111 dias de greve dos professores: semente de uma educação pública de
qualidade
Por Gilvander Moreira(*)
“Tive sede e me destes de beber. Tive fome e me destes de comer.”
(Mateus 25,35)
Parodiando, podemos dizer: “Estava em greve, na luta por justiça e
estavas a meu lado, viestes atender ao meu clamor."
Dia 26 de setembro de 2011, a greve das/os professoras/res da Rede
Estadual de Educação de Minas Gerais completa 111 dias e segue por
tempo indeterminado até o dia em que o Governador Antonio Anastasia
(PSDB + DEM) deixe de ser intransigente, se abra ao diálogo e atenda
às justas e legítimas reivindicações dos professores que participam da
mais longa greve da história de Minas.
Há 8 dias, a professora Marilda de Abreu Araújo e o técnico em
Educação Abdon Geraldo Guimarães estão em greve de fome na Assembleia
Legislativa de Minas. Marilda, 59 anos, de Divinópolis, MG, é
professora há 32 anos. Ela disse: “Estou em greve de fome há 8 dias
para que o governador Anastasia pare de ser intransigente e se abra ao
diálogo. Participei de todas as greves em 32 anos como professora. O
que mais me marca nessa greve é a intransigência do governador de
Minas.”
Abdon, 39 anos, de Varginha, é pai de três filhas, duas das quais
gêmeas de três meses. Ele diz: “Estamos com nossos salários cortados
há 2 meses e já se vai para o 3º mês sem salário. As dificuldades para
quem está na greve são enormes. Ao Anastasia peço respeito aos
educadores. Atenda as nossas justas reivindicações. Reivindicamos
pouco: apenas o piso salarial nacional, garantido pela Lei Federal
11.738/08, hoje, R$1.187,00 que em janeiro de 2012 passará para
R$1.384,00."
O prof. Dr. José Luiz Quadros, no artigo “Greve dos professores em
Minas Gerais”, ao defender com veemência a justeza da greve e das
reivindicações dos educadores, alerta que o governo de Minas, ao
contratar professores para substituir os que estão em greve, está
intimidando e criando um dilema moral para o povo mineiro. Diz ele:
“Como professores poderão aceitar participar de um processo de escolha
para substituir colegas que se encontram em greve? Esta perspectiva de
falta de compromisso com a categoria, falta de solidariedade com o
colega, de priorizar um projeto egoísta de se dar bem (bem?) com o
desemprego do outro é lamentável. Lamentável mesmo que o estado cause
este constrangimento e mais lamentável quem aceita esta proposta. Como
este professor fará quando daqui alguns anos ele não conseguir viver
dignamente com o salário de fome que recebe. Ele fará greve? Ora, não
vai adiantar nada uma vez que não terá força moral para esperar
solidariedade das outras pessoas.”
A postura de intransigência do Governo do Estado revela a total
ausência de ética imprescindível ao cargo e à tarefa que assumiu. A
decisão por convocar novos professores para assumirem a cadeira dos
que estão em greve acentua a dimensão antiética deste governo. A atual
greve dos professores reivindica dignidade para toda a classe
trabalhadora de professores. Os que estão contratados e os que ainda
não. Trata-se de uma luta mais ampla. Por uma educação pública de
qualidade que passa necessariamente pela valorização dos/as
professores/as.
Aos professores que se sentem inseguros diante do corte de salários,
do dia de trabalho, de retaliações, calúnias e difamações por parte do
Governo estadual, da mídia e da sociedade, recordo o que disse Jean
Cocteau, Mark Twain e tantos outros: "Não sabendo que era impossível,
foi lá e fez". Sei que há milhares de professores que estão sem
dormir, porque se preocupam também com os estudantes. Saibam que
vocês, queridas/os educadoras/res, estão plantando sementes da
educação pública de qualidade em Minas Gerais.
A Mídia, à exaustão, vem alardeando, que os professores em greve, ao
fazerem passeatas, atrapalha o trânsito. Assim, a Mídia não vê para
onde os professores em greve apontam. Vê apenas o dedo dos nossos
heróicos educadores. Um vereador míope chegou ao absurdo de propor um
projeto de lei na Câmara de Belo Horizonte para proibir manifestação
pública dentro do perímetro da Av. do Contorno, alegando que as
passeatas atrapalham o trânsito. Digo: Quem atrapalha o trânsito não
são os professores em greve e nem os movimentos populares ou
sindicatos que, de cabeça erguida, dentro de prescrição
constitucional, lutam manifestando publicamente suas reivindicações.
Logo, quem está atrapalhando o trânsito é o governador Anastasia, o
TJMG e todas as autoridades que não escutam os clamores dos
professores empobrecidos. Se o Governador Anastasia fosse um
democrata, já teria se aberto ao diálogo e a negociação séria com os
educadores. O SINDUTE buscou diálogo com o governador durante seis
meses, antes de iniciar a greve, mas não foi atendido. Agora vem dizer
que só negocia se a greve acabar. Não negociava antes da greve, irá
negociar sem a pressão da greve? Ao continuar com essa intransigência,
o futuro político do Anastasia será efêmero. Anastasia, seu barco vai
afundar! O prefeito Márcio Lacerda, dia 24/09/2011, já teve o seu
futuro político sepultado por mais de 2 mil militantes que se
manifestaram pelas ruas de BH no “Fora Lacerda”.
As/os professoras/res de Minas estão interpelando a consciência de
toda a sociedade. Não há espaço para neutralidade. Ou se compromete e
engaja na luta ao lado dos educadores tão discriminados no 2º estado
que mais arrecada impostos e que paga um dos piores salários aos
professores ou assuma que é omisso, cúmplice e covarde, pois se trata
de causa da educação pública, assunto que deve ser uma prioridade
absoluta de todos/as.
A greve dos mil operários da reforma do Mineirão durou apenas alguns
dias. O governo tremeu na base e se abriu para a negociação
imediatamente. “As obras da COPA não podem atrasar”, dizem. A educação
pública pode ficar no fundo do poço? Minas terá futuro sem uma
educação pública de qualidade?
Queridos pais e estudantes, a hora exige que toda a sociedade se junte
na luta ao lado dos professores que lutam não apenas por melhores
salários, mas por uma educação pública de qualidade. Se os professores
forem derrotados, toda a sociedade será derrotada. Isso não pode
acontecer. Lutemos até a vitória!
A educadora Marilda e o educador Abdon, em greve de fome há 8 dias,
estão nos dando um grande exemplo de doação de vida em prol do bem
maior que é educação pública de qualidade para todos.
(*) Frei Gilvander é Mestre em Exegese Bíblica, professor, frei e
padre carmelita, professor de Teologia Bíblica, assessor da CPT, CEBI,
SAB e Via Campesina; e-mail:
gilvander@igrejadocarmo.com.br –
www.gilvander.org.br –
www.twitter.com/gilvanderluis
Fonte: Brasil de Fato