A busca pelo super-profissional
Mercado, exigente, reclama de falta de talento. Drible esse cenário!
"Entramos no tempo do 'faça você mesmo'. As empresas esqueceram, na última década, de investir em seus departamentos de RH (Recursos Humanos) e os profissionais saíram a campo atrás de especializações, pós-graduações e MBA por conta própria, sem planejamento de carreira. Esse cenário alterou a lógica do mercado. O detalhe é que o mercado corporativo comprou a idéia e criou-se uma demanda difícil de ser atendida", explica Vera Módulo, gerente da unidade de recrutamento da Gelre, organização especializada em recolocação profissional. A constatação vai de encontro a uma realidade atual do mercado, e que dará a tônica também no ano que começou: em que pesem os problemas macroeconômicos do País, as dificuldades naturais de se arrumar ou trocar de emprego e um mercado ainda muito arrochado, as empresas continuarão reclamando da dificuldade constante em se conseguir completar suas vagas, por falta de mão-de-obra, se não especializada, que atenda a todas as suas necessidades. "O profissional tem de se lembrar que as empresas não avaliarão mais apenas o currículo e o diploma, mas o que eles fazem e são capazes de produzir", salienta Sami Boulos, consultor de carreiras do Career Center. A máxima atual mostra que tão difícil quanto encontrar um bom trabalho tem sido encontrar um bom profissional. Pesquisa realizada em 26 países pela consultoria internacional de Recursos Humanos Manpower mostra que dos 32 mil empregadores entrevistados, mais de 25% afirmaram encontrar grandes dificuldades com a escassez de profissionais qualificados. Esta nova tendência tem duas explicações, segundo o levantamento: as empresas estão cada vez mais exigentes no recrutamento para todos os níveis hierárquicos, e, ao mesmo tempo, os profissionais mais qualificados são cada vez mais assediados pelas corporações. Essa dificuldade em preencher as vagas não é exclusividade apenas dos profissionais com bom tempo de mercado. Mesmo para estudantes ou trabalhadores em início de carreira isso é realidade. Haja vista o último programa de trainee aberto pela multinacional Ambev. Sem um número definido de vagas, foram nada menos do que 26 mil inscritos, estudantes de diversas áreas, que tiveram de atender a exigências de gente grande: inglês fluente e bons conhecimentos de espanhol, disponibilidade para viagens e mudança de cidade ou país, habilidade para negociações e desenvoltura para lidar com o imprevisto. No total, 31 pessoas foram selecionadas, o que dá uma relação candidato-vaga superior a 800 pessoas, quase dez vezes maior que Publicidade e Propaganda, o curso mais disputado da Fuvest. "Naturalmente, nem todos os candidatos que se inscrevem no programa de trainee da Ambev preenchem os requisitos desejados", expõe a gerente de recrutamento e seleção da empresa, Elisabeth Furiati. Um lugar ao sol Esse beco aparentemente sem saída leva a dois questionamentos: a culpa é da falta de preparo dos profissionais ou do excesso de exigência das empresas? Segundos especialistas da área, o mercado atual é um misto desses dois fatores. Mas, ao mesmo tempo, é consenso que o perfil que o mercado procura é o de um super-homem. "Ele (o profissional) tem de ter competência, experiência, técnica apurada, bom relacionamento, atualização constante e ser um estrategista. Mesmo que o grau de compêtencia cobrado seja maior até do que o exigido pela vaga", constata o professor titular do Departamento de Administração da FEA/USP (Faculdade de Economia Aplicada da Universidade de São Paulo), Lindolfo Galvão de Albuquerque. O cenário para a busca de um emprego em 2007 (e nos próximos anos), nessas condições, parece nebuloso, mas especialistas acreditam que ele pode ser muito mais ameno do que aparenta. E tudo dependerá, basicamente, do esforço do próprio candidato. Para isso, duas dicas simples podem fazer toda a diferença: faça um estratégico plano de carreira (veja mais no quadro acima) e invista em você constantemente. Como todo bom super-homem que se preze, a mobilidade é uma das palavras de ordem do mercado em 2007. "O mundo passa por transformações que não têm volta. O Brasil também está sendo atingido e sofrerá mudanças, sobretudo no mercado de trabalho e nas relações trabalhistas. Nesse processo chamado globalização, as oportunidades surgirão da internacionalização, não apenas das corporações, mas também do profissional. Conhecer outras línguas e culturas será fundamental", resume Albuquerque, da FEA/USP. Rijane Mont'Alverne, especialista de Recursos Humanos da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais, sintetiza bem o perfil de profissional que as empresas buscam. "O mercado continuará atrás de profissionais com boa formação, flexibilidade e mobilidade em todos os aspectos. Seja para mudar de área, de cidade e com alto grau de adaptabilidade. Além disso, é interessante notar que atualmente exige-se grande resistência a frustrações, um alto grau de inteligência emocional", resume. A especialista também frisa a questão da mobilidade, em um período em que as fusões e aquisições estão em alta no mundo todo e as trocas de comando, função ou mesmo localidade tornam-se uma constante na vida do empregado. Daí a importância da leitura e de cursos constantes para aprimorar suas competências. "A atualização profissional é peça-chave nos dias de hoje", salienta Rijane. A questão da língua, apesar de soar como uma dica batida, é considerada vital pelos entrevistados. "Falar mais de uma lingua estrangeira é importante, mas o que se vê atualmente é que os profissionais investem em espanhol, francês e até mandarim apenas para ilustrar o currículo, quando o inglês, ainda a língua mais importante, é falada de modo macarrônico", brinca Rijane. Parece mentira, mas um bom português pode ser o diferencial na hora de conseguir um emprego. "O maior índice de rejeição dos programas de trainee com os quais trabalhamos se dá pelos erros absurdos da Língua Portuguesa", diz Sami Boulos. A docente Rijane Mont'Alverne recomenda: "além de falar uma ou duas línguas estrangeiras fluentemente, o mercado quer um profissional com traquejo, de preferência que tenha vivido ou tenha no currículo uma vivência no exterior. Isso denota capacidade maior de conviver com as adversidades. Experiências no estrangeiro expõem as pessoas a situações adversas, outros valores, pessoas e culturas. Isso é muito importante e um diferencial no momento de conquistar uma vaga", conta. Para ela, com um mercado cada vez mais exigente, também não é possível ficar um período de cinco anos sem estudar. "É preciso atualização, especialização e treinamento específicos constantes dentro de sua área de atuação. É preciso estar preparado para as atividades que virão", diz.
Fonte: Universia Brasil, Felipe Datt, 3/1/2007. |