Mais de 50 entidades repudiam mudanças no Código Florestal
A votação do
projeto é a principal pauta da Câmara dos Deputados nesta semana. Com
previsão de entrar em votação nesta terça-feira (10), o governo e o
relator do projeto ainda não chegaram a um consenso sobre o texto
final.
“Não podemos
aceitar de forma alguma as mudanças no Código Florestal, que vão
contra os princípios da vida e do meio ambiente”, afirmou o padre
Nelito Dornelas, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Segundo ele, esse projeto está dentro do contexto de uma ideologia que
leva à morte, com a qual a Igreja Católica no Brasil não compactua.
“Temos o compromisso de continuar nesse luta”, disse.
Jayme Vita Roso,
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), comparou a resistência às
alterações propostas de Aldo Rebelo no Código Florestal à luta dos
setores progressistas contra projeto que permitia aos Estados Unidos
utilizar a Base Militar de Alcântara, no Maranhão. O projeto, que saiu
da pauta no começo do governo Lula, era considerado uma ameaça à
soberania nacional e, pela localização estratégica, a entrega da
Amazônia aos Estados Unidos.
A militante ambientalista e ex-senadora Marina Silva (PV) afirmou que
“em lugar de andar para frente, estamos andando pra trás” com essa
discussão imposta pelo agronegócio. “Não podemos deixar que meia dúzia
de atrasados monopolizar o debate”, afirmou.
Segundo ela, o
relatório do Aldo vai contra os anseios da população e dos mais de 20
milhões de brasileiros que votaram na candidatura verde nas eleições
de 2010. Para corrigir os problemas do texto, ela pediu mais tempo
para a votação do relatório. “O adiamento é para que se possa propor o
debate e para apresentar as propostas para corrigir o texto
equivocado, no meu entendimento, que foi apresentado", disse Marina.
A ex-senadora cobrou também do governo uma política florestal, que
crie condições para que os agricultores possam produzir, gerar renda,
preservar o meio ambiente e recuperar o que foi degradado. “Não
queremos suprimir a Reserva Legal. Queremos os meios para recuperar as
áreas”, disse.
A atriz Letícia Sabatela, do Movimento Humanos Direitos, afirmou que a
proposta de Aldo Rebelo “é uma tremenda cara de pau”. Para ela, os
setores que defendem as mudanças no Código Florestal são os mesmos que
impedem a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do
Trabalho Escravo, que sugere que as áreas onde se explora mão de obra
escrava sejam destinadas à Reforma Agrária.
Pressão do agronegócio
Marina disse
ainda que o agronegócio não concorda com a Constituição de 1988, que
garante a função social da terra, e o artigo 225, que considera o
ambiente saudável um direito de todos os brasileiros.
"Eles não se
conformam com isso e toda a oportunidade que têm eles querem revogar a
Constituição e cabe a sociedade manter o direito constitucional de um
ambiente saudável é um direito de todos os brasileiros", criticou
Marina.
A secretária de
Meio Ambiente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Carmem Foro,
avalia que é urgente a sociedade brasileira fazer o enfrentamento aos
interesses das grandes empresas transnacionais da agricultura. “Não há
necessidade de flexibilização do Código Florestal. Se não nos
organizarmos, os interesses do agronegócio se sobrepõem às nossas
vidas”, acredita.
“Vamos batalhar
para manter o Código e fazer valer”, disse Geraldo José da Silva, da
Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetraf). Ele afirmou que o
agronegócio já não cumpre a lei vigente e, com a flexibilização, “não
vão deixar uma árvore em pé”.
Sérgio Leitão,
diretor do Greenpeace Brasil, analisa que o relatório “interessa às
grandes multinacionais que dominam a agricultura no Brasil”. Segundo
ele, a flexibilização da lei ambiental é a reforma "abre alas" de uma
série de mudanças que o agronegócio pretende fazer.
Na pauta, está o
fim da diferenciação de grande e pequena agricultura, a
desregulamentação da lei trabalhista, o fim dos índices de
produtividade e a revogação de medidas que limitam a atuação do
capital estrangeiro na agricultura e na compra de terras.
Para João Pedro
Stedile, da coordenação da Via Campesina Brasil e do MST, a legislação
ambiental é um “obstáculo” para a ofensiva das empresas
transnacionais, do capital financeiro e dos fazendeiros capitalistas,
que passaram a dominar a agricultura brasileira no governo FHC.
Os objetivos centrais do agronegócio, de acordo com Stedile, são
garantir a anistia financeira e criminal para os latifundiários que
desmataram e desrespeitaram a lei, acabar com a Reserva Legal e abrir
a fronteira agrícola para as empresas de papel e celulose.
“Há forças,
energias na sociedade, para barrar essas manipulações do poder
econômico”, avalia. “Estamos esperançosos que se crie um clima na
sociedade para que a Câmara vete essa proposta. Se não, que o Senado
vete ou a presidenta Dilma vete”.
O dirigente do
MST propôs também a convocação de um plebiscito nacional para que a
população participe e opine sobre as mudanças no Código Florestal. “O
povo tem que dizer se é a favor do desmatamento ou não”, disse.
Correlação de
forças no Congresso
O deputado
federal Paulo Teixeira, líder do PT na Câmara dos Deputados, avalia
que a correlação de forças beneficia Aldo Rebelo. Dos 21 partidos com
representação na Câmara, apenas o PT, PV e PSOL defendem a necessidade
de mais tempo para a discussão com a sociedade.
Segundo ele, a
bancada do PT votou favorável ao regime de urgência para não se isolar
da conjunto da base do governo e manter influência sobre a discussão.
“O debate é o governo centralizar a base, não a base centralizar o
governo”, avalia.
Teixeira reforça
que não se pode, de forma alguma, abrir mão das medidas que protegem o
meio ambiente. “Nós temos que continuar com as exigências ambientais,
para o Brasil continuar sendo a potência ambiental que é. Queremos que
a mudança no Código não comprometa esse ativo que temos”.
Ele não está
confiante na votação do projeto nesta semana. "O governo só aceitará
um relatório equilibrado e que não viole as leis ambientais. Caso isso
não ocorra, não dá pra votar", garantiu o deputado.
Caso os
ruralistas forcem a barra e imponham uma derrota ao governo, ele
acredita que existem "recursos pela frente", como a possibilidade de
mudanças no Senado e de veto pela presidenta Dilma. “Precisamos de
mobilização da nossa sociedade” completou.
O deputado
federal Ivan Valente (PSOL-SP) apontou que “precisamos não votar o
relatório”. Ele é contra o texto do Aldo Rebelo e avalia que as
mudanças pontuais no projeto original, propostas pelo governo, não têm
condições de resolver os problemas do relatório.
Para Valente, é
fundamental uma discussão maior da sociedade, porque esse tema não
está relacionado apenas aos atores do meio rural, mas é de interesse
nacional e da sociedade brasileira, que está contra mudanças que
contribuem com a ampliação do desmatamento. “O Aldo Rebelo deu o
verniz que o agronegócio precisava”, atacou Valente.
Um dos pontos
problemáticos, de acordo com ele, é tirar do governo federal a
exclusividade da atribuição de operar a legislação ambiental, que
passaria a ser responsabilidade também dos Estados e municípios, onde
a pressão do agronegócio é mais forte.
Luiz Antonio de
Carvalho, assessor especial do Ministério do Meio Ambiente, acredita
que o desafio do governo é resolver os problemas dos pequenos
produtores, tirar a base de apoio do projeto do Aldo, barrando os
pontos que aumentam o desmatamento e beneficiam o agronegócio.
Segundo
Carvalho, o governo não aceita a diminuição da Reserva Legal e das
APPs, além da anistia aos desmatadores. Para isso, ele coloca a
necessidade da discussão dos casos pontuais em que as APPs
inviabilizam o pequeno agricultor para evitar que as exceções se
tornem uma regra.
“A presidente
Dilma vai manter sua posição que foi defendida, inclusive no período
eleitoral, de não aceitar a anistia dos desmatadores”, disse Carvalho.
“O governo defende que a Reserva Legal deve ser mantida em todas
áreas, sem exceção, e é totalmente contra a diminuição de áreas de
APPs”.
O governo teme a
apresentação de emendas ao projeto, que abriria uma porta para que a
bancada ruralista imponha medidas de interesse do agronegócio. “É o
pior que pode acontecer, porque as emendas não virão a nosso favor.
Elas virão em favor da anistia para a área rural consolidada, para
massacrar, digamos assim, para demolir o conceito de reserva legal, e
por aí vai”.
“Estamos
otimistas, vamos brigar até o último momento para que se construa um
consenso, inclusive com o deputado Aldo Rabelo, para que o projeto
entre sem sofrer emendas lá dentro”, disse Carvalho.
FONTE: Por Igor Felippe Santos
Da Página do MST