Governo aumenta vagas nas federais, mas falta infraestrutura nos
câmpus
O Reuni, lançado
em 2007 para reestruturar as universidades, fez crescer em 63% o
número de vagas entre 2006 e 2010; no entanto, deixou as instituições
sem bibliotecas, laboratórios e salas de aula
Lançado pelo
governo federal em 2007 com a missão de reestruturar universidades e
ampliar o acesso dos brasileiros ao ensino público superior, o
Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das
Universidades Federais (Reuni) cumpriu a segunda parte das promessas.
O número de vagas
oferecidas anualmente aumentou 63%, passando de 148.796, em 2006, para
242.893, em 2010 - dado mais recente do Ministério da Educação (MEC).
Os investimentos em infraestrutura, porém, não chegaram junto com os
alunos. As primeiras turmas dessa expansão estão deixando as
universidades depois de atravessarem o curso com bibliotecas
desabastecidas, sem aulas em laboratórios, salas superlotadas e
professores assoberbados. O MEC admite problemas, mas alega que eles
ocorrem por causa do pioneirismo do Reuni, "um dos programas de maior
sucesso da história da educação do País".
Os problemas se
multiplicam pelo País. São aulas em contêineres, em porões,
laboratórios improvisados em banheiros, falta de restaurantes
universitários. A estudante de terapia ocupacional, Larissa Reis, de
19 anos, conta que está no terceiro semestre da faculdade e tem aulas
em laboratório a cada 15 dias.
"É muita gente e
o professor divide a turma em duas. Ele dá a mesma aula duas vezes",
conta. Larissa é estudante do câmpus de Ceilândia da Universidade de
Brasília (UnB), que funciona provisoriamente em 13 salas de uma escola
de ensino médio. O barulho dos adolescentes atrapalha as aulas. "Não é
o que eu esperava. É tudo muito precário."
O câmpus de
Ceilândia é voltado para cursos de saúde. "Tinha um mini laboratório
com três microscópios. Três estudantes utilizavam os instrumentos e
instalaram um telão do lado de fora e uns viam os que outros estavam
fazendo, mas não tinham a prática", diz Lucas Brito, de 21 anos, aluno
de Serviço Social.
Segundo ele,
neste semestre está se formando uma turma de Fisioterapia que não teve
aula prática, só teórica, por meio de slides. "As pessoas vão se
formar sem a mínima segurança de que possam atender", afirma.
Risco.
Professores da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro elaboraram
um dossiê com fotografias e o encaminharam ao Sindicato Nacional dos
Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes). As imagens
mostram salas de prédios recém-construídos com rachaduras, órgãos de
animais cobertos por larvas, por causa da falta de formol, e a fachada
do câmpus principal deteriorada - a reitoria informa que as rachaduras
não oferecem risco e a obra no prédios antigos estão para ser
licitadas.
O professor de
anatomia animal da Rural Luciano Alonso diz que os alunos são
obrigados a lidar com peças de animais apodrecidas, por falta de
material para conservação. "Técnicos, alunos e professores se expõem a
pegar infecção por manusear peças sem condições. O material para
manutenção não chega, porque o sistema de compras é falho, a solução
usada no preparo das peças perde o poder de conservação. As peças
exalam mau cheiro, têm larvas de mosca. Descartamos quando chega no
limite", conta. "A reitoria abriu espaço para discutirmos os
problemas. A questão é que o governo impõe metas às universidades, que
não têm condições de seguir aquele cronograma."
A falta de
estrutura e de professores levou alunos do curso de Medicina da
Universidade Federal do Rio de Janeiro a decretarem greve em abril, no
câmpus de Macaé, norte fluminense. "Somos a primeira turma. O curso
está sendo construído com a gente. Até a metade do primeiro período,
só tínhamos um professor, de bioquímica. Todo período começa com
atraso porque a universidade não contratou professores", conta Larissa
Costa, aluna do sexto período.
Até agora, os
estudantes não tiveram aula em laboratório de anatomia com cadáveres
nem em hospital de referência. "A essa altura, nós precisávamos estar
inseridos no atendimento hospitalar", lamenta.
Os alunos do 5.º
e 6.º períodos foram transferidos para o Rio e não se sabe se vão
concluir o curso no câmpus sede. A reitoria informou que o laboratório
de anatomia em Macaé ficará pronto em três meses.
Fonte: O Estadão,
Clarissa Thomé, RJ, 13/8/12.