VENEZUELA
CONTEXTO
Política A Venezuela era, até o final do século XX, uma exceção na América Latina. Durante quatro décadas, entre 1958 e 1998, o país foi um exemplo de estabilidade política e de democracia no meio de um continente mergulhado em ditaduras militares. Seu relógio político obedecia a um fuso horário diferente do de seus vizinhos. E ainda obedece. Encerrados os regimes fardados em quase todas as nações latino-americanas, a Venezuela elegeu um coronel cujo grande feito até então era uma fracassada tentativa de golpe contra um presidente que, embora comprovadamente corrupto, fora democraticamente eleito. Uma vez no poder, Hugo Chávez não demorou a mostrar ao mundo que colocaria o seu país no rumo oposto ao da consolidação democrática e da modernização e recuperação econômica da maioria dos vizinhos. Eleito pela primeira vez em 1998, Chávez tem sistematicamente usado os instrumentos da democracia para reduzir a influência da oposição e impor uma política que se assemelha, cada dia mais, com um regime ditatorial. Com sua Constituição de 1999, eliminou o Senado e, por meio de plebiscitos, enfraqueceu o Congresso. A ponto de, em 2005, conquistar simplesmente todos os assentos na Assembléia Nacional, após um boicote oposicionista. Ao longo de seus três mandatos (o terceiro iniciado em 2007), o coronel manobrou para colocar seus amigos no controle da Suprema Corte, da Justiça Eleitoral e de todos os postos de fiscalização e controle da República. Também eliminou qualquer possibilidade de os canais de TV aberta criticarem seu governo. De seu Congresso subserviente, recebeu carta branca para governar por decreto, o que lhe garante o direito de concentrar ainda mais poder na Presidência e estatizar os setores elétrico e das comunicações. Todos estes fatores compõem o quadro de um país onde a possibilidade de alternância de poder é nula, as eleições são manipuladas e o Poder Legislativo tem como única missão referendar as decisões do Executivo. Nada desta política autoritária, entretanto, consegue despertar mais atenção no resto do mundo do que a própria personalidade do aspirante a chefe linha-dura. Mais recente e bem acabada reencarnação do caudilho populista, Hugo Chávez é o típico governante para quem o desempenho econômico, os valores democráticos, o programa de governo e as boas relações com os Estados Unidos são apenas aborrecimentos. Antes de tudo isso, o que interessa é manter a popularidade – e perpetuar-se no poder – a qualquer custo. A exemplo de outros populistas históricos, há no arsenal do presidente venezuelano dois recursos básicos: o nacionalismo sem vergonha e a distribuição assistencialista do que quer que seja – alimentos, remédios, gasolina subsidiada, dinheiro em espécie. "Construção do socialismo" - Para garantir o sustento de seus desvarios autoritários, Chávez assumiu o controle da fonte de receita disponível – o petróleo – e deu à sua política o nome de "construção do socialismo". No caso dele, a “construção do socialismo do século XXI”, como alardeou ao tomar posse do terceiro mandato. Aparentemente, ninguém vai impedir Chávez de prosseguir com sua marcha tresloucada na Venezuela. Tanto ali quanto em Cuba, – e de resto em todos os outros lugares onde a experiência foi testada – a construção do socialismo coincide sempre com a destruição dos países nos quais o sistema é implantado. Cubanos e venezuelanos são hoje povos com horizonte menor do que tinham antes de ser submetidos a ditaduras socialistas. As duas experiências, especialmente a venezuelana, mistura de clichês e da repetição de erros cometidos por governos do passado, comprovam que a "construção do socialismo" é o caminho mais curto para a destruição de uma nação. Política externa - Soma-se ao caudilhismo chavista um agravante da pior espécie: Chávez hoje representa perigo para a democracia e ameaça à estabilidade na América Latina. Em primeiro lugar, ele claramente não se contentou em infernizar a vida dos próprios venezuelanos, e começou a lançar pseudópodes por toda uma crescente área de influência no continente americano: Evo Moales na Bolívia, Rafael Correa no Equador, Daniel Ortega na Nicarágua e até o casal Kirchner, na Argentina, se comportam todos, em maior ou menor grau, como fantoches do coronel. Em segundo, o venezuelano sustenta esse expansionismo com o dinheiro fácil dos petrodólares oriundos da riqueza do subsolo venezuelano, que por enquanto, não dá sinais de esgotamento – por mais que o governo Chávez comprometa a produção do ouro negro. E em terceiro, o socialista está semeando insurreição e instabilidade em países que, embora nominalmente democráticos, ainda lutam para solidificar suas instituições políticas e jurídicas e suas bases econômicas. Seja apoiando a apropriação de propriedades brasileiras na Bolívia por Evo Morales – que se apossou de refinarias da Petrobras e pôs em risco o abastecimento de gás natural ao Brasil –, ou seja financiando a ditadura em estágio terminal de Fidel Castro em Cuba – com dinheiro do povo venezuelano – Hugo Chávez não é brinquedo. Sua política externa representa um grande risco no horizonte da sofrida América Latina.
Economia A economia venezuelana gira basicamente em torno de um único produto: o petróleo. Todo o resto das atividades exercidas no país está, em maior ou menor grau, ligado à produção petrolífera – a quinta maior do mundo, e praticamente a única fonte de renda da nação. Foi o petróleo que colocou a Venezuela numa onda de prosperidade com a alta mundial dos anos 70, que levou-a para a enfermaria com a queda dos 80, e principalmente, que sustenta os desvarios do regime de Hugo Chávez, com os aumentos provocados pelas sucessivas crise no Oriente Médio deste início de século. O país vive, portanto, à mercê do mercado mundial de combustíveis, e dos mandos e desmandos de um governante que compromete o ainda vigoroso comércio petroleiro venezuelano. Vigoroso, porém, no que diz respeito às receitas, que praticamente triplicaram entre 1998 e 2006. O resultado mascara um dado grave: no mesmo período, a produção de petróleo caiu cerca de 30%. A Venezuela perde a oportunidade de transformar este aumento de receita em aumento de produção, já que muito pouco do dinheiro vindo do petróleo é reinvestido no setor. No lugar de obras de infra-estrutura e capacitação de profissionais da área – cada vez mais escassos no país – a renda é aplicada em programas sociais assistencialistas do governo Chávez. Um importante estudo publicado em 2006 revelou que o orçamento da PDVSA, a estatal petrolífera venezuelana, prevê gastos com programas sociais dois terços maiores que seus investimentos em exploração e produção do combustível fóssil. Com o dinheiro da venda do petróleo, o governo importa e subsidia produtos básicos – muitos dos quais é incapaz de produzir –, controla o câmbio e acaba provocando inflação. Os altíssimos gastos públicos do perdulário Chávez (alta recorde de 124% apenas entre 2005 e 2006) para distribuir a renda entre a população aumentaram o dinheiro em circulação no país. O excesso de bolívares estimulou o consumo e fez crescer os depósitos bancários. Só que ninguém tem coragem de tomar empréstimos para projetos de longo prazo. Ou seja, todo o poder de compra é despejado no consumo. A elevada demanda resulta em inflação – uma das maiores do mundo, cerca de 20% ao ano. Alimentos básicos como leite e carne somem das prateleiras venezuelanas eventualmente por causa da política gastadora do governo. Ambiente inóspito - Existe na Venezuela um ambiente verdadeiramente inóspito ao progresso da economia de mercado. Os empresários, sejam venezuelanos, sejam estrangeiros, não investem em seus negócios para aumentar a produção industrial e o comércio, porque poucos querem arriscar seu dinheiro em um país onde o presidente passa suas cinco horas de programa dominical na TV mandando às favas o capitalismo. Nos primeiros oito anos do chamado governo bolivariano, o número de empresas na Venezuela caiu de 17.000 para 8.000. As medidas de Chávez contra o capital vão desde a apropriação de companhias privadas até o ridículo fechamento, em 2005, das oitenta lanchonetes da rede McDonald's e das quatro fábricas da Coca-Cola que operavam em território venezuelano. O populismo chavista parece ignorar que ele tem um superávit comercial de quase 30 bilhões de dólares com o país cujo governo ele demoniza – os Estados Unidos, principal comprador do petróleo venezuelano. Devido a este ambiente para lá de instável, durante os dois primeiros mandatos de Chávez – entre 1999 e 2006 – os investimentos estrangeiros no país caíram pela metade e a classe média venezuelana ficou 57% menor. Sob Chávez, o número de famílias classificadas como pobres aumentou 18%. Já a renda per capita subiu menos de 1%. De acordo com o Centro de Documentação e Análise Social da Federação Venezuelana de Professores, instituto de pesquisas do sindicato da categoria, 80% dos domicílios venezuelanos tinham dificuldades em cobrir as despesas com comida em 2006 – a mesma proporção de quando Chávez chegou ao poder, em 1999, e quando o preço do barril de petróleo equivalia a um terço do seu valor em 2007. Não satisfeito em debilitar a economia venezuelana, Chávez ainda emprega uma parcela considerável do dinheiro do petróleo para exportar a sua revolução a nações amigas igualmente pobres e complicadas – especialmente Cuba, cujas antigas mesadas da União Soviética são o que há de mais parecido com a ajuda que recebe hoje da Venezuela. Com exceção das pequenas repúblicas latino-americanas como Bolívia, Equador e Nicarágua, no entanto, as medidas de Chávez são irrelevantes para os vizinhos. Seu projeto contra a modernidade e a integração econômica acabará por isolar a Venezuela no cenário mundial. A miséria em que vive boa parte da população é um dos efeitos mais evidentes deste isolamento.
Sociedade A característica mais marcante da sociedade venezuelana após oito anos de chavismo talvez seja uma profunda divisão da população em dois grupos que, caso venham a se unir novamente, precisarão de muito tempo para isso. Não a divisão entre a “elite oligárquica” e a “maioria pobre e gloriosa”, como quer o presidente coronel. Mas sim uma separação entre aqueles que apóiam o governo populista e personalista de Hugo Chávez, e aqueles que não compartilham dos planos do presidente de implantar na Venezuela o que ele chama de "socialismo do século XXI". Entre os que vão às ruas defender as medidas autoritárias do aspirante a ditador – em manifestações freqüentemente convocadas e pagas pelo governo – e os que não concordam com a expropriação de empresas privadas, com a censura aos formadores de opinião e com a criação de um partido único. Chávez sustenta que a Venezuela é rica, mas uma elite perversa fica com todo o dinheiro. A teoria simplista funcionou porque os venezuelanos, boa parte composta de imigrantes ansiosos por fazer a América (o país tinha apenas 5 milhões de habitantes nos anos 50), foram criados sob o sonho de que a riqueza petrolífera dava para todos. Não dava. A classe média, que no fim dos anos 70 representava 65% da população, não passa de 20% na primeira década do século XXI. A decepção e o ressentimento crônicos viraram combustível para o ódio entre as classes sociais, que o presidente alimenta. Dessa forma, a Venezuela caminha para chegar a um ponto em que, aí sim, só haverá uma burguesia abastada e uma multidão de miseráveis, vítimas de um governo que lhes oferece ajudas eventuais em troca de votos, mas não promove um desenvolvimento sustentado da economia que ajudaria todos a melhorar de vida. "Boliburguesia" - Esta elite, entretanto, não será composta pelos poucos empresários e empreendedores que ainda persistem em prosperar longe das barbas do governo. Ao contrário, será uma nova elite, formada por altos funcionários públicos corruptos, sindicalistas e empresários cujo principal mérito é bajular o ditador. Na Venezuela, essa nova classe, que cresce a cada dia, é chamada de "boliburguesia", uma alusão a duas das expressões mais usadas por Chávez: bolivariano e burguesia. A boliburguesia de Chávez pode ser facilmente identificada nas lojas de Caracas de duas maneiras. Primeiro, através do uso do bonezinho vermelho, peça básica do vestuário dos militantes chavistas. Segundo, pelo estranho hábito que seus integrantes têm de pagar tudo com pilhas e pilhas de dinheiro vivo – carros importados, uísque escocês e passagens para Miami. Enquanto isso, uma fatia cada vez maior da população torna-se dependente do estado comandado por esta gente. Ao aplicar o dinheiro do petróleo em inúmeros programas sociais, Chávez criou uma rede assistencialista de projetos conhecidos como misiones. Há misiones de alfabetização de adultos, de cooperativas agrícolas, de atendimento médico e de venda de alimentos subsidiados, entre outras. Embora entreguem às pessoas o que prometem, não criam empregos ou condições para que os pobres saiam definitivamente da miséria. Medo - Aqueles que não dependem dos programas da presidência e ousam se opor ao coronel – mesmo que pelas vias democráticas – vivem com medo. Nas eleições legislativas de 2005, vencidas em massa pelos chavistas, um CD com os dados de 12 milhões de eleitores, em que consta também a orientação política do cidadão e como ele votou no referendo do ano anterior, vazou. As informações foram usadas pelo governo venezuelano para perseguir os adversários: quem votou contra o presidente teve dificuldade para tirar passaporte ou conseguir um emprego público. Em um país em que 15% dos postos de trabalho estão no setor público, foi uma punição e tanto. Contra ou a favor do presidente, os habitantes da Venezuela estão juntos em pelo menos um aspecto: são todos vítimas de uma criminalidade que, de tanto crescer, colocou o país no topo do ranking mundial de assassinatos per capita. Desde que Chávez se tornou presidente, estima-se que ocorram cerca de 10.000 homicídios por ano na Venezuela. Estima-se, porque não há dados oficiais sobre o assunto. Sabe-se que, sob Chávez, o número de homicídios na Venezuela triplicou. Foram mais de 72.000 assassinatos, mas as estatísticas se referem apenas aos primeiros cinco anos – depois de 2004, o governo simplesmente baniu a divulgação de dados oficiais sobre a violência. Outros índices de criminalidade também dispararam no período. A quantidade de seqüestros cresceu em média 30% por ano. Para completar o quadro desolador, multiplicou-se por quatro o número de mortos em confronto com a polícia. Fábrica de misses - Para esquecer de tantos problemas, os venezuelanos – e especialmente as venezuelanas – dedicam-se a uma de suas maiores paixões nacionais: os concursos de beleza. Verdadeira fábrica de misses, a Venezuela já conquistou quatro títulos de miss Universo, cinco de miss Mundo e cinco de miss Internacional Quem não participa acompanha como se fosse a Copa do Mundo. Transmitida ao vivo pela televisão, a escolha da miss Venezuela e, depois, da miss Universo, atinge picos de audiência em torno de 90% no país. Significa que nove em cada dez venezuelanos ficam de olho grudado na telinha, torcendo pela miss que desfila em nome da pátria. Com tanta coisa em jogo, é natural que não se deixe a seleção por conta e risco da natureza. Na Venezuela, as candidatas a miss são selecionadas, esculpidas, moldadas, lipoaspiradas, obturadas e treinadas em um mínimo de conhecimentos gerais antes de pisar na passarela — tudo isso por obra e graça da Organização Miss Venezuela. Pena que, num país tão bom neste quesito, onde as beldades podem até ingressar na carreira política, o presidente Chávez ainda seja uma estrela.
Personagem Adotado pela esquerda da América Latina como um de seus faróis, elogiado por intelectuais e artistas em todo o continente, o presidente Hugo Rafael Chávez Frías faz por merecer uma série de adjetivos – populista, autoritário, fanfarrão, caudilho, aspirante a ditador e ainda outros. Não pode, no entanto, ser classificado como um esquerdista. Chávez não tem passado socialista, nem teórico nem prático. Não é herdeiro ou estudioso de nenhuma tradição marxista. Não formulou nenhum conceito novo para as ciências políticas, e sequer implementou os antigos de maneira inovadora. Hugo Chávez veio do meio militar. Era coronel pára-quedista do Exército venezuelano antes de se eleger presidente da República pela primeira vez, em 1998. Simpático, com pele de índio, cabelo duro de mestiço e a infância pobre vendendo doce na rua, o boina-vermelha é, antes de tudo, um sucesso de público. Eleito naquele ano com 57% dos votos, foi o primeiro político venezuelano criado fora das grandes máquinas partidárias a vencer os espertalhões que dominam a política do país. Na cerimônia esdrúxula em que tomou posse, contudo, já demonstrou a que veio: chamou de “moribunda” a mesma Constituição que era obrigado a defender sob juramento. Nascido em 1954 no povoado de Sabaneta, no oeste da Venezuela, filho de professores, Hugo Chávez foi educado pela avó e, ao final do ensino médio, entrou para o Exército, onde atuou 17 anos no batalhão de pára-quedistas do estado de Barinas. Ali, desenvolveu seu nacionalismo que depois travestiria de cores esquerdistas. Em 1992, comandou um golpe para derrubar o presidente eleito Carlos Andrés Pérez. Derrotado e preso, saiu da cadeia dois anos depois, mais admirado do que nunca. A partir daí, iniciou a escalada que terminaria na eleição de 98. O coronel pára-quedista sem partido nem programa político conseguiu convencer o eleitorado de que sua quartelada fora motivada pela indignação moral com a corrupção generalizada. Encantados com as promessas messiânicas, os venezuelanos deram-lhe carta branca para fazer o que julgasse necessário para tirar o país da decadência. Acreditaram no palavreado barato do coronel, inspirado em Simon Bolívar, o herói da independência da América espanhola. ‘Bolivariano’ - Chávez junta conceitos comunistas, um cristianismo de tons messiânicos e o culto a Bolívar numa salada mista de gosto duvidoso. Tirando proveito da idolatria ao herói latino, ele faz aparições televisivas com a imagem de Bolívar ao fundo e arranja sempre um jeito de rebatizar como "bolivariano" tudo que esteja ao alcance: Constituição bolivariana, sistema educativo bolivariano e até o nome oficial do país mudou para República Bolivariana da Venezuela. Na prática, o bolivarianismo não quer dizer coisa nenhuma – é vazio. Tão vazio quanto o Alô, Presidente, o programa de televisão que apresenta todos os domingos. Um dos grandes sucessos de audiência da TV venezuelana atualmente, trata-se de um monólogo de cinco horas no qual o caudilho comenta desde políticas econômicas até o tamanho de sua orelha, conta piadas, canta e, principalmente, xinga seus adversários. As aparições televisivas em que se comporta como um líder de torcida organizada, entretanto, são apenas uma das milhares de faces de seu populismo escancarado. Outra destas faces está literalmente estampada pelas ruas de Caracas – a do próprio Chávez, em gigantescos murais, grafites, cartazes e outdoors em que aparece como o pai dos pobres venezuelanos. Tudo o que faz, diz ele, é pelo bem das classes menos favorecidas. Talvez isso explique por que, sob Chávez, o número de pobres na Venezuela não pare de crescer. Há uma piada argentina que diz que o presidente venezuelano gosta tanto de pobres que seu governo cuidou de multiplicá-los no país. Agindo como age, o coronel alcança a proeza de juntar o pior da tradição caudilhesca, seguindo um modelo de triste memória, responsável pelo atraso e pela pobreza da América Latina. Sequer pode ser comparado ao cubano Fidel Castro, a quem pretende substituir como contestador latino-americano da vez. O ex-chanceler mexicano Jorge Castañeda escreveu certa feita que Chávez não é e nunca será um novo Fidel. Trata-se de um Juan Domingo Perón – com petróleo. Politicamente, Chávez se aproxima de Fidel apenas quando tenta vender a idéia de que o lucro é imoral e que o sistema capitalista é contra o povo (“o capitalismo é pior que Conde Drácula, Frankestein e Jack, o Estripador”, disse certa vez), ou quando defende um antiamericanismo infantil, que o levou, por exemplo, a proibir as árvores de Natal na Venezuela. Hitler - Eleito de forma democrática, Chávez recorreu a golpes brancos e plebiscitos para se tornar senhor do Judiciário, incluindo aí a Justiça Eleitoral e o Ministério Público, e do Legislativo. Na hora de usar isso em benefício do país, revelou-se um desastre. Serve-se de toda a máquina estatal em benefício próprio, e destrói a democracia na Venezuela a partir das próprias instituições democráticas. A prática não é original. Adolf Hitler era líder de uma bancada parlamentar eleita com 33% dos votos quando foi escolhido chanceler da Alemanha. Um ano depois, acumulou o posto de presidente com a aprovação dos alemães num plebiscito. Nos anos seguintes, fechou os sindicatos, calou a imprensa livre e suprimiu, pela violência diária, os demais partidos. Entre 1933 e 1939, quando invadiu a Polônia e expôs sua brutalidade ao mundo, Hitler usufruiu a neutralidade e até a boa vontade da comunidade internacional. Há semelhanças entre a trajetória de Hitler e a de Chávez. Sobretudo num aspecto: como ocorreu com Hitler nos primeiros anos, a comunidade internacional não está dando a devida atenção à forma sistemática com que Chávez vem corroendo a liberdade na Venezuela. Tudo por meio da destruição da economia de mercado, da democracia e da justiça venezuelanas. Não existe democracia sem instituições funcionais. Chávez as despreza. Por enquanto, o mundo o ignora. Quando acordar, pode ser tarde demais.
Fonte: Rev. Veja, Exclusivo On-line, 27/11/2007.
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