Universidades Federais: Por falar em verdades
O
que me alegra, em particular, é a esperança que talvez tenhamos menos
problemas no
A educação superior atualmente baliza-se pelos seguintes princípios, complementares entre si: - expansão da oferta de vagas, especialmente públicas, dado ser inaceitável que somente 12% de jovens entre 18 e 24 anos tenham acesso a este nível educacional, bem como somente 25% das vagas hoje existentes sejam públicas; - garantia de qualidade, sendo que não basta ampliar, é preciso fazê-lo com qualidade; - promoção da inclusão social pela educação, minorando nosso histórico desperdício de talentos, considerando que dispomos comprovadamente de um significativo contingente de jovens competentes e criativos que têm sido sistematicamente excluídos por um filtro de natureza predominantemente econômica; - visão de territorialidade, permitindo que ensino de qualidade seja acessível às regiões mais remotas, fazendo da educação superior um dos mais importantes instrumentos de enfrentamento de desigualdades sociais e regionais; e - desenvolvimento econômico e social, considerando a educação superior como elemento chave da integração e formação da nação, seja enquanto responsável pela formação de recursos humanos altamente qualificados ou como peça fundamental na produção científico-tecnológica. O dep. Paulo Renato, ex-Ministro da Educação, publicou, recentemente, um artigo na página da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais (Andifes) intitulado “Recursos e desempenho das Federais: Repondo a verdade”**. O artigo tem como um dos elementos de motivação minhas declarações de que em contextos de carências de recursos humanos e de custeio, que caracterizaram o começo desta década nas Federais, um programa de estímulo a novos modelos acadêmicos e de combate à evasão seria impensável, por falta de professores e dirigentes entusiasmados. Só o fiz para destacar o Programa de Expansão e Reestruturação Acadêmica – Reuni, ora em curso com apoio integral de todas as citadas instituições federais. Ou seja, de fato, o Reuni só se tornou viável após um período de saneamento das dificuldades mais críticas, especialmente de verbas básicas de manutenção do parque das Universidades Federais, que caracterizou o início desta década. Tais elementos fizeram parte de uma matéria jornalística que destacava, em manchete, a diminuição de formandos nas universidades públicas. Embora o tema tenha sido tratado como “públicas em geral”, enviamos ao jornal, ainda que sem sucesso, dados do Inep mostrando que a média de formandos nas Federais no período recente (2003-2006) foi de 85.534, portanto, 34% maior do que no período anterior (1999-2002), que foi de 63.670 formandos. Enviamos também ao jornalista dados sobre a queda de formandos mostrando que de 9,5%, entre 2004 e 2006, dos 19.177 formandos a menos, 16.636 eram reduções observadas nos sistemas estaduais, responsáveis, portanto, por 87% da queda real observada no período. Por falar em verdades, quanto à expansão de ingressantes nas Federais, o aumento nos anos recentes, 154.074, em média, entre 2003-2006, é 24% maior do que no período anterior, 124.508, em média, entre 1999-2002. Além disso, os dados oficiais do Inep demonstram um crescimento permanente de matrículas de graduação (2001: 502.960; 2002: 531.634; 2003: 567.850; 2004: 574.584; 2005: 579.587; e 2006: 589.821). É destacável também o crescimento significativo (mais de 8% ao ano em 2006) de matrículas de estudantes de pós-graduação nas Federais (2001: 48.180; 2002: 51.112; 2003: 54.914; 2004: 55.939; 2005: 59.644; e 2006: 64.425), em conjunto com uma clara diminuição do número médio de meses necessários para conclusão de mestrado e doutorado, refletindo níveis de eficiência e excelência conjugados. As Federais, portanto, formam mais, cada vez melhor, além de terem aumentado os ingressos. A edição do Enade do ano passado permitiu completar todas as áreas e, sob qualquer forma de análise dos dados globais, as Federais ocupam a quase totalidade dos dez primeiros lugares, atestando a presença inquestionável de excelência nos seus cursos de graduação. Igualmente, elas reproduzem, em escala nacional, as mesmas heterogeneidades, com altos e baixos, também presentes até mesmo no paradigma permanente do Dep. Paulo Renato, as universidades públicas paulistas. A criação recente de 10 novas universidades federais e 64 campi, a implementação de duas outras criadas anteriormente e a futura criação de mais três formam, em conjunto com o Reuni e a forte expansão da rede federal de educação profissional e tecnológica, a base de uma nova era para a atuação pública federal na educação superior. Outra escala e melhor qualidade ainda. Elas poderão explorar no limite superior suas potencialidades plenas, com modelos acadêmicos inovadores e cumprindo integralmente sua missão junto à sociedade. Se isso é “populismo”, estamos tentando superar uma ausência de políticas públicas que atendessem tal expectativa popular nas regiões mais carentes do País. Assim, são mais ingressantes, mais matrículas e mais formandos, sistematicamente, bem como mais contratações de professores e técnicos até o momento neste governo do que em dois mandatos anteriores (1995-2002). Mesmo assim, as grandes transformações positivas ainda estão por vir e a comparação mais justa entre dois mandatos, tão ao gosto do Deputado, não deixará espaço sensato para comparações, por tão díspares. Teremos oportunidade de fazê-lo, de forma mais completa, no tempo oportuno, comparando tempos aproximadamente iguais. Não terá sido mérito exclusivo de governo, mas sim, principalmente, da própria comunidade acadêmica das Federais, em conjunto com uma nova sensibilidade nacional acerca da absoluta relevância da educação e da educação superior em especial. Sobre a GED, Gratificação por Estímulo à Docência, introduzido em 1998, o fato é que logo em seguida (e não em 2003) tal gratificação foi estendida a praticamente todos os docentes da ativa, ainda na gestão do ex-Ministro, tornando-se rapidamente inócua no que diz respeito à avaliação efetiva diferencial do trabalho docente. Sobre a matriz de desempenho para distribuição de recursos entre as Federais, que o Dep. Paulo Renato afirma ter sido abandonada em 2003, tal afirmação não corresponde, nem de perto, à realidade. A matriz de distribuição de recursos, com indicadores citados pelo Deputado, jamais deixou de ser utilizada, em momento algum, tendo sido sim aprimorada, melhor detalhada e cumprido cada vez mais e melhor suas finalidades. Infelizmente, alguém deve ter informado mal o Deputado. Embora os números não deixem margem para dúvidas, preferiu o Dep. Paulo Renato taxar simplesmente de “populista”, mais uma vez, as políticas do atual governo no setor. A contabilidade financeira que desenvolve sobre recursos, incluindo um programa de reequipamento centralizado no MEC, via compras internacionais, baseado em oferta de financiamento de longo prazo, dificilmente consegue alterar o sentimento generalizado entre dirigentes das Federais, de que a penúria do começo da década no que diz respeito às verbas de custeio de manutenção básica, contrasta fortemente com a situação atual. Os números executados em 2007, mostrarão isso, para efeito de comparação detalhada, de forma cabal em momento seguinte. Curiosamente ele se insurge contra mim que sempre (quase sempre, é verdade) fiz meus comentários registrando a compreensão e respeito às iniciativas anteriores, reconhecendo as complexidades da educação superior, evitando simplificações tentadoras, e desviando, quando possível (nem sempre é possível, este caso é uma exceção) de priorizar contrastes entre políticas governamentais. Não porque elas não existam, mas sim porque a meta que nos impomos é tentar fazer sempre melhor do que temos feito e tentar sedimentar os programas enquanto políticas de Estado, que devem, para ter sucesso, transcender governos. Neste caso, no entanto, não há como deixar de destacar que a atitude do ex-Ministro, ao solicitar a publicação de seus comentários na página da Andifes, colocou-me na dúvida e despertou em mim a curiosidade se não estaria ele conclamando, no caso específico, as próprias vítimas como testemunhas. Com a possibilidade de reeleição de Reitores, vários dos atuais dirigentes tiveram a oportunidade de vivenciar de perto os dois períodos. Eles, com conhecimento de causa, podem ser mais claros ainda nestes comparativos. Avesso a maniqueísmo e adepto da máxima tolerância, permito-me expressar a sensibilidade pessoal que estamos ainda distantes de termos enfrentado e resolvido todos os graves problemas, inclusive alguns que são corretamente apontados pelo Prof. Paulo Renato (relativamente baixa proporção de estudantes por professor, existência em algum nível de visões corporativas, necessidade de estimular ainda mais cursos noturnos etc.). Porém, o Reuni, que equaciona bem o futuro das Federais, somente foi tornado possível uma vez parcialmente superados os problemas e temas mais críticos (dívidas acumuladas, verbas de manutenção básica, questões salariais pendentes, falta de estímulo de docentes, técnicos e dirigentes etc.) vivenciados pelas instituições no início desta década. Hoje as perspectivas são melhores, assim atestam os dirigentes das Federais, ainda que sujeitos todos nós a armadilhas, com conseqüências ainda imprevisíveis, tais como a não aprovação da CPMF, graças a esforços de partidos como o do Dep. Paulo Renato e outros. Preocupa-me, sobremaneira, a questão de prazos urgentes para vigência dos acordos salariais firmados pelo Governo Federal com técnicos e docentes e o quanto a questão de reformulação do orçamento anteriormente previsto, em função da não aprovação da CPMF, pode, eventualmente, interferir negativamente neste cenário. O artigo do Prof. Paulo Renato tem, por fim, um aspecto animador. Por ele esqueço as ofensas de populismo, somente registro os elogios da comparação com Pres. Lula. Seus comentários positivos sobre o Reuni, no limite incrível de disputar a sua autoria, é a melhor notícia deste começo de ano. Deve ser em retribuição aos nossos permanentes e sinceros destaques à sua seriedade, elegância educada e o reconhecimento por algumas iniciativas que contribuíram com auxiliar instaurar boas culturas avaliativas nos campi. O que me alegra, em particular, é a esperança que talvez tenhamos menos problemas no futuro, comparados com as dificuldades que tivemos e as superamos no ano de 2007, em aprovar as necessárias 2.880 vagas docentes e 5.000 técnicos. Os próprios parlamentares apontaram que as resistências eram bastante localizadas. Agora, com tal demonstração de apreço do Dep. Paulo Renato pelo Reuni, seria correto esperar que contaremos todos com seu apoio, no mínimo sua discrição ou neutralidade, quando o Congresso tiver que definir novamente a aprovação de novas vagas, imprescindíveis para a consecução plena do programa.
** Nota da redação:
* Ronaldo Mota é Secretário de Educação
Superior do Ministério da Educação, pesquisador do CNPq na área de física e
professor titular da Universidade Federal de Santa Maria. Foi Secretário de
Educação a Distância, Secretário Executivo do Conselho Nacional de Educação.
Artigo enviado pelo autor ao “JC e-mail”. Fonte: JC-email, 30/1/2008.
|
|