Acordo garantiu recuperação de perdas históricas
Mas não quita os passivos existentes na carreira docente
No último dia 26 de agosto, o ANDES-SN assinou com o governo federal
um acordo emergencial para os docentes das Instituições Federais de
Ensino Superior (Ifes). O processo de negociação foi longo e tenso,
sempre marcado pela dureza do interlocutor frente às reivindicações
dos docentes.
Somente a apresentação de uma contraproposta emergencial por parte do
Sindicato Nacional, em 09 de agosto, e a pressão gerada pela
mobilização da categoria conseguiram aos poucos romper a
intransigência do governo e fazer avançar o processo.
Depois de várias reuniões, no dia 19 de agosto, o governo colocou na
mesa sua proposta limite e ressaltou que as negociações deveriam ser
encerradas antes do final do mês. A proposta foi levada pelo Setor
das Ifes às assembleias extraordinárias das seções sindicais para
análise e votação na base.
Apesar de ter repercussão financeira pequena para os professores, a
proposta sinalizava a recuperação de perdas históricas amargadas pela
categoria e representava um avanço estrutural positivo no sentido do
projeto de carreira defendido pelo Sindicato Nacional. Na entrevista a
seguir, Marina Barbosa, avalia o processo de negociação e explica
quais os critérios que balizaram a decisão por firmar este acordo
emergencial com o governo.
Quais as razões
concretas que levaram o ANDES-SN a assinar do acordo?
O centro do
debate foi avaliar as potencialidades e limitações da nossa capacidade
de reagir na negociação emergencial, procurando caracterizar se esta
mobilização teria a potência e o alcance para arrancar mais do
governo, assumindo os riscos decorrentes da rejeição da proposta de
acordo que estava na mesa, entre estes a exclusão da continuidade do
debate com o governo da nossa proposta de carreira.
A desigualdade no
processo de mobilização ficou patente e isso determinou que o setor
das federais decidisse - apoiado nas decisões das assembléias, no
método democrático de funcionamento do Sindicato Nacional - assumir
seu papel de direção, que exige pensar no movimento nacional como um
todo, e assinar o acordo de emergência, nos termos apresentados no dia
19 de agosto, porém com ressalvas e compromisso com a reestruturação
da carreira docente.
Ainda como parte da avaliação para a assinatura do acordo, o setor
entendeu que o dispositivo, incluído na LDO nos últimos dois anos e
utilizado pelo governo para colocar prazo limite para as negociações,
não é intransponível, mas é um obstáculo considerável. Vencê-lo
implicaria, pela primeira vez, em uma negociação salarial com o
Congresso Nacional, o que exigiria uma greve mais forte do que as até
aqui realizadas para dobrar o parlamento e a ação do governo frente ao
dispositivo de não assegurar nada referente a gasto com pessoal que
não estivesse tramitando até 31 de agosto. Ainda sim, tal esquema só
teria uma brecha para reversão em dezembro, quando da aprovação da lei
orçamentária, e a partir de um posicionamento do congresso nacional.
Qual a avaliação
do Andes-SN do processo de negociação com o governo?
Já no mês de
julho, o governo encerrava o processo anunciando que não haveria
reajuste para os servidores em 2011 e nenhum reajuste geral em 2012.
Alegou que não haveria negociação de índice de reposição de perdas
salariais dos servidores públicos, pois a escassa disponibilidade de
recursos seria aplicada na correção de distorções específicas em
algumas carreiras, para viger somente em 2012. Com essa argumentação,
o governo desviou o debate para as mesas específicas e alertou que o
prazo para fechar propostas era muito curto, por imposição da Lei de
Diretrizes Orçamentárias.
A avaliação feita
pelas entidades foi de que o movimento não reuniu condições para a
reação necessária, que seria o desencadeamento de uma greve unitária,
para dobrar a dureza do governo, blindado pela aliança entre os três
poderes, a elite financeira nacional e internacional e a grande
imprensa.
O setor teve
clareza na sua avaliação quanto à inflexibilidade do governo na
disponibilização de recursos e no método utilizado no espaço negocial,
quanto este aplicou na prática, de forma ainda mais draconiana, os
limites pretendidos pelo PLP 549 de congelamento de gastos com
pessoal, apesar do crescimento contínuo da arrecadação. Isso foi
expresso nas análises nacionais e nas considerações das assembleias
gerais que, em sua grande maioria, reivindicaram os ganhos conceituais
e questionaram o índice de correção. Ainda neste ponto da avaliação,
ficou evidente que a mesa em curso não se reunia a título de
negociação salarial, uma vez que isso já havia sido fechado de forma
negativa pelo governo na negociação com os SPF, e também não teria o
alcance, no prazo restrito, para concluir a negociação completa sobre
a reestruturação da carreira. Tratava-se de uma mesa para discutir um
acordo emergencial direcionado a correções de distorções que serviriam
de apoio ao debate posterior da carreira.
O processo em
curso, trilhado em meio a todas as dificuldades mencionadas, firma um
marco nesse acordo emergencial que, por sua vez, origina e
potencializa o que vem depois em outro processo. Isto é, fecha um
ciclo e abre outro, que tem como eixo a conquista da reestruturação da
carreira docente. Assim, nossa postura este momento interfere no
porvir de modo decisivo, em particular no que se refere a assegurar
pontos que servem de base para uma maior aproximação com o nosso
projeto de carreira. Foi demarcada a necessidade de compreender o
caráter emergencial do que foi pautado na negociação e que é preciso
assumir que ampliar a mobilização é mais importante do que nunca.
O acordo abre possibilidade para recolocar questões em pauta,
como, por exemplo, rediscutir percentual de reajuste ou algum ganho
adicional?
A discussão sobre
o termo de acordo e sua redação foram embasadas nas decisões nacionais
das instâncias do sindicato e a diretoria na mesa procurou assegurar
que o documento não significasse uma quitação dos passivos existentes.
Assim, o acordo incluiu o parágrafo terceiro, na cláusula terceira, o
qual reconhece que a primeira etapa do processo de reestruturação de
que trata esta cláusula representa a implementação de parte das
reivindicações das entidades, sendo que as demais serão tratadas no
processo de negociação.
Vale lembrar que
este acordo é emergencial, dado o tempo exíguo imposto pelo governo
para finalizar as negociações. Desta forma, foi feito este registro,
que assegura a possibilidade de continuidade das discussões das demais
reivindicações, e não apenas das atreladas e subordinadas à
reestruturação da carreira.
Agora, nosso
trabalho deve ser na direção de avançar no processo da luta pela
reestruturação da carreira e das pendências relativas a salário e
condições de trabalho paralela e concomitantemente.
O acordo
estipula um período para o início e o término da discussão sobre
carreira docente. Qual a perspectiva do Sindicato Nacional em torno
desse tema? Há espaço para a efetiva conquista da carreira única?
O espaço precisa ser cavado pelo movimento e isso só será possível com
uma mobilização que aponte temporalidade e radicalidade unitárias
nacionalmente. Este novo momento nos coloca numa condição mais
favorável numa mesa específica sobre reestruturação da carreira,
porque assegurou pressupostos, aprovados pelo movimento docente como
balizadores da proposta de carreira defendida pelo ANDES-SN, como a
isonomia e paridade entre carreiras e entre ativos e aposentados e a
incorporação de gratificações.
E este espaço vai
ser diretamente proporcional à mobilização da categoria e precisa ter
um único sentido: a luta. A luta pela carreira que desejamos ver
aprovada, a luta pela recuperação de nossas perdas, cujo registro
salientado no acordo deixa claro que não as abandonamos, a luta pela
isonomia e paridade entre todos os docentes, ativos e aposentados, que
temos como princípios de base para reestruturação. Uma luta que
compreenda, portanto, nossas aspirações individuais e coletivas e a
proposta de Universidade do ANDES-SN.
Por Renata Maffezoli (Andes-SN) e Silvana Sá (Adufrj-SSind)