USP tem mulher em seu comando pela 1ª vez

 

O governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), chamou ao Palácio dos Bandeirantes a farmacêutica Suely Vilela, de 51 anos, para anunciar pessoalmente, nesta quarta-feira, que ela será a primeira reitora da história da Universidade de São Paulo (USP). “Ela foi a mais votada, tem um currículo muito bom e tenho certeza de que vai desempenhar um bom papel”, disse. Para Alckmin, a eleição de Suely significa um grande passo para as mulheres.

 


Foto: O Estadão

Ela, no entanto, não gosta de falar sobre gênero. Evita, apesar das perguntas insistentes, antecipar o que mudará na USP com uma mulher no poder. Ao constatar o ineditismo de sua eleição, logo após a contagem dos votos que a colocaram em primeiro lugar na lista tríplice, falou em “mudança de paradigma”. Foi só. Depois lembrou seu trabalho na pró-reitoria de pós-graduação e sua propensão ao diálogo.

A falação nos corredores da reitoria foi mais corporativista. Mulheres da sua base de apoio se cumprimentavam. Sorriam com ares de “chegamos lá”.

“A gente torcia, mas fiquei surpresa porque ela era a única mulher na disputa e a universidade ainda é conservadora”, comemora a diretora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto e amiga há mais de 30 anos de Suely, Maria de Lourdes Pires Bianchi. Ela dirige hoje a unidade em que as duas ingressaram na USP, nos anos 70, e ocupa o cargo que foi da reitora, nos anos 90.

Cremes e plástica

Nascida numa fazenda em Ilicínea, Minas Gerais, em 22 de fevereiro de 1954, Suely mudou-se ainda criança para Franca, São Paulo, onde o pai trabalhou como comerciante de botinas. Os pais, sem diploma, sempre sonharam com a formatura da filha. Já farmacêutica, ela então motivou a família a mudar-se de novo – para Ribeirão. “Só trabalhei depois de formada, já como professora”, diz. “Também nunca aprendi a cozinhar. Não gosto e não tenho tempo.”

Acabam aí as referências menos femininas. Suely conta que gasta a maior parte do dinheiro em cremes e roupas – “coloridas, porém, clássicas”. Que pensa em fazer uma plástica porque, afinal, “não pode ser uma reitora feia”.

Gosta de filmes românticos, entre eles Titanic e Uma Linda Mulher. Quando decidiu ser candidata, leu Você É do Tamanho de seus Sonhos, de Cesar Souza, um livro de auto-ajuda que fala de como conseguir o que deseja.

Flat em SP

A conversa com o Estado foi interrompida pelo telefonema da costureira que prepara uma das duas roupas escolhidas para o posse. “Estou na dúvida entre um tailleur e um vestido.”

Toda semana, ela recebe massagem facial e vai ao cabeleireiro. E não sai do flat em que mora em São Paulo ou da casa em Ribeirão sem escova no cabelo. “Eu me acho uma mulher bonita e muito bem resolvida.” A reitora mora sozinha e não gosta de falar sobre vida amorosa.

O único filho, um advogado de 24 anos, viveu muito tempo com ela, mas hoje divide um apartamento com um colega. “Ela sempre foi superprotetora, pegava no pé para estudar, mas tem um coração mole”, conta Carlos Alberto Vilela Sampaio. “Essa vitória coroa toda sua dedicação ao ensino público.”

Serpentes

A aluna de mestrado Elaine Franqueiro fala do carisma da professora. “Ela nasceu para a política, traz alegria para o laboratório”, conta, referindo-se ao Laboratório de Toxinologia, chefiado até hoje por Suely em Ribeirão.

Sua vida como cientista foi dedicada a pesquisas na área de toxinas, principalmente venenos de serpentes. Ela tem trabalhos em publicações internacionais importantes e é lembrada por ajudar a criar a pós-graduação na Farmácia. “Quando era chefe de departamento, fez com que todos tivessem um projeto e pedissem auxílio à pesquisa na Fapesp”, lembra Maria de Lourdes.

Para a diretora científica do Instituto Butantã e membro do conselho da Sociedade Brasileira de Toxinologia, Ana Maria Moura da Silva, Suely é uma das importantes pesquisadoras da área, com trabalhos sobre inibição da ação do veneno no organismo. Seu currículo no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) tem 37 artigos completos publicados, número considerado razoável, e 13 mestres e doutores formados sob sua orientação.

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Reitora prefere apoio a escola em vez de cotas

Poucas são as chances para um sistema de cotas na Universidade de São Paulo (USP) com a vitória de Suely Vilela para o cargo de reitora. Ela, assim como muitos dos dirigentes da instituição, acredita em políticas afirmativas apenas que fortaleçam a escola pública para que os alunos consigam se sair bem na Fuvest.

Suely reiterou essa posição nesta quarta-feira, após ser anunciada reitora pelo governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB).

A mudança mais esperada para os próximos anos pelo movimento estudantil e sindicatos de professores e funcionários é a do estatuto da USP.

“Na medida que a instituição se tornar mais democrática, ela pode cumprir melhor seu papel de universidade pública”, diz o vice-diretor da Associação dos Docentes da USP, Francisco Miraglia. A eleição indireta, segundo ele, é um dos principais exemplos.

 

Fonte: O Estadão, Renata Cafardo, SP, 23/11/2005.


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