Se cuida seu machista, a América latina vai ser toda feminista
Por Diana Helene, do SOLTEC/UFRJ
Marcha das Vadias no Rio de Janeiro
“eu só quero é ser feliz
andar tranqüilamente com a roupa que escolhi
e poder me assegurar
que de burca ou de shortinho
todos vão me respeitar!”
No sábado passado, dia 2 julho de 2011, as ruas de Copacabana foram
tomadas por cerca de 1000 pessoas. Na sua grande maioria mulheres, com
roupas curtas, meias arrastão, sutiãs a mostra, maquiagem exagerada,
flores, maças na boca e placas coloridas com os dizeres: “Machismo
Mata”, “O Corpo é meu!”, “As roupas mudaram. A violência sexual é a
mesma, a séculos!”, “Acredite ou não, minha saia não tem nada a ver
com você”, “Isso não é sobre sexo, é sobre violência”, “Nada justifica
o estupro”, “Estupro não é piada, é violência”, “Meu corpo minhas
regras”, “Sou minha, só minha, e não de quem quiser” entre diversos
outros dizeres.
A “Marcha das Vadias” saiu do posto 4 às 15hs e seguiu até a 12° DP.
As reivindicações da marcha foram centradas na não responsabilização
da mulher nos casos de violência, e nisso está a garantia do direito
de circular no espaço da cidade se vestindo da maneira que julgarem
adequada.
E por que vadia? O nome da marcha assusta, mas ele é fruto de sua
estória. O termo veio do inglês: slut. As Slut Walks começaram este
ano, em Toronto no Canadá, e já se espalharem pelo mundo. O motivo da
primeira marcha foi porque, em uma universidade de Toronto, durante
sua palestra sobre segurança no campus universitário, um policial
afirmou que as mulheres deveriam se preocupar em não sair nas ruas se
vestindo como uma “slut”, ou seja, se vestindo como uma vadia, para
não serem estupradas.
Diante desta declaração, as mulheres da cidade organizaram a primeira
Slut Walk, sob os dizeres “whatever we wear, wherever we go, yes means
yes, and no means no” (o que quer que eu vista, onde quer que eu vá,
sim significa sim, e não significa não), para deixar claro que o
estupro é sempre culpa do agressor, e não das peças de roupas, de
certo modo de se comportar ou dos lugares que as mulheres circulam.
Depois disso, graças a circulação na internet, foram organizadas
centenas de marchas em diversas cidades do mundo. A primeira do Brasil
foi em São Paulo no dia 4 de junho de 2011, espalhando-se por Belo
Horizonte, Brasília, Recife, entre outras.
No Brasil, aproximadamente 15 mil mulheres são estupradas por ano e na
capital do Rio de Janeiro são 10 mulheres estupradas por dia, sem
esquecer que esses são os números das mulheres que tiveram coragem de
declarar que foram estupradas. Mesmo assim, a sociedade brasileira
acha graça quando um humorista faz piada sobre estupro, como o exemplo
recente do comediante Rafinha Bastos, do CQC, que fez uma piada
dizendo que quem estupra mulher feia não deveria ser preso, mas merece
um abraço. Sem esquecer da clássica frase de do deputado Paulo Maluf
‘estupra, mas não mata’, ou o caso da estudante Geisy Arruda que foi
execrada na universidade por causa do seu vestido curto.
“A
cultura de
estupro que vivemos cobra das mulheres que se cubram, se
resguardem e se policiem, ou sofram as consequências. Às mulheres que
se recusam a obedecer não é reconhecido o direito de exigir respeito.
Mais: protestar é cometer o duplo crime de ser inútil e fútil – porque
o protesto não muda nada e uma vida livre de violência sexual não é
uma demanda suficientemente importante perante os outros problemas do
país.” (A
Marcha das Vadias e o ódio na internet, Thais Camargo, Blog
Sociologia
Klingon)
As lutas da libertação da mulher tem historicamente o caráter da
escala do corpo, na fronteira entre o controle individual e estatal
sobre o corpo feminino. Do controle de fertilidade às políticas de
aborto, punições a violência sexual, maneiras de se vestir e em que
lugares o corpo pode acessar na escala urbana, saindo do âmbito
“doméstico”, para as ruas, que são o espaço de poderio e domínio
masculino. As Slut Wlaks são uma maneira de lutar contra o medo que as
mulheres sofrem todos os dias, obrigadas a andar apenas em certos
lugares da cidade ou a usar certos tipos de roupa para se proteger do
perigo constante de serem estupradas.
Fonte: MST