentos sobre o caso Rubens Paiva no
Arquivo Nacional e confrontou-os com depoimentos colhidos à época e outras
evidências encontradas no ano passado, em Porto Alegre, na casa de um
ex-oficial do DOI-Codi que acabara de morrer.
“O Estado Ditatorial
militar, por seus agentes públicos, manipula, impunemente, as situações,
então engendradas, para encobrir, no caso, o assassinato de Rubens Paiva,
consumado no Pelotão de Investigações Criminais (PIC) do DOI-Codi do I
Exército”, escreve o coordenador da CNV.
A conclusão está baseada
no Informe n° 70, redigido em 25 de janeiro de 1971 pela Agência do Rio de
Janeiro do Serviço Nacional de Inteligência (SNI) – uma das peças
encontradas por Fonteles.
O documento é o mesmo que
o jornalista Jason Tércio, biógrafo de Rubens Paiva, após pesquisas
pessoais, cedeu ao jornal Folha de S. Paulo, que o divulgou também nesta
segunda-feira.
A CNV tinha planejado
divulgar a versão oficial sobre o assassinato de Rubens Paiva na
quarta-feira 6, mas foi surpreendida pelo diário paulista e adiantou a
revelação.
O Informe 70 relata a
história da prisão de Rubens Paiva, levada a cabo por agentes do Centro de
Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa) em 20 de janeiro de 1971. A
narrativa já era conhecida graças ao testemunho de amigos e familiares, além
de pessoas que estiveram nas celas do DOI-Codi com Rubens Paiva. Faltava,
porém, um documento que a legitimasse perante os militares, que desde então
sustentam a versão de que o ex-deputado fugiu após tiroteio com
“terroristas” que tentaram resgatá-lo quando era conduzido numa missão de
reconhecimento.
“Tivesse acontecido, de
verdade, ‘a fuga’ e, por óbvio, esse evento constaria desse pormenorizado
registro”, pontua Cláudio Fonteles.
Há menção explícita no
documento de que o ex-deputado foi levado à sede carioca do DOI-Codi.
“Rubens Beyrodt Paiva foi localizado, detido e levado para o QG da 3ª Zona
Aérea e de lá conduzido juntamente com Cecília e Marilene para o DOI.”
Cecília Viveiros de Castro e Marilene Corona foram os “rastros” que levaram
os militares até Rubens Paiva. Mãe e cunhada de Luiz Rodolfo Viveiros de
Castro, que então se encontrava exilado no Chile, Cecília e Marilene
voltavam de Santiago num voo da extinta Varig quando foram interceptadas
pela repressão.
Os serviços de
inteligência haviam recebido a informação de que ambas traziam consigo
cartas de alguns militantes exilados no Chile – história que já era
conhecida, mas que agora passa a ser confirmada também pelo Informe n° 70 do
SNI. Os agentes do Cisa prenderam as mulheres, as levaram para o quartel e
lá descobriram que as cartas seriam entregues a Rubens Paiva, que depois se
encarregaria de distribuí-las a seus destinatários. Pelo número de telefone
do ex-deputado, em posse de Cecília, os repressores chegaram até seu
endereço e o capturaram na manhã do dia 20. O documento conta sucintamente,
passo a passo, como os militares chegaram a Rubens Paiva a partir da
informação sobre as cartas vindas do Chile, diz a Rede Brasil Atual.
Ainda segundo a Rede,
além de abordar o Informe n° 70 do SNI, Cláudio Fonteles contrapõe ainda
depoimentos já conhecidos de Cecília Viveiros de Castro, que afirma ter
visto Rubens Paiva ferido e ensanguentado nas instalações do DOI-Codi, e do
médico Amílcar Lobo, que examinou o ex-deputado depois das sessões de
tortura, atestando que tinha “poucas horas de vida” devido a uma hemorragia
abdominal. O coordenador da CNV também resgatou o depoimento de dois
militares, os irmãos e sargentos Jurandir e Jacy Ochsendorf, que teriam
participado do comboio que “perdeu” Rubens Paiva para os “terroristas”, além
do chefe do operativo, capitão Raimundo Ronaldo Campos. Para Cláudio
Fonteles, seus depoimentos são contraditórios.
“Enquanto o então capitão
Raimundo Ronaldo Campos, que ‘comandava a diligência’, afirma que ‘todos se
jogaram no chão para proteção do ataque, logo a seguir se postaram para
revidar ao ataque, momento em que viram uma pessoa atravessar a rua em meio
a outro carro’, os outros dois comandados, os sargentos e irmãos Jurandir e
Jacy Ochsendorf, textualmente registram: ‘que o declarante não pode afirmar
ter visto o prisioneiro se evadir do local’ e ‘que o declarante não sabe
informar qual o destino tomado pela pessoa que o acompanhava no banco de
trás do carro, tanto assim que nem chegou a ver a citada pessoa sair do
carro’.”
As novas revelações
confirmam que Rubens Paiva esteve na sede do DOI-Codi e reforçam a tese de
que foi torturado e assassinado ali mesmo. Contudo, permanece um mistério: o
que foi feito de seu cadáver? Há suspeitas de que o ex-deputado foi
enterrado como indigente no cemitério do Caju ou nas proximidades de uma
delegacia no Alto da Boa vista, zona norte do Rio de Janeiro. Também se
aventa a possibilidade de que o corpo de Rubens Paiva tenha sido lançado ao
mar num “voo da morte” empreendido pela Aeronáutica.
Fonte: Carta Capital, 4/2/13.
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