Uma avaliação do FSM Dakar 2011
Samir Amim*
Parece difícil concluir que no transcurso dos dez anos desde seu nascimento,
os fóruns sociais tenham conseguido progressos em sua capacidade de
mobilizar os principais movimentos em luta no ritmo exigido pela urgência
dos desafios. Apesar dos avanços, os fóruns sociais me parecem ter ficado no
fim da fila do trem, sempre em atraso com respeito aos avanços registrados
no campo das lutas. Esta constatação, mesmo que possa parecer dura, não
significa que a existência do Fórum Social Mundial seja um fato irrelevante.
As redes do Fórum do Terceiro Mundo e do Fórum Mundial das Alternativas, em
associação com CODESRIA e ENDA Terceiro Mundo, apoiados por
Transform-Europe, Action Aid e South South People’s Solidarity Network,
estiveram visivelmente mais presentes e ativas na edição Dakar 2011 do que
em edições anteriores do FSM.
A participação da Ásia e da África, presentes nas mesas redondas e
conferências organizadas pelas instituições e redes anteriormente citados,
tornou possível sem dúvida a reunião de grande maioria de africanos e
asiáticos que participaram do FSM Dakar 2011. Um bom número de participantes
assistiu a estas mesas redondas e conferências (mais de 200 de forma
contínua), durante quatro jornadas consecutivas, das 9 da manhã às 7 da
tarde. Os participantes da América Latina e Europa também estiveram
presentes e ativos no transcurso destas quatro jornadas. A qualidade e o
nível das intervenções foram formidáveis.
É unânime a opinião de que a avaliação do FSM deveria, em primeiro lugar,
apontar para a questão dos avanços políticos do Fórum, sem que isso diminua
de maneira alguma a importância de questões relacionadas com a organização e
a logística.
A principal questão política é a seguinte: o avanço em termos políticos
entre uma edição do FSM e outra se detecta em função da capacidade política
de mobilizar as principais forças em luta e que participam ativamente na
transformação do mundo, construindo “outro mundo” melhor.
Em minha apreciação pessoal, todos deveríamos fazer um exercício de
modéstia. As principais forças envolvidas nas grandes lutas de nosso tempo
estão presentes nos fóruns sociais. A título de exemplo ilustrativo, podemos
citar os casos da Tunísia e do Egito, onde gigantescos movimentos populares
têm estado na vanguarda da cena política nestes países, enquanto em Dakar se
desenvolvia o FSM. Poucas das organizações e redes que desempenharam um
papel decisivo no Egito e na Tunísia tinham ouvido falar dos fóruns sociais.
Com certeza poderíamos multiplicar este exemplo em cada um dos continentes
do planeta. Sem deixar lugar para dúvidas, estes movimentos em luta
encontraram um eco entusiasta em muitos participantes do Fórum Social, como
assim testemunham as ovações dadas durante o encontro para os povos egípcio
e tunisiano.
Parece difícil concluir que no transcurso dos dez anos desde seu nascimento,
os fóruns sociais tenham conseguido progressos em sua capacidade de
mobilizar os principais movimentos em luta no ritmo exigido pela urgência
dos desafios. Apesar dos avanços, os fóruns sociais me parecem ter ficado no
fim da fila do trem, sempre em atraso com respeito aos avanços registrados
no campo das lutas.
Esta constatação, mesmo que possa parecer dura, não significa que a
existência do Fórum Social Mundial seja um fato irrelevante. Somente o fato
de concentrar em escala mundial uma série de movimentos (apesar de não serem
os movimentos mais ativos no terreno) é positivo, já que não há muitas
outras ocasiões similares. Considero que os movimentos que participam nos
FSM são perfeitamente legítimos por sua luta em defesa dos direitos
democráticos dos trabalhadores, das mulheres dos povos, assim como de outro
modelo de desenvolvimento que respeite à natureza; e isto apesar de que os
movimentos estão cada vez mais fragmentados. No entanto, creio que se
progrediu na tomada de consciência de que devem ser construídas
convergências, na perspectiva de dar ao movimento em seu conjunto uma
estratégia de ação eficaz. O FSM de Dakar me parece, desde esta perspectiva,
ter se somado a este avanço.
Provavelmente, uma das principais razões que explicam a fraca presença dos
grandes movimentos em luta é financeira. A participação no Fórum Social
Mundial é cara. As ONGs, que frequentemente dispõe de importantes recursos
postos à sua disposição pelas agências internacionais e organismos de
cooperação dos países ricos, estão, consequentemente, sobre representadas em
comparação com outras organizações.
As questões organizativas e logísticas são importantes e as deficiências
registradas neste plano não devem ser excluídas da avaliação. Neste plano,
me parece que o FSM Dakar 2011 não foi “pior” organizado que os anteriores,
levando em conta que o orçamento recolhido para sua realização (e bravo por
Taoufik tê-lo conseguido, pelos esforços incríveis que tornaram isso
possível) foi muito inferior a qualquer dos gastos dos fóruns anteriores.
Detenho-me aqui para felicitar os comitês organizadores, o senegalês e o
africano. De fato, me parece que este fórum foi menos deficiente no plano
organizativo que outros, realizados em países com melhores condições. Também
agradeço à Universidade Cheick Anta Diop, de Dakar, e ao governo do Senegal,
que contribuíram amplamente para facilitar nossa tarefa.
A marcha inaugural em Dakar contou com cerca de 70 mil participantes
(estimativa da polícia, raramente generosa neste ponto), muito mais do que o
previsto.
Apesar desta afluência de gente, tenho que dizer que ao menos no que
concerne às atividades organizadas por nossas redes “aglutinadas”, como se
denomina na linguagem do Fórum Social Mundial, a organização foi perfeita.
Tivemos 36 horas ininterruptas de debate (com assistência majoritária de
participantes da África e da Ásia) sem contratempos, todos os debates nos
mesmos espaços bem equipados e assistidos por um serviço de tradução que não
falhou (muito obrigado, Babels). A realização do Fórum em um mesmo lugar, a
Universidade, permitiu evitar os problemas verificados em outros FSMs,
dispersos na periferia e que impunham grandes deslocamentos. Obrigado a
Dakar, cidade menos opulenta que as outras onde o FSM ocorreu.
(*) Economista egípcio, marxista, diretor do Forum do Terceiro Mundo, uma
associação internacional formada por intelectuais da África, Ásia e América
Latina, destinada a fortalecer os esforços intelectuais e os laços entre os
países do Terceiro Mundo, com sede em Dakar.
Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: Carta Maior
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