Você entende o hino nacional?

 

Brasileiros têm dificuldades de interpretar a canção devido à
linguagem rebuscada do poema escrito em 1909
 

A seleção brasileira entra em campo (...), para estrear na Copa do Mundo contra o time da Croácia. Antes do jogo, os atletas dos dois times, num momento de patriotismo, cantam o hino nacional de seus países. Porém, nem todos os jogadores se arriscam na canção. E não apenas eles. Muitos outros brasileiros enfrentam dificuldades com a letra, um poema escrito pelo compositor Joaquim Osório Duque Estrada em 1909.

O hino é uma poesia parnasiana que utiliza símbolos sagrados para remeter a idéia de solenidade e de patriotismo, conforme explica o professor do Departamento de Teoria Literária e Literaturas (TEL) da Universidade de Brasília (UnB) Rogério Silva Pereira. A linguagem rebuscada e a inversão sintática, que separa o sujeito e o verbo da mesma frase, são características utilizadas na letra, o que segundo Pereira, dificulta a compreensão. ”Conhecemos mais pela melodia e musicalidade do que pelo próprio sentido”, comenta.

Segundo ele, outro problema que prejudica a interpretação é o fato de os versos serem muito extensos e existirem vários períodos compostos por mais de um verbo. Apesar disso, Pereira é contra a modificação e adaptação da letra. “Nosso hino é carregado de história e funciona muito bem para unir a sociedade”, acredita. A solução apontada por ele é que alunos do ensino fundamental tenham nas disciplinas de História e Literatura aulas sobre o significado de símbolos nacionais como a bandeira e o hino. 

Patriotismo

O professor do Departamento de História da UnB Jaime Santana explica que, até o final do século XIX, os hinos e as bandeiras eram muito utilizados quando um país estava em guerra para unir sentimentos coletivos e recrutar voluntários. “Historicamente, o surgimento das competições esportivas como as Olimpíadas em 1896 tiveram a intenção de desviar o foco do sentimento de nacionalismo das guerras para as competições esportivas”, conta.

Torcedora de carteirinha da seleção brasileira, Cecília Barros, 19 anos, sente orgulho do país cada vez que ouve a música. “Antes dos jogos da seleção, eu canto o hino junto com os jogadores”, revela. Aluna do 4° semestre em Ciência da Computação na UnB, ela acredita que o brasileiro precisa de mais momentos de patriotismo, pois está muito desiludido com a política no país.

Em sua opinião, o hino, apesar de ter uma letra muito bonita, possui muitas frases e palavras complicadas. Porém a estudante garante que isso não é motivo para alteração, pois a canção representa o período histórico de independência do país. ”É uma tradição a ser preservada”, avalia.

Na escola

A beleza do hino também é destacada pela aluna do 4° semestre de Psicologia, Fernanda Ferreira Moura, 23 anos. Ela ressalta, porém, que não adianta ter uma letra bonita se os brasileiros não souberem cantar. ”A maioria só sabe o início e o final”, diz. Para ela, o problema está relacionado ao método utilizado nas escolas para ensinar a canção. ”Desde pequenas as crianças ouvem e decoram o hino em fila com a mão no peito, mas nenhum educador fala do significado da letra e sua importância”, avalia a futura psicóloga.

Apesar de admitir não saber cantar todo o hino, o estudante de História  da UnB Renato Trindade, 23 anos, considera a canção uma das mais bonitas que já escutou. Ao contrário da maioria das pessoas que aprendem a música na escola, Trindade conta que na infância não estudou em colégios que tinham o hábito de tocar o hino.

O aluno que costuma assistir a todos os jogos da seleção durante a Copa do Mundo acredita que os brasileiros se unem mais nessa época. “Fora da Copa, porém, não existe essa união. É cada um por si”. Trindade não concorda com o sentimento de nacionalismo apenas em época de Copa e Olimpíada, e acredita que as pessoas deveriam se unir não apenas porque nascem no mesmo país.

 

   

Hino Nacional Brasileiro  

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas
De um povo heróico o brado retumbante,
E o sol da Liberdade, em raios fúlgidos,
Brilhou no céu da Pátria nesse instante.

Se o penhor dessa igualdade
Conseguimos conquistar com braço forte,
Em teu seio, ó Liberdade,
Desafia o nosso peito a própria morte!

Ó Pátria amada,
Idolatrada,      
Salve! Salve!      

Brasil, um sonho intenso, um raio vívido
De amor e de esperança à terra desce,
Se em teu formoso céu, risonho e límpido,
A imagem do Cruzeiro resplandece. 

Gigante pela própria natureza,
És belo, és forte, impávido colosso,
E o teu futuro espelha essa grandeza 

Terra adorada,   
Entre outras mil,
És tu, Brasil,     
Ó Pátria amada!    

Dos filhos deste solo és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!

Deitado eternamente em berço esplêndido,
Ao som do mar e à luz do céu profundo,
Fulguras, ó Brasil, florão da América,
Iluminado ao sol do Novo Mundo!

Do que a terra mais garrida
Teus risonhos, lindos campos têm mais flores;
"Nossos bosques têm mais vida",
"Nossa vida" no teu seio "mais amores". 

Ó Pátria amada,
Idolatrada,      
Salve! Salve! 

Brasil, de amor eterno seja símbolo
O lábaro que ostentas estrelado,
E diga o verde-louro desta flâmula
- Paz no futuro e glória no passado. 

Mas, se ergues da justiça a clava forte,
Verás que um filho teu não foge à luta,
Nem teme, quem te adora, a própria morte. 

Terra adorada   
Entre outras mil,
És tu, Brasil,     
Ó Pátria amada!    

Dos filhos deste solo és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!

 


A história

A música – composta em 1822, por Francisco Manuel da Silva para comemorar a Independência do país – tornou-se bastante popular durante os anos seguintes e recebeu duas letras. A primeira foi produzida quando Dom Pedro I abdicou do trono; e a segunda na época da coroação de Dom Pedro II. Ambas versões, entretanto, caíram no esquecimento. Depois da Proclamação da República em 1889, um concurso foi realizado para escolher um novo Hino Nacional. A música vencedora, entretanto, foi hostilizada pelo público e pelo próprio Marechal Deodoro da Fonseca. A composição ("Liberdade, liberdade! Abre as asas sobre nós!) seria oficializada como hino da Proclamação da República do Brasil. Somente em 1906 foi realizado um novo concurso para a escolha da melhor letra que se adaptasse ao hino, e o poema declarado vencedor foi o de Joaquim Osório Duque Estrada, em 1909. No ano de 1922, o hino foi oficializado por decreto do presidente Epitácio Pessoa.

 

Fonte: Agência UnB, Eduardo Cunha, 12/06/2006.


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