Programas habitacionais não contemplam os “de baixo”
Grosso do déficit
habitacional está concentrado nas classes D e E
A análise do
arquiteto e urbanista Pedro Arantes aponta que houve pequena
mobilidade na relação entre as massas populares e o acesso à moradia,
mas especifica qual fração conseguiu essa inclusão: “enquanto o
mercado imobiliário se concentrava no topo da pirâmide social, nas
chamadas classes A e B (acima de 10 salários mínimos de renda
familiar), na última década houve um alargamento do mercado para
incluir estratos até 6 salários”, descreve. São dois segmentos
diferentes, de acordo com Arantes. “O MCMV atende em duas modalidades:
oferta de mercado com incorporação imobiliária e subsidiada pelo
governo para a faixa de 3 a 10 salários mínimos (a chamada classe C) e
construção privada direcionada para atendimento a demanda abaixo de
três salários mínimos (classes D e E), organizada em imensas filas
pelas prefeituras em função de prioridades de atendimento (áreas de
risco, remoções, mulheres chefe de família, idosos etc)”, explica.
Portanto, a tão
propalada “classe C” teve acesso ao mercado imobiliário via mecanismo
financeiro, ao passo que, para as pessoas com renda entre 1 a 3
salários mínimos a oferta ainda é insuficiente, permanecendo
confinadas nas periferias-extremas e sem condições dignas de vida. Daí
talvez a resposta para a lacuna de insatisfação deixada pelo programa
Minha Casa, Minha Vida. “A emergente classe C, que cresceu em ritmo
chinês nos anos Lula, e teve acesso a bens de consumo que não tinha
antes, está sendo atendida pelo MCMV e a previsão é de quase zerar o
déficit habitacional para as famílias com renda acima de 1,6 mil
reais. Acontece que o grosso do déficit (87%) está situado nas classes
D e E, que será muito menos atendida e, quando atendida, com
empreendimentos habitacionais muito piores”, define Arantes.
Os dados da fila
da Cohab, em Curitiba e na Região Metropolitana, que refletem a
demanda reprimida por moradia, encaixam com perfeição na análise
acima. A maior faixa salarial inscrita na fila da Cohab percebe de 1 a
2 salários mínimos. No total são 27 mil pessoas, 31,58% das famílias
inscritas, seguidas de 24.166 pessoas com renda mensal de 02 a 03
salários mínimos, (28,26% dos inscritos). O número de inscritos na
fila da Cohab-Curitiba teve um salto gigantesco a partir de 2009,
possivelmente vinculado ao lançamento de programas governamentais,
como o Minha Casa, Minha Vida. De 2.355 pessoas (2002), a procura
passou a 15.198 nomes (2011) apenas na capital paranaense. Desse modo,
se arrola para o futuro o problema de exclusão e desigualdade
brasileira: o grande déficit habitacional, a especulação imobiliária,
os monopólios territoriais. “São essas pessoas que estão indo para
ocupações de terra, os antigos e novos Pinheirinhos. São os que não
têm condições de ir num estande de vendas de habitação econômica de
mercado para comprar sua casa nova e ficam em filas intermináveis do
governo, sem saber quando vão ser atendidos. E são os que têm as
condições mais precárias de moradia, em áreas de risco, favelas,
cortiços etc. São esses ‘danados da terra’ que recebem o Bolsa Família
e outros programas sociais, mas que não estão sendo incluídos com a
mesma proporção e velocidade que a classe C”, aponta Arantes.
Fonte: Brasil de
Fato, Pedro Carrano, 30/3/12.