Mais de 35 mil vão às ruas fundar novo movimento de esquerda na
Colômbia
Marcha Patriótica quer ser “voz” de indígenas e camponeses e defende
reforma agrária e fim do conflito armado
Mais de 1.700
organizações representativas da sociedade civil da Colômbia foram às
ruas nesta segunda-feira (23) para oficializar a criação da Marcha
Patriótica, um novo movimento de esquerda que tem como principais
reivindicações a reforma agrária e o fim do conflito armado.
Cerca de 35 mil
pessoas, em sua maioria famílias de camponeses, indígenas e estudantes
foram à Bogotá para participar da Marcha. O grupo conta com apoio de
ONGs como Colombianos Soy Yo, dirigido pela ex-senadora Piedad Córdoba
e de entidades estrangeiras, como o PCB (Partido Comunista
Brasileiro).
David Flores, um
dos dirigentes do movimento, afirmou que a Marcha é uma alternativa
apresentada pela sociedade colombiana ao modelo neoliberal. “Não somos
um partido, mas queremos construir uma plataforma, um modelo
alternativo político e social”, ressaltou Flores.
Além de
colombianos, participam da Marcha cem representantes de movimentos
sociais de outros países, como Brasil, Argentina, Bélgica, Canadá,
Chile, Cuba, Dinamarca, Grécia, Estados Unidos e Espanha.
No Brasil, o
movimento recebeu apoio do Partido Comunista Brasileiro e da
historiadora Anita Leocadio Prestes, filha do líder comunista Luís
Carlos Prestes. Em artigo publicado no site do PCB, Anita saudou os
colombianos pela realização da marcha. “O surgimento de um novo
movimento social e político como a Marcha Patriótica é revelador da
disposição de luta por uma solução política do conflito interno nesse
país por parte de setores importantes da sociedade colombiana, que
clamam por justiça e democracia”, escreveu Anita.
Clamor popular
Os dirigentes da
Marcha garantem que não se trata de um grupo de “rebeldes”. “Nós não
somos insurgentes. Levantamos a bandeira da nacionalização dos
recursos, distribuição das riquezas e da reforma agrária, mas
acreditamos na luta democrática”, explicou Joaquín Romero,
representante da Federação Sindical Mundial.
A ideia de
articular o movimento surgiu há dois anos, em julho de 2010, durante
as comemorações do Bicentenário da Independência. O Polo Democrático,
que representa formalmente os partidos da esquerda colombiana, não
participa ativamente do movimento. “Alguns políticos nos apoiam
isoladamente, mas não temos respaldo formal deles. Nós queremos
independência”, comentou Romero.
O movimento busca
se tornar uma “voz” para grande parte da sociedade colombiana. A
maioria é composta por camponeses e indígenas, mas pessoas que têm
outras demandas também participam em busca de apoio. É o caso da
professora Cristina Hernandez, que perdeu a casa em uma enchente no
ano passado na cidade de Santa Luzia, na Costa Pacífica. Ela conta que
a cidade ficou completamente inundada e que a família dela ficou sem
trabalho. “Vivemos da terra e agora não temos o que fazer. O governo
nos ajudou por dois meses, mas, desde agosto, não recebemos mais
dinheiro e não temos nem onde viver” relatou.
Tensão
Desde a manhã
desta segunda-feira (23), em Bogotá, a Polícia, o Batalhão de Choque e
o Exército já estavam posicionados à espera dos manifestantes. O
prefeito da capital colombiana, Gustavo Petro (ex-integrante do
movimento M-19) disse pela manhã que o policiamento seria reforçado
para garantir a paz e a tranquilidade na cidade.
Mesmo assim,
antes do início da Marcha, Opera Mundi acompanhou a chegada dos
policiais. Fortemente armados, os oficiais cercaram o Palácio da
Justiça, a Prefeitura e o Palácio do Governo. Muitos levavam grande
quantidade de gás lacrimogênio.
O estudante de
comunicação Andrés Azevedo veio do Departamento de Pereira para
participar da Marcha. “Tem muita polícia aqui. Creio que isso é para
nos intimidar”, disse.
A ex-senadora
Piedad Córdoba também acusou que, durante as reuniões preparatórias do
final de semana, haviam infiltrados da inteligência do governo.
Segundo ela, alguns setores do Exército e políticos colombianos
estariam “instigando” a sociedade contra a criação do movimento. “Eles
estavam tirando fotos e nos investigando. Mas somos um movimento
pacífico”, reforçou, durante entrevista coletiva.
FARC
Uma das razões
para a hostilidade contra a Marcha é o suposto apoio das FARC (Forças
Revolucionárias da Colômbia) ao movimento. Mas para o cientista
político Mauricio Romero, da Universidade Pontificia Javeriana, não se
pode afirmar que a Marcha tenha sido financiada pela guerrilha.
“A reforma
agrária e a luta contra o neoliberalismo é uma agenda comum entre os
movimentos sociais e as FARC, mas não quer dizer que eles estejam
juntos nesta ação. O que fica claro é que a sociedade colombiana,
especialmente a rural, quer mudanças”, defendeu Romero.
O analista avalia
que o surgimento do movimento pode ser um indício de que se caminha
para uma negociação pacifica com as FARC. Para ele, milhares de
famílias afetadas pelo conflito armado estão cansadas da situação no
campo. “Quem está nesta Marcha quer paz, e também quer terra e
trabalho. Quanto à reforma agrária, é o mesmo discurso das Farc. Só
que quem veio às ruas de Bogotá não lutou com armas”, opinou o
professor.
Fonte: Brasil de
Fato, Leandra Felipe, 25/4/12.