“Aldeia Maracanã
deve ser pensada e gerida por índios”
Desde que o
prefeito Eduardo Paes e o governador Sérgio Cabral publicaram
decretos que tombam o prédio do antigo Museu do Índio, os rumos e o
futuro da Aldeia Maracanã estão em disputa.
De um lado, está
a proposta do governo de criar um “Centro Estadual de Estudos e
Difusão da Cultura Indígena”. De outro, está o projeto, defendido
por algumas etnias, de fundar as bases de uma Universidade Popular
Indígena.
Nesta entrevista
ao Brasil de Fato, a liderança Urutau Guajajara defende que o espaço
não tenha intervenção do Estado e conta como funcionaria a
Universidade Popular Indígena.
Brasil de Fato
– Paes e Cabral voltaram atrás e resolveram tombar o Museu do
Índio. Agora a proposta é viabilizar um Centro Estadual de Estudos e
Difusão da Cultura Indígena. Qual é a sua opinião sobre este Centro?
Urutau Guajajara
– O Centro não pode ser estadual porque questões indígenas são
questões federais. Primeiro, porque o patrimônio está no nome da
União. Segundo, porque é uma questão indígena fundiária e de
demarcação de um território. De qualquer forma, estamos encaminhando
essa discussão em grupos de trabalho que estão debatendo o assunto.
Mas é problemático um centro “estadual”.
Você defende que
o Centro Indígena não tenha intervenção do Estado. Por que a
autonomia dos índios é importante?
Porque essa é a
chance da Aldeia Maracanã ser o primeiro patrimônio verdadeiramente
indígena, pensado e gerido por índios. Nossa posição é que o Estado,
prefeitura ou governo federal, venham apenas como parceiros.
Reivindicamos isso porque, nesses 513 anos, nós nunca saímos da
tutela do Estado. Queremos que o Estado tutele apenas nossos
direitos e não o ser humano. Isto está garantido na Constituição e
em várias convenções internacionais. Nós queremos administrar nosso
patrimônio. Este é o início de uma reparação de danos históricos.
A Aldeia Maracanã
sempre foi referência para índios de diferentes etnias e estados que
se hospedavam no prédio. Porém, o governo rejeita a possibilidade de
que o prédio continue servindo como moradia. Como vocês avaliam
isso?
Provavelmente não
será como antes, mas queremos que exista um espaço para moradia,
sim. Estamos planejando viabilizar uma Universidade Popular Indígena
e, com certeza, teremos alunos residentes de outros estados e vamos
precisar garantir residências provisórias para estas pessoas. Não
seriam moradias permanentes e esta seria uma forma de contornar a
situação. De qualquer forma, já temos uma série de reuniões marcadas
para debater este e outros temas.
Vocês também
travam negociações com o governo federal?
Nós também
negociamos com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan). Isto acontece porque o município pode tombar e
destombar no dia seguinte. Esse tombamento aconteceu por um milagre
e achamos tudo muito estranho porque o Eduardo Paes e o Sérgio
Cabral nunca foram simpáticos com a gente. Na angústia de preservar
a Aldeia Maracanã e evitar que o prédio fosse colocado a baixo,
descobrimos que qualquer prédio anterior a 1937 automaticamente tem
que ser tombado. E simplesmente o Eduardo Paes sempre rejeitou isso,
mesmo existindo lei. Agora ele e Cabral mudaram de ideia. Pelo
visto, milagres acontecem.
Que tipo de
tombamento vocês defendem?
No Iphan estamos
discutindo o tipo de tombamento que queremos: com Universidade
Popular Indígena, centro indígena e, principalmente, índios. Um
tombamento em que caiba o ser humano desenvolvendo atividades
culturais. Na universidade teremos cursos de tupi guarani e
legislação indígena, por exemplo. O nosso caso, sem dúvida, é uma
situação totalmente nova para o Iphan que só está acostumado a
tombar igreja. Infelizmente, o processo no Iphan está sendo muito
lento.
Fonte: Brasil de Fato, Vivian Virissimo, 21/8/13.