Sobra vaga para cotista nas universidades
 

 

Segundo levantamento da Folha, 2.000 vagas em 9 das 15 instituições que adotam
o sistema não foram preenchidas

Ministério da Educação apóia projeto de lei sobre reserva de 50% da vagas de
universidades federais para alunos de escolas públicas


A universidade reserva o lugar, mas o aluno carente não consegue chegar lá. Esse é o balanço do preenchimento das cotas no ensino superior - política que o governo do presidente Lula pretende implementar nas escolas superiores federais.

Levantamento feito pela Folha aponta que em 9 das 15 universidades analisadas os lugares para cotistas não foram totalmente ocupados.

Em números absolutos, cerca de 2.000 das 6.000 vagas que estavam reservadas nas nove instituições não foram preenchidas. Por falta de dados, não foi possível levantar o total de lugares destinados a cotistas nas 15 instituições.

Pesquisadores e educadores têm explicações diversas para a sobra de vagas, que passam por falta de preparo do cotista, pouca informação sobre o benefício e regras muito rígidas.

Houve ociosidade inclusive na Uerj e na Uenf (estaduais do Rio), pioneiras na adoção do sistema no país, em 2003. Vagas não ocupadas geralmente são transferidas a estudantes de escolas particulares.

O alvo das políticas de cotas varia em cada instituição. Algumas beneficiam só alunos da escola pública; outras incluem negros e indígenas.

Uma das justificativas das universidades para a sobra de vagas é a falta de preparo dos estudantes de baixa renda, que vêm da escola básica pública.

Apesar de terem os lugares reservados, os estudantes carentes devem atingir uma nota mínima para entrar nas instituições. Na Uerj, por exemplo, é preciso acertar ao menos 40% do exame de qualificação.

"A sobra de vagas é reflexo da má preparação do candidato. Exame de qualidade mostra a crise na escola pública", diz o pró-reitor de graduação da UFJF (federal de Juiz de Fora, MG), Eduardo Magrone. "Não podemos deixar de exigir um mínimo de qualidade." 

Falta informação

Outra explicação citada pelas universidades é que o benefício não foi suficientemente divulgado, o que reduz a demanda já na inscrição para o exame.

O professor do programa de pós-graduação em educação da Uerj Henrique Sobreira tem outra explicação. Para ele, as instituições impõem regras que inibem a participação dos estudantes carentes no vestibular, principalmente com a fixação de um teto de renda familiar per capita muito baixo.

No caso da Uerj, onde um estudo do docente mostra que quase 50% das vagas não foram preenchidas pelos cotistas no último exame, o aspirante a um dos benefícios não pode ter renda familiar per capita superior a R$ 630, quantia inferior a dois salários mínimos.

"É um número aleatório, não houve estudo. Como o valor é muito baixo, pouca gente que se forma no ensino médio fica em condições de se candidatar às cotas", disse Sobreira. "Onde houver essa barreira de renda, haverá sobra de vagas."

A Uerj não se manifestou sobre a crítica de Sobreira nem forneceu dados oficiais referentes à ociosidade de vagas.

Não existe uma lei nacional que imponha o regime de cotas, política que visa aumentar o número de alunos carentes no ensino superior público.

Dessa forma, cada escola segue uma lógica. Nas estaduais do Rio de Janeiro, por exemplo, as instituições precisam reservar 45% de suas vagas. Dentro desse percentual, há uma sub-reserva para estudantes negros (20%), ex-alunos de escola pública (20%) e indígenas (5%).

Já na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), são destinadas 10% das vagas a negros, pardos e indígenas, provenientes de escolas públicas.

Desde o ano passado, a instituição mudou sua regulamentação para permitir que as vagas para cotistas não-preenchidas pudessem ser ocupadas por pessoas de outras etnias.

A medida foi tomada justamente porque os lugares reservados não estavam sendo totalmente preenchidos (no exame anterior, 17 das 49 vagas ficaram sem ocupação). 

Mais cotas

O governo federal pretende implementar as cotas em todas as universidades federais. Para isso, o Ministério da Educação apóia um projeto de lei, que tramita no Congresso e prevê a reserva de 50% da vagas para os formados na escola pública. Metade disso teria de ser destinado somente a algumas etnias (negros e indígenas).

"Os dados sobre a ociosidade atual das vagas devem ser levados em conta", disse o professor do departamento de Educação da PUC-RJ Creso Franco.

Para ele, se a lei impuser o mesmo sistema para todas as instituições, a ociosidade poderá ser ainda maior.

 

Fonte: Folha de S. Paulo, Fábio Takahashi e Fernanda Calgaro, 19/3/2007.

 

15 instituições informaram sobre as cotas

A reportagem conseguiu contato com 25 das 29 universidades públicas do país que possuem cotas já em vigor; 15 informaram os dados solicitados - algumas parcialmente.
As informações presentes no levantamento referem-se ao último vestibular da instituição no qual haja dados consolidados. Assim, algumas universidades enviaram informações do processo seletivo para ingresso neste ano, e outras, do exame para ingresso em 2006.
Os dados são todos oficiais, exceto os da Uerj, que foram tabulados pelo professor Henrique Sobreira, docente da própria instituição. A Folha solicitou à instituição desde a manhã da última quinta-feira as informações oficiais, que não haviam chegado até a conclusão desta edição.

Folha de S. Paulo.


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