Seminário “Ciência e Tecnologia” reúne professores de todo o país
 

Discussões sobre o caráter antidemocrático para o registro de patentes, a função social do conhecimento produzido pela ciência e o Plano Nacional de Pós-Graduação foram os assuntos que dominaram as discussões durante o primeiro dia do seminário “Ciência e Tecnologia no Século XXI”, promovido pelo ANDES-SN no auditório Dois Candangos, na Universidade de Brasília. Nos dois dias (17 e 18), professores de todo o país participaram das quatro mesas de debates. A ADUR-RJ esteve presente no evento, contando com a participação dos professores Ana Cristina S. dos Santos, Regina Cohen, Heitor Motté Filho, Aurélio Baird Buarque Ferreira e Silas Varella Fraiz Júnior, e dos alunos Caroline Barbosa Rufino Otávio e Geovane Henrique Salgado do Carmo (ambos do CTUR/UFRRJ).

A primeira mesa tratou do tema “Capitalismo, Centro e Periferia na Produção do Conhecimento”, e teve como palestrantes o professor da Università di Roma Francesco Schettino, o professor da Universidade de Buenos Aires e dirigente do Partido Obrero da Argentina Pablo Rieznik e a professora da Universidade Federal Fluminense Ângela Siqueira.

Na sua fala, o professor Francesco Schetinno mostrou dados da sua tese de doutorado sobre o registro de patentes na União Europeia. “O sistema de proteção intelectual é anti-democrático. Pequenas empresas não têm a mesmas condições de acesso à proteção de patentes”, informou.

Para Schetinno, a inovação é um fetiche para o capitalista, pois quem não inova está perdido. Essa tendência à inovação está na raiz da concentração de patentes e no que o professor define como “composição orgânica do capital”. Para o estudioso italiano, a cada inovação é reduzido o trabalho humano na produção e, também, a taxa de lucro. “Cada vez mais temos produtos melhores e mais baratos”, concluiu Schettino. Isso, segundo ele, tem levado as empresas a abandonarem a economia real, já que o retorno é pequeno, o que acelerou a crise do capitalismo.

Crise atual

O ativista argentino Pablo Rieznik afirmou que a atual crise do capitalismo é muito grave e vai provocar uma mudança radical do mundo. “Até o  momento, tudo parece igual, mas não vai ser. A Europa, por exemplo, é uma incógnita. O capitalismo está impondo um retrocesso, que pode ser civilizatório”, alertou.

Para Rieznik, a tecnologia e o capitalismo, que foram revolucionários em sua época, hoje não conseguem responder às questões sociais. “O patenteamento no setor de petróleo, por exemplo, significa que grandes empresas compram diariamente patentes para deixar que outros não as desenvolvam. É o capitalismo levando a produção científica a uma catástrofe, a uma privatização do conhecimento”, denunciou.

O professor  argentino acusou os governos dos Kirchner na Argentina e do PT, no Brasil, de manterem a mesma ideologia de seus antecessores na área das ciências.  “Não há nada de novo em matéria científica na América Latina. Foi mantida toda a política neoliberal” afirmou.

PNPG

A professora Ângela Siqueira, da Universidade Federal Fluminense, denunciou a apropriação do conhecimento produzido pelas universidades pela iniciativa privada. “Os capitalistas brasileiros não investem em ciência e tecnologia. Preferem se apropriar do conhecimento produzido pelas universidades, que responde por 80% da produção científica do país. É a privatização do conhecimento”, denunciou.

Ângela Siqueira criticou o novo Plano Nacional de Pós-Graduação (PNBG), produzido por tecnocratas do governo, sem a participação da academia. “Além de acirrar o produtivismo nas universidades brasileiras, aumenta o poder das agências de fomento”, afirmou.

“A universidade perdeu a autonomia para pesquisar. A Capes é quem dita as regras, que devem ser seguidas pelos pesquisadores, pois, caso contrário, perdem o financiamento para as pesquisa. Não existe mais o tempo acadêmico”, lamentou.

Para Ângela Siqueira, a universidade brasileira não está preocupada com o desenvolvimento da pesquisa, que demanda tempo, mas em produzir inovação tecnológica, que interessa à iniciativa privada. “Para quem, então, estamos produzindo esse conhecimento?”, questionou a palestrante para responder em seguinte, “não é para o conjunto da sociedade”.

Ela denunciou que com o novo PNPG, a universidade vai caminhar a passos largos para ficar cada vez mais a serviço do capital.  “O PNPG defende financiamento público para a iniciativa privada por meio da vinculação das universidades às empresas. Quem tiver mais vínculos, será melhor avaliado”, pontuou Ângela Vieira.

Ela criticou os parâmetros usados pela Capes. “Será melhor avaliado quem pode publicar lá fora. Isso prejudica todos os pesquisadores brasileiros, sem contar que a produção do conhecimento não é socializada entre a população do nosso próprio país”, criticou.

“Publiquei na Alemanha. Apesar de contar pontos para a Capes, poucos brasileiros terão acesso. Por outro lado, dei uma palestra para dez mil professores em Alagoas, que não conta nada para a Capes. Dentro dessa lógica, eu não poderia estar aqui. Deveria ter ficado em casa escrevendo mais um paper para ser publicado internacionalmente e citado por outros. Mas, quem é citado? Quem publica, mas só publica quem pode pagar”, contextualizou.

“Infelizmente, tudo tende a piorar. Não temos a perspectiva gramisciniana de autonomia intelectual e de definição dos nossos próprios rumos”, lamentou. A solução dada pelo PNPG é melhorar a gestão e tornar os professores mais eficazes, produzindo e publicando artigos. A raiz do problema, segundo Ângela Vieira, está na falta de financiamento para a educação.

 

Fonte: ANDES-SN, com adaptações

 

 


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