A turma do gol contra
"Sob pressão dos EUA o
Brasil começou a desmontar seu sistema A economista americana Alice Amsdem, em seu livro "The Rise of The Rest" (2001), deixa claro que, já antes da crise do petróleo de 1973, o Brasil havia constituído um sistema "agressivo" de promoção das exportações. As indústrias do aço, de produtos químicos, de automóveis, de máquinas e equipamentos, que nasceram do processo de substituição de importações nos anos 40 e 50, tornaram-se, na segunda metade dos anos 60, fornecedores de produtos nos mercados externos. Na década de 80, Amsdem constata que "sob pressão dos EUA o Brasil começou a desmontar seu sistema de promoção de exportações". No início dos anos 90, as críticas à industrialização brasileira, tangidas pelos ventos de Washington, concentraram-se na denúncia de uma suposta tendência à autarquia, à ineficiência, à falta de competitividade externa e à estatização. Nessa visão, a função do governo deveria se restringir à sustentação da estabilidade macroeconômica, evitando qualquer interferência na livre operação dos mercados. Os arautos dessa promessa pretendiam, ademais, apresentar como virtuosa para a competitividade internacional das empresas sediadas no Brasil a combinação câmbio valorizado/juros estratosféricos/redução unilateral de tarifas. Compacta compilação de vulgaridades, essas tolices circulam hoje pelos corredores da Fazenda e do BC com ares de sabedoria. São agora retransmitidas pela rede de companheiros à esquerda e à direita – viciados em substituir a análise mais aprofundada das transformações e tendências da economia mundial por slogans ideológicos sobre a internacionalização capitalista. Contam como gol a favor os chutes que desferem contra suas próprias redes. Nos países asiáticos, as estratégias de crescimento rápido e graduação tecnológica estiveram sempre amparadas num conjunto de políticas que envolvem relações de reciprocidade entre o Estado e o setor privado, ancoradas no suposto de que as políticas industriais e de comércio exterior devem ser previsíveis e não subordinadas ao risco de rupturas, particularmente aos azares das flutuações pronunciadas do câmbio e das taxas de juros. A imprevisibilidade e a descontinuidade das políticas criam a sensação de que as decisões de produção, de investimento e de firmar contratos de exportação estão sujeitas a prejuízos não-antecipados, por conta de alterações nas regras e oscilações bruscas nos preços cruciais – juros e câmbio. Isso é ainda mais grave numa economia de mercado periférica que pretende ampliar sua participação no comércio mundial. O desalinhamento freqüente do câmbio real e dos juros cria um estado de expectativas fatal para as decisões de investimento. As mudanças, como demonstra a experiência asiática, sobretudo a chinesa, devem ser graduais e negociadas. Ignorar a experiência alheia, como sugeriu recentemente o presidente Lula, ao recusar comparações com a China, é tão desaconselhável quanto aceitar, sem suficiente avaliação crítica, os receituários (e elogios) proclamados pela corriola dos "desenvolvidos", sempre empenhada em ditar regras de seu interesse às demais economias do planeta. * Luiz Gonzaga Belluzzo é professor titular de Economia da Unicamp; foi chefe da Secretaria Especial de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda (governo Sarney) e secretário de C&T do Estado de SP (governo Quércia).
Fonte: Folha de S. Paulo, 12/3/06 |