MOVIMENTO ESTUDANTIL
"Transnacionais da educação" preocupam estudantes da AL
 


Luta contra criação de “franquias” de educação à distância no
hemisfério Sul por escolas americanas deve ser uma das
principais bandeiras do movimento estudantil, propõe
Congresso Latino-americano e Caribenho de
Estudantes da Oclae, que reúne
4 mil jovens em SP.
 

Cerca de quatro mil lideranças estudantis da América Latina e do Caribe estão reunidas em São Paulo desde o último sábado (26) para definir estratégias e linhas políticas da Organização Continental Latino-americana e Caribenha de Estudantes (Oclae), entidade que reúne 36 organizações estudantis de 24 países da região. 

Segundo o secretário-geral da organização, Rubens Diniz, estudante de psicologia da Universidade de Havana (Cuba), uma das principais preocupações do movimento estudantil latino-americano é a crescente ofensiva de instituições de ensino de grande porte dos EUA, que buscam incluir a Educação nas negociações sobre serviços da Organização Mundial do Comércio (OMC). Essa estratégia, explica Diniz, visaria retirar a matéria do âmbito das políticas públicas e incluí-la num mercado transnacional de serviços já em expansão. 

Um dos sintomas mais inquietantes desse fato, segundo os movimentos estudantis, são experiências de renomadas instituições americanas - como as universidades de Harvard e Fênix, por exemplo -, de criar “franquias”  no sistema de educação à distância em países da América Latina.  

“Dentro do que consideramos o franquiamento de ‘marcas de ensino’, um exemplo é a Universidade de Fênix, que abriu cursos de educação à distância no México, e agora quer que o governo ou retire os aportes às universidades públicas mexicanas, ou destine os mesmos recursos para a sua unidade virtual. Não que não reconhecemos a importância da educação à distância, mas hoje cerca de 17% das matrículas do ensino superior no país são neste sistema. Outro dado importante é que, no mundo, 98% da educação à distância é em idioma inglês, e 94% provêm de instituições dos EUA. É o que chamamos de ‘transnacionaliszação’ da Educação, a transformação da matéria em empreendimentos comerciais transnacionais”, afirma o secretário da Oclae. 

Para resolver o problema do reconhecimento deste tipo de instituição de ensino nos países, está havendo uma pressão da OMC sobre a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) para que reconheça a Educação como um bem global, aponta Diniz. “A Educação como bem global significa seu desvinculamento dos Estados Nacionais. A Proposta da OMC é que a Unesco funcione como um grande centro de registro e reconhecimento de cursos, que poderiam ser abertos livremente em qualquer lugar do mundo e obrigatoriamente reconhecidos pelos governos domésticos. Isso é uma questão”. 

Neste contexto, a principal preocupação dos estudantes é, além da falta de possibilidade de controle da qualidade do ensino, a introdução de um padrão homogêneo de educação, desvinculado da realidade e da cultura locais e impregnada pela “ideologia” de suas matrizes.  

“A luta contra a ‘transnacionalização’ do ensino e sua exclusão da pauta da OMC é uma bandeira que assumimos como movimento estudantil internacional. Pontualmente, já obtivemos vitórias junto à União Européia e o Brasil, que se comprometeram a retirar o assunto das negociações. Agora, devemos nos preparar para a próxima cúpula da OMC em Hong Kong, no final do ano, quando participaremos das mobilizações convocadas pela rede de Movimentos Sociais do Fórum Social Mundial”, afirma Diniz. 

Integração contra a Alca

Outra prioridade da Oclae deve ser a participação mais ativa nas articulações dos movimentos sociais contra a Área de Livre-comércio das Américas (Alca) e por uma integração social, cultural e política da região. O objetivo do movimento estudantil é, segundo Diniz, articular interações e projetos de cooperação regional através de um maior intercâmbio de estudantes (“nos moldes do que ocorre na Europa, por exemplo”), transferências de tecnologias entre os países e as universidades, cooperação científica, entre outros. 

Neste sentido, a Oclae recebeu apoio de dois importantes membros do governo brasileiro – Tarso Genro, ministro da Educação, e Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência para Relações Exteriores. Com Garcia, os estudantes discutiram o papel do governo brasileiro em um projeto de integração da América Latina e do Caribe, a partir dos interesses comuns dos países e da expressão da vontade política do governo Lula em aprofundar os laços regionais. Já Tarso Genro comunicou que o presidente brasileiro se declarou favorável à idéia da criação de uma Universidade Latino-americana. “Este ainda não é um projeto concreto, é uma idéia embrionária, mas que conta com toda a simpatia do presidente e do ministro”, afirmou um assessor de Tarso. 

Em termo mais práticos e imediatos, a partir este congresso a Oclae começará a articular entidades e organizações da região para participação e promoção do Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes, que deve ocorrer de 7 a 15 de agosto na Venezuela, e é promovido pela Federação Mundial de Juventudes Democráticas.  

“A tradição de festivais mundiais da juventude vem desde a década de 1940 e sempre foi fortemente impregnada pela luta contra a guerra. Esta temática deve voltar muito forte no evento deste ano, que será um misto de Fórum Social Mundial da juventude e uma festa multicultural”, explica Diniz, para quem política e cultura são duas linguagens universais da juventude.
 

Fonte: Agência Carta Maior, Verena Glass, São Paulo,  01/03/2005


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