Deficientes visuais e auditivos temem possibilidade de perder escolas
especiais
RIO
- A comunidade de deficientes auditivos e visuais no Rio se articula
contra a possibilidade de encerramento, até o fim do ano, das aulas de
ensino básico para crianças e jovens em duas instituições federais: o
Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), em Laranjeiras, e o
Instituto Benjamin Constant, na Urca. Só no Colégio de Aplicação do
Ines, há cerca de 500 alunos, desde o maternal até o 3º ano do ensino
médio. Além disso, nos dois últimos anos, com a prática adquirida no
local, 80 professores se formaram no instituto em pedagogia com o uso
da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Já no Benjamin Constant -
fundado há 156 anos, dois antes que o Ines -, cerca de 300 alunos
estão matriculados do 1º ao 9º anos do ensino fundamental.
Na
internet, há vídeos, manifestos e abaixo-assinados contra o fim do
ensino básico nas duas instituições. De acordo com a diretora-geral do
Ines, Solange Rocha, a diretora de Políticas Educacionais Especiais do
Ministério da Educação, Martinha Claret, veio ao Rio há 12 dias para
informar que as atividades do Colégio de Aplicação vão acabar até o
fim do ano. A intenção é matricular os alunos portadores de
necessidades especiais nas redes estadual e municipal convencionais.
" Queremos
esclarecer que, para a política de inclusão, o Colégio de Aplicação é
fundamental, pois é nele que são formados os professores e elaborado o
material pedagógico especializado que vão orientar o ensino em todo o
país "
- A
diretora Martinha foi bem categórica (quanto ao fechamento do Colégio
de Aplicação). Mas não estamos em embate com o MEC, e sim em período
de negociação. E estamos otimistas. Queremos esclarecer que, para a
política de inclusão, o Colégio de Aplicação é fundamental, pois é
nele que são formados os professores e elaborado o material pedagógico
especializado que vão orientar o ensino em todo o país - diz Solange,
que, em maio, levará um parecer oficial ao MEC, com propostas para não
fechar o Colégio de Aplicação do Ines.
Diretora: sistema está despreparado
No ano
passado, em reportagem publicada na revista da Federação Nacional de
Educação e Integração de Surdos (Feneis), há uma declaração atribuída
a Martinha em que ela explica ser a favor de uma política de inclusão
dos alunos com necessidades especiais na rede convencional. Diz também
que colégios como o de Aplicação do Ines são segregacionistas: "As
pessoas não podem ser agrupadas em escolas para surdos porque são
surdas". A diretora do Ines, por sua vez, argumenta que não há
contradição entre a política de inclusão e a existência do Colégio de
Aplicação.
- Não somos
contra a política de inclusão. Mas o sistema de ensino no país se
mostra despreparado para lidar inclusive com os (alunos) ouvintes -
diz Solange.
Instituto
Nacional de Educação de Surdos, em Laranjeiras (Foto: Domingos Peixoto
/ Agência O Globo)
O
Ministério da Educação negou ao GLOBO haver uma ação oficial em
relação ao Ines ou ao Instituto Benjamin Constant. Disse ainda que,
enquanto não houver "algum plano sólido para a reformulação (da
educação especial), não há informações para passar".
A diretora
de Políticas Educacionais da Federação Nacional de Educação e
Integração de Surdos (Feneis), Patrícia Luiza Rezende, coordenadora do
ensino de Libras na Universidade Federal de Santa Catarina, é contra o
fechamento do Colégio de Aplicação do Ines. "O discurso do MEC acusa
as escolas de surdos de serem segregacionistas", disse a professora,
que é surda-muda, em e-mail ao GLOBO. "Isso é uma falácia. A maioria
dos pesquisadores da área defende que reunir surdos numa mesma escola
ou sala de aula não significa separá-los do mundo ou torná-los mais
dependentes. Ao contrário, os ambientes que favorecem a vivência de
uma língua de maneira espontânea fazem com que os sujeitos se tornem
mais autônomos", concluiu.
"Não somos
contra a política de inclusão. Mas o sistema de ensino no país se
mostra despreparado para lidar inclusive com os (alunos) ouvintes"
O futuro do
Instituto Benjamin Constant e do Ines será tema de uma audiência
pública amanhã, às 14h, na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). O
presidente da Comissão de Portadores de Deficiência Física, Márcio
Pacheco (PSC), é a favor da política de inclusão, mas contra o
fechamento das escolas:
- Sou a
favor da inclusão híbrida, de apoio às escolas municipais e ao
funcionamento das unidades especializadas, pois estas são formadoras
de professores que poderão atuar depois na rede convencional.
A
Secretaria municipal de Educação informou, por meio de nota, que não
foi contactada sobre um eventual fechamento do Instituto Nacional de
Educação de Surdos e do Instituto Benjamin Constant. O órgão disse
ainda que conta com 9.923 alunos portadores de necessidades especiais,
sendo 4.508 incluídos em classes regulares. De acordo com a política
da secretaria, estudantes com deficiências são incluídos em salas
regulares se este for o desejo dos pais. Caso contrário, são
encaminhados a salas ou escolas especiais.
FONTE: O
GLOBO ON LINE