Estudantes são violentamente reprimidos por PM em manifestação pela
redução da passagem em Vitória (ES)
“No dia 2/6,
Vitória vai parar”. Essa era a frase colada nos pontos de ônibus de
Vitória (ES), há cerca de dois meses, pelo Movimento Passe Livre (MPL)
e organizações estudantis, anunciando o dia de luta pela redução do
preço da passagem e pelo passe livre. Confirmando o indicativo, na
manhã de ontem, os estudantes iniciaram os protestos fechando as vias
de acesso ao Centro de Vitória, em frente ao Palácio Anchieta, e foram
violentamente retirados pelo Batalhão de Missões Especiais (BME) da
Polícia Militar.
As manifestações
pela redução da passagem e em protesto contra a repressão policial
continuaram no período da tarde, na Avenida Fernando Ferrari, em
frente à Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Cerca de 200
estudantes protestavam na avenida, quando o BME atirou bombas e balas
de borracha, atingindo as pessoas que estavam nas dependências do
campus da Ufes, incluindo prédios de salas de aula, o Teatro
Universitário e o Centro de Vivência. Muitos estudantes sofreram
ferimentos e tiveram que ser hospitalizados.
De acordo com o
integrante do Diretório Central dos Estudantes da UFES, Vitor César
Noronha, a pauta que estava focada no movimento estudantil se expandiu
para toda a sociedade, pois o governo do Estado promoveu uma série de
ações violentas contra os movimentos sociais, o que se explicitou no
ato de ontem. Ele também reiterou que, a partir de agora, o movimento
vai reivindicar a liberdade de organização e a desmilitarização da
polícia. “Acreditamos que deve haver uma intervenção no ES, devido às
ações de desrespeito aos diretos humanos e à Constituição Federal”,
falou Vitor.
“Estive na
manifestação e percebi a tropa de choque ensandecida. Não foi a
primeira vez que a polícia atacou os movimentos sociais dessa forma, o
que é muito grave”, afirmou o presidente do Conselho Estadual de
Direitos Humanos, Gilmar Ferreira. Ele disse também que o Estado tem
consolidado a prática de violação de direitos humanos e que o governo
estadual precisa abrir o diálogo com os movimentos sociais.
Para o advogado e
integrante do Conselho Estadual da Criança e Adolescente, André
Moreira, foi utilizada uma força muito além da necessária para conter
o protesto. “O governo estadual escolheu a pior forma de resolver o
problema, que foi pelo uso da violência. Ele deveria ter aproveitado a
pauta dos estudantes para solucionar o problema do transporte público
no Espírito Santo”, opiniou André.
Ufes é
bombardeada pela Polícia Militar
Após a
violenta repressão contra os estudantes em frente ao Palácio Anchieta,
no Centro de Vitória, o BME atirou bombas e balas de borracha contra
os estudantes que paralisavam a Avenida Fernando Ferrari, em frente à
UFES, na tarde de ontem. Mesmo após os estudantes terem deixado a
pista, o BME continuou atirando para dentro do campus universitário.
"A gente estava
na rua fazendo movimento pacífico, quando o choque jogou bombas de
gás. A Ufes parecia um campo de guerra. Muita gente que nem estava na
manifestação se machucou”, registrou a estudante de Ciências Sociais
da Ufes, Macely Schun.
Conforme
depoimento do professor do Departamento de Matemática, Leonardo
Meireles Câmara, o BME jogou diversas bombas do lado de fora da
universidade, atingindo diversas pessoas. “Eu disse que eles estavam
cometendo um crime federal e que não poderiam adentrar para a
universidade. Falei que era professor e eles me ameaçaram, apontando a
arma em minha direção”, relatou Leonardo. Ele reiterou que é
necessário punir os responsáveis pelo ocorrido e que a universidade
deve entrar com as medidas cabíveis.
De acordo com a
professora do Departamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento,
Mariane Lima de Souza, no momento dos ataques do BME, estava ocorrendo
uma sessão de filmes infantis para crianças de 3 a 6 anos, de várias
escolas de Vitória, no Teatro Universitário. “As crianças não sabiam o
que estava acontecendo e um funcionário do teatro estava recebendo um
número grande de pais e professores que estavam desesperados, pois não
sabiam se saíam do espaço com as crianças ou permaneciam no local”,
relatou a professora. Ela disse que ficou assustada com o despreparo
da polícia para lidar com essa situação e afirmou que é inadmissível
pensar em ações de extrema violência em espaço de grande circulação de
pessoas.
Em nota oficial,
o reitor em exercício da UFES, Reinaldo Centoducate, afirmou que o
episódio entre o BME e os manifestantes acabou causando conseqüências
para estudantes, servidores técnicos, professores e visitantes que
passavam na área do campus e que não tinham qualquer participação no
evento. Para a Administração Central da UFES, o campus da
universidade, seus professores, servidores, estudantes e visitantes,
não podem sofrer conseqüências físicas e morais diante de um episódio
ocorrido numa via pública.
Estudantes são encurralados nas calçadas e retirados de dentro dos
ônibus pelo BME
Após a
violenta repressão em frente à universidade, os estudantes caminharam
em direção ao pedágio da Terceira Ponte, que já havia sido fechada com
cerca de 100 policiais. O BME partiu em direção aos manifestantes que
foram encurralados nas ruas e calçadas. “Ficamos cercados pelo BME por
todas as ruas. De um lado, havia o batalhão de choque, de outro, havia
a cavalaria e ainda tinha as bombas e sprays de pimenta”, relatou o
estudante de Ciências Sociais da UFES, Fernando Leal.
Para se refugiar
da ação violenta, muitos estudantes entraram nos ônibus, mas alguns
foram retirados à força e presos. “A cavalaria da polícia veio em
direção aos estudantes para prender e não para dispersar. Os
estudantes foram algemados e presos e sofreram várias violações de
direitos humanos”, afirmou a assistente social que participava da
manifestação, Camila Valadão. No final do dia, cerca de 27 estudantes
haviam sido presos, mas foram liberados durante a madrugada devido à
pressão do Conselho Estadual de Direitos Humanos (CDDH) e de advogados
parceiros dos movimentos sociais.
Movimento
estudantil organizado e movimentos sociais integram manifestações na
cidade
Ao
contrário do que a mídia local tem repercutido, o movimento pela
redução da passagem é integrado por diversas organizações estudantis,
incluindo o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFES, vários
Centros e Diretórios Acadêmicos, executivas e federações de curso e o
Movimento Passe Livre (MPL). “Várias organizações e movimentos sociais
estão na luta pela redução da passagem, pois essa é uma pauta de
interesse de toda a sociedade”, afirmou o diretor de Articulação do
DCE da UFES, Raphael Sodré.
Além disso, esse
movimento conta com o apoio de diversos movimentos sociais no Espírito
Santo. Até o momento, já manifestaram apoio a essa luta o Conselho
Estadual dos Direitos Humanos, Movimento Nacional dos Direitos
Humanos, UNEGRO- ES, Movimento Terra e Liberdade, Consulta Popular,
Círculo Palmarino, Assembléia do Movimento Negro, Sindicato dos
Jornalistas do Estado do Espírito Santo, Federação Nacional dos
Jornalistas (FENAJ), Sindicato dos Bancários do ES, André Moreira -
presidente do Conselho Estadual de Direitos da Criança e do
Adolescente, Fórum Juventude Negra, Comissão de Direitos Humanos da
OAB, Intersindical Nacional, Força Sindical, Diretório Central dos
Estudantes da UFES, Adufes.
Melhoria
do transporte público é a pauta de fundo do movimento
Além
da redução do preço da passagem e do direito ao passe livre, o
movimento traz para a pauta da sociedade o debate sobre o transporte
público e da mobilidade urbana. “A questão de fundo do movimento é a
qualidade do transporte urbano, o que reflete diretamente na qualidade
de vida da população urbana”, falou o secretário geral do Sindicato
dos Bancários do Espírito Santo, Carlos Araújo. Ele reiterou que essa
pauta ganhou a sociedade na medida em que os estudantes foram à rua
por um projeto alternativo de transporte, o que não tem sido
apresentado pelo governo estadual.
Novas
manifestações estão previstas para hoje. Conforme deliberação da
Assembleia de estudantes realizada no final da tarde de ontem, hoje
ocorrerá um novo Ato pela redução do preço das passagens e contra a
violência policial. A concentração será às 17 horas, em frente ao
Teatro Universitário, na UFES.
Fonte: Por Luciana Silvestre Girelli
Adufes Seção
Sindical