Ativistas denunciam a criminalização dos movimentos sociais e o
extermínio de militantes em Rondônia
No primeiro dia do 32º Congresso do ANDES-SN, durante a plenária do
tema 1, dois militantes denunciaram as arbitrariedades que têm sido
cometidas por empreiteiros e por latifundiários contra os
trabalhadores da Usina Hidrelétrica de Jirau em Porto Velho
(Rondônia) e contra os integrantes da Liga dos Camponeses Pobres.
Após a greve de 2012, quando funcionários contratados pela empresa
Camargo Corrêa reivindicavam melhores condições salariais e de
trabalho em Jirau, 11 operários desapareceram e outros 13 respondem
a processo judicial. À época, a greve foi considerada ilegal pela
Justiça do Estado. Ainda em Porto Velho, em abril do ano passado, o
camponês Renato Natã Gonçalves foi assassinado pela polícia. Até o
momento, ambos os casos continuam impunes.
Carlos Moysés Maia da Silva, 21 anos, é um dos operários de Jirau
que será julgado pela Justiça. Passou meses na cadeia pelo fato de
ter reivindicado seus direitos. “Todo trabalhador tem o direito a
fazer sua greve. Quero que minha inocência seja provada. Espero para
receber os meus direitos e, até agora, não consegui que eles dessem
baixa na minha carteira de trabalho. Faz um ano que estou
desempregado, porque não consigo que outro lugar me contrate e eles
não liberam a minha carteira de trabalho”, conta. Para sobreviver,
Calos Moysés tem recebido o apoio de diversas entidades, sendo uma
delas o Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos - CEBRASPO, que
tem orientado os operários de Jirau no embate jurídico que travam
com o empresariado e a magistratura de Rondônia.
José Pimenta, um dos integrantes do CEBRASPO, reforçou a importância
das reivindicações dos trabalhadores de Jirau, salientando que o
tratamento dispensado aos operários é precário. “Cerca de 20 mil
operários estão nos canteiros de obras. Imagine 200 homens dormindo
num alojamento, sem ar-condicionado, em Rondônia. Eles recebem
pouco, fazem hora-extra e não ganham por ela. As horas-extras vão
para o banco de horas, que é controlado pelo empresariado”, diz.
O representante do CEBRASPO está incumbido de levar a Rondônia um
grupo de advogados para defender os trabalhadores de Jirau.
“Acompanhamos todo o processo e na última semana houve uma audiência
no Tribunal de Justiça de Porto Velho. Uma grave situação que tem se
repetido com frequência é o advogado da Camargo Correa dar instrução
para o promotor público dentro da sala de audiência. Nossos
advogados tiveram que protestar contra isso, porque, no caso desse
processo, a empresa dirige o Ministério Público”.
Segundo Pimenta, dentre os 24 trabalhadores que respondem ao
processo judicial, 13 operários foram libertados depois de muita
pressão. Contudo, a absolvição foi dada pelo Habeas Corpus e
com liberdade provisória. “Para quem é trabalhador, liberdade
provisória é uma incriminação antecipada”, diz. Ele revela que os
onze operários desaparecidos têm sido tratados pela Justiça do
Estado como foragidos. “O juiz toma posição antes de haver um
julgamento, antes que aconteçam as audiências de instrução. As
testemunhas de defesa ainda não falaram!”
O representante do CEBRASPO também não poupou críticas à ação
policial no Estado. De acordo com Pimenta, os trabalhadores foram
presos no dia 3 de abril de 2012, embora a ordem de prisão tivesse
chegado somente no dia seguinte. Supostamente, eles foram levados ao
presídio de Urso Branco -- condenado mundialmente pela violação dos
Direitos Humanos, fazendo do Brasil réu na Corte Interamericana de
Justiça. “A única preocupação do Estado é reprimir. Ninguém quer
saber se os trabalhadores têm razão nas suas reivindicações. A Força
Nacional e a polícia de Rondônia percorrem os canteiros de obras. No
mês passado, operários da Usina Hidrelétrica de Ferreira Gomes
(Amapá) e da Usina de Colíder (Mato Grosso) também se rebelaram. Mas
a primeira medida da Justiça foi mandar prender. Não se preocupa em
julgar, em provar. Temos um problema no Brasil: todas as obras do
PAC têm greve. Ou os trabalhadores do país são uns revoltados natos
que não aceitam a realidade, ou a realidade não pode mesmo ser
aceita por eles”, avalia.
José Pimenta informa que, conforme planos do governo federal, haverá
a construção de mais Usinas para a região amazônica. Contudo, as
obras serão realizadas em áreas inóspitas, sem que os trabalhadores
contem com a infraestrutura de cidades próximas. Ficarão isolados, à
mercê de doenças e de todos os tipos de arbitrariedades.
O representante do CEBRASPO lembra que uma Comissão de Parlamentares
foi impedida de visitar as obras em Jirau no ano passado. Diz que a
Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil de
Rondônia tem se preparado para visitar o canteiro de obras nos
próximos dias. “Se não tivesse problema, qualquer um poderia entrar.
Quem é que faz a lei nestes lugares? Por que existe um empenho tão
grande da empreiteira para provar que os trabalhadores são
baderneiros? Porque, com o atraso nas obras, a Camargo Correa pode
recorrer ao seguro contratado em Londres, que vai de R$400 milhões a
pouco mais de R$1bilhão”, diz, lembrando que o CEBRASPO não é a
única entidade que se faz presente em Jirau. Em Porto Velho, os
trabalhadores contam com a solidariedade da Ordem dos Advogados, da
Comissão de Justiça e Paz, da Liga dos Camponeses Pobres e outras
que atuam contra a criminalização da luta.
“Antes, a campanha era de repressão e criminalização; agora é de
extermínio”
Madalena Ribeiro é avó da menina Vitória, de 3 anos, que tornou-se
órfã de pai em abril de 2012. O jovem Rodrigo Natã Gonçalves,
professor e integrante da Liga dos Camponeses Pobres, foi brutamente
assassinado pela polícia de Rondônia. Ela falou ao plenário do
32ºCongresso do ANDES-SN, em busca de solidariedade na sua luta por
justiça. Quer que os culpados pela morte do genro sejam julgados e
que sejam empreendidos os esforços para denunciar a onda crescente
de extermínio às lideranças dos movimentos sociais que lutam pelo
direito a terra, não só para os companheiros de acampamentos como
Canaã e Raio de Sol (Ariquemes - RO), mas para os de todo o país.
“Temos sofrido vários ataques da imprensa, que está a serviço da
justiça comprada, dos latifundiários, dos empresários e da polícia.
Existe uma campanha de criminalização do movimento camponês e nossas
lideranças têm sido identificadas, mapeadas por pistoleiros do
latifúndio. O INCRA tem infiltrado pessoas no movimento para saber
quem são nossos aliados.Antes, a campanha era de repressão e
criminalização; agora é de extermínio. E isso não acontece só em
Rondônia, mas também no Pará, no Tocantins e em todo o país”, diz.
Segundo Madalena Ribeiro, o genro foi assassinado porque era vizinho
de um suspeito pela morte de dois policiais. Ele não teve direito à
defesa. Não foi interrogado ou investigado. Morreu em uma emboscada,
pois, há muito havia o interesse de silenciá-lo, pois era uma
importante liderança da Liga dos Camponeses Pobres. Preserva a
memória de Renato, afirmando que ele era honesto, bom pai, filho e
esposo. “Se ele fosse safado, eu não estaria aqui, lutando por
justiça. Mas eu o conheci. Ele foi acusado injustamente, até porque,
no dia dos crimes contra os policiais, ele estava em minha casa, que
fica a 250 km de distância. Ele não enfrentou um júri. E em
Rondônia, a polícia olha para a cara da pessoa e simplesmente pode
prendê-la. Estamos em ampla campanha para denunciar. Não vamos nos
encolher num canto, porque não estamos dispostos a nos calar. O povo
conhece os seus direitos. Não queremos bolsa esmola. Queremos um
país democrático de verdade; que o povo tenha saúde e educação
decente. Não somos desordeiros da paz, queremos destruir o que é
velho para que se construa o novo”, afirma aguerrida.
Por Aline Pereira (ADUR-RJ)