Professor da UFRRJ condena aterro sanitário em Seropédica
Pesquisa da Coppe avalia gestão de resíduos sólidos no Rio de Janeiro
De 15 mil
toneladas de resíduos sólidos coletados no Estado do Rio de Janeiro,
apenas 8% são selecionados para reciclagem. E desse reduzido
percentual, somente 4% conseguem ser reaproveitados pela indústria. De
acordo com a tese de doutorado defendida na Coppe pelo pesquisador
Cícero Pimenteira, com uma melhor gestão pública e tecnologias
disponíveis, hoje, 80% do material destinado para a reciclagem poderia
ser reaproveitado na indústria, reduzindo prejuízos econômicos e
passivos ambientais.
A má gestão
e, no caso de alguns municípios, a falta de recursos para o orçamento
aplicado na limpeza pública acarretam prejuízos ambientais e
econômicos, podendo resultar em problemas de saúde, como, por exemplo,
epidemias de dengue e leptospirose. “A quantia que o governo deixou de
aplicar em limpeza pública provavelmente terá de ser gasta em ações
emergenciais, tanto em saúde como em obras de contingenciamento. Em
geral, os prejuízos são bem maiores”, adverte o pesquisador, que cita
a tragédia ocorrida recentemente no Morro do Bumba, em Niterói, onde
os moradores ocuparam o terreno de um lixão com a anuência da
prefeitura.
No estudo
que desenvolveu durante quatro anos para a tese de doutorado defendida
no Programa de Planejamento Energético da Coppe, sob a orientação do
professor Luiz Pinguelli Rosa, Cícero avaliou as ações dos gestores de
resíduos sólidos de 19 municípios da região metropolitana do Rio de
Janeiro e o impacto de suas decisões sobre outros setores da
sociedade. Foram analisadas ações de médio e longo prazo propostas por
municípios e avaliado como as decisões tomadas por gestores de
políticas públicas no setor impactam a destinação dos gastos públicos
empregados na gestão de resíduos sólidos.
Instalar
um aterro no município de Seropédica é um equívoco
Como parte
do estudo, Cícero também avaliou as propostas para a substituição do
aterro de Gramacho, que recebe, diariamente, 8 mil toneladas de lixo,
somente do Rio de Janeiro, fora outros municípios, e encontra-se em
processo de encerramento. Uma das alternativas propostas para
substituir Gramacho é instalar um aterro em Seropédica, município da
região metropolitana do Rio.
Para o
pesquisador, a transferência da disposição final de resíduos para o
município de Seropédica é um equívoco, um erro no planejamento
estratégico do estado no médio e longo prazo. “O local proposto está
situado sobre o aquífero Piranema e próximo ao rio Guandu, que é
responsável pelo abastecimento de água do Rio de Janeiro. O risco de
contaminação é muito alto”, adverte o pesquisador. Segundo Cícero, a
escolha de Seropédica também é um erro em termos de planejamento
estratégico de longo prazo, se consideradas as condições físicas da
região. O aterro de Gramacho já atingiu o seu limite. “É necessário um
substituto imediato, mas, estrategicamente, é um equívoco em termos de
planejamento e de risco ambiental”, critica.
Outro
problema identificado durante a pesquisa é de capacitação técnica dos
responsáveis pela gestão. “Muitas das prefeituras não dispõem de corpo
técnico capacitado para tomar decisões acertadas. O que percebemos é
que geralmente os gestores não sabem interpretar ou não analisam com
qualidade todas as informações disponíveis”, acrescenta.
Por essa
razão, Cícero insiste na qualificação continuada dos gestores de
resíduos sólidos. Para ele, não se pode pensar a gestão apenas
buscando tecnologias de melhor aproveitamento dos resíduos, sem
preparar as pessoas responsáveis para a coordenação dessas ações.
“Hoje, não entendemos como foi possível instalar o aterro de Gramacho
em cima de um manguezal, mas discute-se a implantação de um aterro
sobre um aquífero que poderá suprir o abastecimento de água para o
estado. As consequências podem ser desastrosas”, alerta Cícero.
Avaliação de gestores de
resíduos contraria dados oficiais
Para realização da pesquisa,
Cícero elaborou um questionário que foi submetido a gestores de
resíduos sólidos de 19 municípios da região metropolitana do Rio, que
representam cerca de 80% da população do estado.
“Constatei nas respostas uma
grande diferença entre os dados e resultados das estatísticas oficiais
e a percepção dos gestores em relação ao trabalho. Muitos gestores,
por exemplo, avaliaram de forma positiva os recursos disponíveis e a
qualidade dos serviços, contrariando a avaliação do IBGE e do Pnud,
que os consideram abaixo da média”, revela.
Para processar as informações
coletadas durante a pesquisa e compará-las com dados de institutos de
pesquisa oficiais, o pesquisador lançou mão da lógica fuzzy, uma
sofisticada ferramenta de modelagem que contempla variáveis
quantitativas e qualitativas, como volume de matéria orgânica e
inorgânica, lixo per capita, orçamento municipal destinado à gestão de
resíduos sólidos, tratamentos de disposição final do lixo empregados
pelas prefeituras, coleta seletiva e reciclagem.
Segundo
Cícero, a sociedade necessita de novas formas de consumo menos
intensivas de recursos. “Toda a pesquisa que envolve análise de
resíduos gerados pela sociedade direciona para uma necessidade de
mudança no padrão de consumo. Reduzir o volume de lixo depende de uma
maior capacitação técnica daqueles que administram os recursos
públicos relativos à gestão dos resíduos sólidos”, acredita.