Em Manaus, empresa desaloja pequenos agricultores com o pretexto de
crime ambiental
Mais de 250
famílias foram despejadas de suas terras na comunidade de Novo
Paraíso/ Frederico Veiga, localizada no igarapé do rio Tarumã, zona
periférica de Manaus. Há décadas, as terras são motivo de disputa
entre os agricultores e o empresário Alcione Pigmata Bonfim, dono da
empresa de construção civil Eletroferro S/A e proprietário de terras
na região. Os moradores, acusados de crime ambiental, negam a acusação
e dizem que são vítimas de interessex imobiliários.
Por volta das
sete horas da manhã da última quarta-feira (1), mais de 250 famílias
foram despejadas de suas terras na comunidade de Novo Paraíso/
Frederico Veiga, localizada no igarapé do rio Tarumã, zona periférica
de Manaus.
Em 50 anos de
assentamento, é a quinta vez que as famílias são retiradas do local,
mas a primeira com ordem de reintegração de posse, assinada pela juíza
Joana dos Santos Meireles, da 7ª Vara Cível de Acidentes de Trabalho.
Há décadas, as
terras são motivo de disputa entre os agricultores e o empresário
Alcione Pigmata Bonfim, dono da empresa de construção civil
Eletroferro S/A e proprietário de terras na região. Os moradores são
acusados de crime ambiental. A empresa denunciou-os por supostamente
explorarem de maneira irregular o areal da região, que está numa Área
de Preservação Ambiental (APA). Os agricultores negam a acusação e
afirmam que usam as terras do assentamento para plantio e criação de
pequenos animais.
Sem aviso prévio,
um grupo de autoridades e oficiais liderados pela Secretaria Municipal
de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Manaus (Semmas), pela Ronda
Extensiva Cândido Mariano (Rocam), pela Polícia Militar e bombeiros,
retirou os moradores e derrubou com tratores os barracos.
Segundo a
assessoria de imprensa da Semmas, durante a reintegração foram
comprovados danos ambientais causados pelos moradores e “um relatório
já está sendo feito sobre o caso”.
“Faz 50 anos que
eu moro aqui e a única coisa que fiz foi plantar macaxeira, arroz e
cana’’, conta o seu João Caetano, de 92 anos, um dos primeiros
moradores do local.
“Quando eu
registrei minha terra como posseiro no Incra, eles me disseram: ‘Só
Deus te tira dessa terra.’ E agora minhas coisas estão na chuva,
debaixo do meu barraco derrubado, porque nem me deram a dignidade para
entrar lá e recolher o que é meu”, contou João Caetano.
Os moradores
denunciam que abusos foram cometidos não só nessa reintegração, mas em
todos os outros despejos.
O agricultor
Rodolfo Caetano, de 37 anos, filho do seu João, diz que houve
violência na desocupação. “A polícia não fez nada, ficou só de fora
olhando, mas os jagunços da Eletroferro, com o uniforme da empresa,
com os carros da empresa, entraram batendo em todo mundo.
Pegaram meu pai,
que tem mais de 90 anos, pelo pescoço e o jogaram pra fora de casa.”
Para o
responsável pela Cáritas Arquidiocesana de Manaus, Antônio Fonseca,
houve violação de direitos humanos durante a reintegração.
“Não foi só a
violência com a qual os moradores foram retirados de suas casas, mas o
que ainda está acontecendo. A maioria das pessoas está acampada sob
lonas estendidas na beira do rio Tarumã, em uma área de propriedade da
Marinha. Nós somos impedidos de entrar lá para levar água e alimentos.
Para ajudá-los, temos que atravessar o rio de barco.’’
"Nós estamos
morando debaixo de uma árvore aqui da rua em frente à Comissão
Pastoral da Terra, que está nos ajudando com tudo, comida água e
advogado", conta o seu João Caetano.
Para muitos dos
moradores, que vendiam alguns de seus produtos orgânicos nas bancas
destinadas à agricultura familiar da feira organizada pela Secretaria
Estadual de Produção Rural, a Eletroferro tem interesse no areal da
região.
"Há seis anos nós
acompanhamos essa comunidade de agricultores e o único problema dela é
que ela está em uma área de expansão da cidade de Manaus, uma área
nobre, onde estão sendo construídos vários condomínios. É por isso que
não querem esse povo aqui", diz Antônio.
Fonte: Ag.
Carta Maior, Felipe Blumen, 7/2/12.