Ocupado canteiro de obras da usina de Belo Monte
Mais de 600
indígenas, pescadores, ribeirinhos e populações ameaçadas pelos
impactos sociais e ambientais ocupam o empreendimento
O canteiro de
obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na região de Altamira (PA),
está ocupado por mais de 600 indígenas, pescadores, ribeirinhos e
populações ameaçadas pelos impactos sociais e ambientais do grande
empreendimento. A ocupação começou na madrugada desta quinta-feira
(27).
A Rodovia
Transamazônica (BR-230), a partir de trecho em frente ao canteiro, na
altura da Vila de Santo Antônio, região de Altamira, está interditada
e só passam veículos transportando doentes.
Em assembleia
realizada na manhã desta quinta-feira, o movimento definiu como
principal reivindicação que o governo federal envie autoridades para
negociar com os as populações tradicionais o fim das obras de Belo
Monte.
Outra decisão
tomada pelos ocupantes é que o acampamento no canteiro de obras será
permanente e desde já convocam outras entidades e movimentos a
cerrarem fileiras nessa luta que, conforme os manifestantes, não irá
parar.
Todo o processo
de ocupação ocorreu de forma pacífica e é fruto das discussões entre
os povos tradicionais durante o seminário “Territórios, ambiente e
desenvolvimento na Amazônia: a luta contra os grandes projetos
hidrelétricos na bacia do Xingu”.
Com o encontro,
se pretendia analisar a conjuntura em torno de Belo Monte e discutir
respostas às situações de risco e impactos geradas pela usina. As
mesas de debate foram suspensas em vista da ação de ocupação do
canteiro de obras.
São 21 povos
indígenas envolvidos na mobilização. “Para mim, as pessoas que estão
querendo fazer essas usinas, são uma doença. São um câncer que vai
matar o planeta. Nós somos o remédio para essa doença!”, disse Davi
Gavião que segue: “Sou filho de quem foi impactado por uma usina. Faz
35 anos que nosso povo foi retirado da sua área e até agora estamos
lutando por uma indenização. Faz 35 anos! Essa Belo Monte vai trazer
muitos impactos também. Temos que lutar contra todas as barragens!
(sic)”.
Entre os
pescadores, Raimundo Braga Nunes: “Tenho certeza que depois de Belo
Monte vou ser obrigado a mudar de trabalho, porque peixe não vai ter.
Vai morrer, ou vai migrar. Eu não me calo, estou pronto para brigar,
preparado. Convido nossos amigos indígenas para somar forças para
proteger nosso rio. O Xingu é nosso pai e mãe”.
Decisão adiada
Nesta
quarta-feira (26), as populações impactadas viram o desembargador do
Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) Fagundes de Deus votar
contra a Ação Civil Pública que pede a paralisação das obras de Belo
Monte. Conhecedor do setor energético, o desembargador se posicionou
tendo como base a experiência adquirida na área, pois já advogou para
a empresa Eletronorte.
Impetrada pelo
Ministério Público Federal (MPF), a ação é um recurso de apelação onde
se pede o cancelamento do licenciamento ambiental e a
inconstitucionalidade do Decreto 788/2005 do Congresso Nacional – que
libera a obra sem a realização da consulta de boa fé aos povos
indígenas do Xingu e populações tradicionais, tal como diz a
Constituição Federal e a Convenção 169 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT).
A desembargadora
Maria do Carmo Cardoso, terceira a votar a matéria durante a sessão
desta quarta-feira doTRF-1, em Brasília (DF), pediu vistas da Ação
Civil Pública e interrompeu o julgamento – programado para entrar em
pauta no dia 9 de novembro.
Dessa forma, a
ocupação é também uma resposta a postura da Justiça que apesar de
todas as irregularidades, 11 ações denunciando ilegalidades no
processo de Belo Monte em tramitação, além de pareceres contrários à
obra trabalhados por um painel de especialistas e MPF, não interrompe
as obras. Sobretudo, não reconhece a e leva em conta a opinião das
comunidades que agora ocupam o canteiro.
Primeiro voto: a
favor da ação
O primeiro voto
dos desembargadores do TRF-1, no último dia 17, declarou inválidas a
autorização e licença ambiental para Belo Monte.
“É de nenhuma
eficácia a autorização emitida pelo parlamento”. Com essas palavras a
desembargadora Federal Selene Maria de Almeida desqualificou o Decreto
Legislativo nº 788/2005 do Congresso Nacional que autorizou a
construção da usina de Belo Monte. Ela considerou igualmente inválido
o licenciamento ambiental de Belo Monte.
Num voto
elaborado e denso, a desembargadora acatou a maioria dos pontos
apresentados pelo MPF/PA, sendo o argumento mais importante o fato de
as comunidades indígenas afetadas pela usina de Belo Monte não terem
sido consultadas a respeito, conforme mandam a Constituição Federal e
tratados internacionais, como a Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2004
(Decreto nº 5.051/2004).
Ela não deixou
dúvidas sobre a necessidade das oitivas: “A Constituinte prescreve que
sejam ouvidas as comunidades indígenas afetadas. Para protegê-las”. Em
seu voto, Selene reafirmou o posicionamento já adotado pelo TRF-1
quando da primeira avaliação da matéria, em 2006.
Fonte: Brasil de
Fato, Renato Santana.