Indígenas Pataxó bloqueiam BR-101 contra PEC 215
Medida propõe a
transferência da demarcação e homologação de terras indígenas,
quilombolas e áreas de conservação do Executivo para o Congresso
Cerca de mil
indígenas do povo Pataxó do extremo sul da Bahia bloquearam, no fim da
madrugada desta terça-feira (10), trecho da BR-101, em protesto contra
a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, aprovada em março pela
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara
Federal.
A PEC 215 tramita
desde 2000 e propõe a transferência da demarcação e homologação de
terras indígenas, quilombolas e áreas de conservação ambiental do
Poder Executivo para o Congresso Nacional. A proposta é defendida
pelas bancadas ruralista e evangélica da Câmara e do Senado, onde
tramita a PEC 038 – siamesa da PEC 215.
“Todo mundo tem
uma noção de que ela só beneficia os latifundiários, que são contra as
demarcações de terras indígenas”, explica o cacique Sinvaldo Ribeiro
de Souza, indígena Pataxó da Terra Indígena Barra Velha. A mobilização
conta também com os Pataxó de Coroa Vermelha e do Parque Nacional do
Descobrimento Monte Pascoal.
A comunidade está
instalada às margens da rodovia na altura do quilômetro 772, município
de Itabela, local do bloqueio. A Polícia Rodoviária está no local e os
indígenas afirmam que só irão desbloquear a BR quando o governo
federal se posicionar e mostrar de que forma irá agir para impedir o
seguimento da PEC 215 – que aguarda a criação de Comissão Especial
pela mesa diretoria da Câmara Federal.
O inspetor da
Polícia Rodoviária Federal, Luiz Gonzaga, informou para a imprensa
regional que os dois sentidos da pista estão fechados. O
congestionamento de veículos chega a quase 30 quilômetros.
Outros dois
pontos da pauta reivindicatória do bloqueio são: rapidez nos processos
administrativos das terras indígenas Pataxó e proteção do Estado aos
caciques e demais lideranças indígenas ameaçadas por pistoleiros e
capangas de fazendeiros.
Questão fundiária
Caso a proposta
ruralista seja aprovada, a avaliação dos indígenas é que não ocorrerão
mais demarcações de terras indígenas no Brasil. “Fomos a Brasília e
tivemos uma esperança de ter nossas reivindicações de terras
atendidas. Quando chegamos vimos a PEC 215 sendo votada. Uma traição
que não se pode aceitar”, diz Sinvaldo.
Durante a votação
da PEC na CCJC, os Pataxó estiveram na Capital Federal para reuniões
na Funai, Incra, Supremo Tribunal Federal (STF) e Ministério de Minas
e Energia. Em todos os encontros a questão fundiária estava em pauta.
No Congresso Nacional, portanto, fizeram intensos protestos contra a
proposta ruralista.
Nos território
Pataxó do extremo sul baiano, nas terras indígenas de Barra Velha,
Parque Nacional Monte Pascoal e Coroa Vermelha incidem tipos variados
de ocupação não-indígena, conforme atestam relatórios publicados pela
Funai. Fazendas de gado de corte e cacau, registradas a partir da
década de 1980, dominam a maioria dos hectares, além de uma área de
reflorestamento de eucaliptos, Parque Nacional e assentamentos da
reforma agrária.
A Terra Indígena
Coroa Vermelha passa por processo de revisão e Barra Velha possui 8
mil hectares registrados, mas reivindica outros 52 mil que compreendem
o Parque Nacional do Monte Pascoal, controlado pelo Instituto Chico
Mendes (ICMBio). “O relatório de identificação desses 52 mil foi
publicado (em 2008), mas até agora o ministro da Justiça não assinou a
Portaria Declaratória”, salienta Sinvaldo.
Deputados
federais que compõem a Frente Parlamentar de Defesa dos Povos
Indígenas alertaram sobre a insegurança jurídica e fundiária como
consequência imediata da aprovação da PEC 215 pela CCJC: “Aprovar essa
PEC intensificará os conflitos entre indígenas e fazendeiros, porque a
demarcação de terras já não ocorre conforme o esperado”, destacou o
deputado Padre Ton (RO/PT), presidente da Frente Parlamentar, durante
as sessões da CCJC que tratou da proposta.
Fora o
posicionamento contra a PEC 215, os Pataxó reivindicam do governo
federal a assinatura da Portaria Declaratória de demarcação da Terra
Indígena Barra Velha do Monte Pascoal (envolvendo a terra Barra Velha
e a área já identificada onde incide o Parque do Descobrimento) pelo
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
“Estamos
revoltados com essa PEC 215 e deixamos um recado: não queremos
conflito e violência, mas também não vamos permitir que nos tirem
nossas terras, dadas por Deus e não pelo homem branco”, finaliza o
cacique.
Fonte: Brasil de
Fato, Renato Santana do Cimi, 10/4/12.