Coggiola: EUA tentarão influir no destino da Venezuela
 

2º vice-presidente da Regional São Paulo do ANDES-SN e historiador da USP, Osvaldo Coggiola, avalia impacto da morte de Hugo Chávez

Em um primeiro momento, com a morte do presidente da Venezuela Hugo Chávez ainda recente, parece difícil que a oposição conservadora tenha condições de impor uma derrota eleitoral ao chavismo. No entanto, em relação ao governo dos Estados Unidos, que se identifica com os oposicionistas, a certeza é de que devem tentar influir no futuro político daquele país. A avaliação é do professor de História Contemporânea da USP e 2º vice-presidente da Regional São Paulo do ANDES-SN, Osvaldo Coggiola, que está no Rio de Janeiro participando do 32º Congresso do ANDES-SN.

No que se refere ao impacto da morte do líder político venezuelano, que faleceu em decorrência do câncer na noite desta terça-feira, Coggiola acredita que ela será sentida em toda a América Latina, mas especialmente nos países vizinhos, como Bolívia e Equador, e de forma ainda mais grave em Cuba, que tem uma dependência muito grande do petróleo venezuelano. O historiador e diretor do ANDES-SN também enxerga uma crise institucional na Venezuela em função de quem realmente deve assumir o lugar de Chávez: se o vice, Nicolás Maduro, ou, como diz a Constituição, o presidente da Câmara, Diosdado Cabello, que também é do mesmo partido a que pertencia Chávez.

Apesar de reconhecer a importância do papel político de Hugo Chávez, Coggiola critica o personalismo desenvolvido pelo regime bolivariano que, assim foi transformado em refém de uma única pessoa, e não embasado em um projeto amplo, centrado na organização e luta dos trabalhadores. Acompanhe a seguir a entrevista concedida por Coggiola à Seção Sindical dos Docentes da UFSM (Sedufsm).

Caráter personalista

O impacto imediato da morte de Hugo Chávez: uma crise político-institucional. Continua governando o vice-presidente designado por Chávez (Nicolás Maduro), mas a constituição prevê que o governo seja assumido pelo presidente da Câmara, Diosdado Cabello, que também é membro do partido de Chávez. Já a oposição, não se sabe que posição vai tomar. Em função da doença de Chávez, já haviam se manifestado por eleições antecipadas, mas, por enquanto não reafirmaram essa proposta. Aparentemente, também seriam favoráveis a que assuma o presidente da Câmara e que, este, ao assumir, convocasse imediatamente eleições. Contudo, essa ideia não deve prevalecer, pois se houvesse eleições em curto espaço de tempo, Nicolás Maduro possivelmente venceria com grande margem. Mas, tudo isso é especulação. O que se viu foi um país extremamente comovido, um país de luto, pela morte do Chávez. E o futuro do país foi colocado em jogo pela morte de alguém que praticamente tinha identificado o regime político com a sua pessoa, o que mostra o limite desse tipo de movimento. Porque um movimento de caráter libertário, mas que depende exclusivamente da saúde de uma pessoa e cuja morte põe em risco o próprio movimento revela que tem bases frágeis. Por mais importante que uma pessoa seja, o destino político de um país não pode depender apenas dessa pessoa. Sabemos que houve grandes lideranças políticas em todos os tempos. Lênin, por exemplo, quando morreu, provocou comoção, mas não gerou uma crise. Porque era óbvio que o bolchevismo, que era o partido que ele dirigia, tinha outras lideranças e assim não se estabeleceu uma crise política. Enquanto que, pela morte de Chávez, se abre uma crise política, o que demonstra o caráter personalista do governo. O prognóstico mais geral que se pode fazer é que devemos lutar para que, a luta pelo Socialismo na Venezuela, possa vencer esse estágio personalista e se manifestar como uma luta dos trabalhadores, que tenha líderes, mas que não sejam providenciais e carismáticos.

Impacto na América Latina

O principal impacto que vai ter é o aumento da pressão dos Estados Unidos para um intervencionismo na Venezuela, tentando quebrar o eixo chamado de Alba – Venezuela, Bolívia, Equador e Cuba. Esses países formam um eixo político considerado mais à esquerda na América Latina e contra o qual os Estados Unidos tinham apontado suas baterias nos últimos tempos. A tática que os Estados Unidos devem usar é pressionar para a mudança do eixo político na Venezuela, pois se isso acontecer, o impacto será muito grande junto à Bolívia, Equador, e principalmente em Cuba, em função do petróleo. Então, como imediatamente não há condições de um candidato de oposição ganhar as eleições venezuelanas, os Estados Unidos procurarão pressionar para que possa emergir do chavismo um candidato mais à direita. Nós sabemos que esses movimentos nacionalistas passam por etapas sucessivas. O peronismo (Argentina) surgiu como movimento nacionalista, mas na década de 90, Carlos Menem, que era seu representante, levou a uma privatização completa do país. Lógico que isso não pode acontecer tão de imediato na Venezuela, mas os Estados Unidos vão trabalhar com paciência e com força para distorcer o rumo político da Venezuela, fazendo emergir uma liderança política mais à direita, mais suscetível às pressões do Imperialismo norte-americano do que foi Hugo Chávez. Obviamente que, tudo isso é matéria especulativa, pois neste momento os Estados Unidos devem estar desfolhando a margarida porque, se de um lado, o governo norte-americano está comprometido com a oposição a Chávez, por outro lado, não vão descartar, como ocorreu em outros casos, como o da Argentina, tentar influenciar o destino da coalizão chavista.

 

 

* Com edição do ANDES-SN

Entrevista à Fritz R. Nunes

 

Fonte: Sedufsm, 7/3/13.

 


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