Rebatendo preconceitos: a PL 122 e seus críticos
Por Hemerson Ferreira*
O Projeto de Lei
(PL) 122 visa trazer algumas garantias aos homossexuais diante de
crimes que são sendo cometidos contra eles diariamente há muito tempo
em nosso país. Mas esse projeto vem recebendo um festival de
distorções e desinformações propositadas, espalhadas por ignorância ou
má fé, por grupos contrários ao projeto, sobretudo pela chamada
Bancada Religiosa. A votação desta lei foi adiada, novamente, para o
próximo dia 20 de dezembro de 2011, porque não houve acordo a respeito
de muito de seus pontos. O presente texto visa esclarecer um pouco as
propostas desta lei, rebatendo algumas das mentiras de seus críticos:
Homossexuais
terão privilégios especiais? Não. Aqueles que são contra o PL 122
costumam dizer que serão concedidos "direitos especiais aos gays" com
a lei, demonstrando total desconhecimento de seu conteúdo e propósito.
A lei visa equiparar grupos que ficaram fora de outra lei anterior, a
7.716/89, em seu artigo 1º: “Serão punidos, na forma desta Lei, os
crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor,
etnia, religião ou procedência nacional”. Com o PL 122 ,
acrescenta-se: “Serão punidos (...) preconceito de raça, cor, etnia,
religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero,
sexo, orientação sexual ou identidade de gênero”.
Portanto, não
somente seria inclusa a questão da orientação sexual, mas também os
idosos e pessoas com deficiência física, em lei que já protege a raça,
cor, etnia, origem e religião. Não vemos ninguém reclamando sobre
“privilégios” aos demais. E mesmo se fosse o caso, idosos, deficientes
e mulheres já têm suas leis específicas e ninguém se opõe a isso. O
problema, portanto, só existe contra homossexuais.
Não poderemos
mais fazer qualquer crítica aos homossexuais? É outra mentira. O
trecho da PL 122 que gera essa distorção é seu artigo 5º, que diz
claramente: “O disposto neste artigo envolve a prática de qualquer
tipo de ação violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória, de
ordem moral, ética, filosófica ou psicológica”. Infelizmente, o texto
não inclui “religiosa”, ou seja, ainda permitirá que, nas igrejas,
homossexuais continuem sendo tratados como “aberrações”. Não existe
absolutamente nada sobre não falar de homossexuais. Podemos sim, desde
que não sejam ataques ofensivos e preconceituosos, como já acontece
com nordestinos, negros, mulheres, judeus, cristãos, umbandistas etc.
A lei enquadra
apenas os detratores ofensivos, violentos, humilhantes, injuriadores e
desonradores. Religiosos não conseguem realizar seus cultos, rituais e
pregações sem atacar a honra daqueles que não pertencem a sua
igrejinha? Eu creio que a maioria consegue sim. E mais: se a Bíblia
diz que homossexualidade é “aberração”, ela também diz o mesmo sobre
comer camarão: “Porém, tudo o que não tem barbatanas nem escamas, nos
mares e nos rios, todos os que enxameiam as águas e todo ser vivente
que há nas águas, estes serão para vós abominação” (Levítico, 11:10).
O interessante é que não vemos religiosos organizando passeatas,
escrevendo artigos enfurecidos em jornais ou lançando vídeos na
Internet para condenar quem come camarão.
Não se pode mais
demitir funcionários gays? Esta é outra falácia. A (atualmente)
deputada Myrian Rios foi uma das tantas pessoas que tascaram essa
mentira na mídia, dizendo-se “preocupada” se hipoteticamente
descobrisse que sua babá fosse lésbica, não podendo assim demiti-la
por isso. A ex-atriz acha imoral que uma empregada sua faça “coisas”
com sua(s) parceira(s) adulta(s) lá entre quatro paredes, na casa dela
e na sua hora de folga. Mas talvez não se constranja se seus filhos
virem suas fotos nuas existentes na Internet.
Acontece que a
lei não proíbe nenhum contratador de demitir ninguém por justa causa.
Proíbe, sim, demissões por razões meramente pessoais, no caso as
preferências sexuais de seu funcionário. Ninguém pode oficialmente
demitir alguém por ser negro, nordestino, mulher, judeu, umbandista,
cristão ou macho, pois seria preconceito. E, com essa nova lei,
ninguém poderá também demitir um funcionário exclusivamente por ser
gay. Ponto! O resto é ladainha preconceituosa.
Eu poderia me
estender aqui falando sobre um monte de outras distorções ditas a
respeito do PL 122, neste rico e democrático espaço. Mas por hora é
isso. Fica o desabafo e o alerta para que as pessoas não se deixem
envenenar por trapaceiros ideológicos conscientes, ou preconceituosos
inconscientes e ingênuos que reproduzem discursos falsos e atacam o
que desconhecem apenas para tentar barrar, como sempre, a construção
de uma sociedade um pouco mais livre, democrática e justa.
* Hemerson
Ferreira é historiador, mestre em História e professor do ensino
médio.
Fonte: Correio da
Cidadania, 13/12/11.