QUE ESTADO?

 

Projetos do governo reacendem debate sobre serviço público

Idéias polêmicas como limitar gasto com pessoal e direito de greve geram protestos e
unem um terço do Congresso em defesa do serviço público. Para críticos, população
pobre, que depende de serviços do Estado, será prejudicada

BRASÍLIA – Dois projetos do governo esquentaram, nos últimos tempos, a discussão sobre serviços públicos e foram alvo de manifestações pelo país e de debates no Congresso nesta terça-feira (17). Uma das propostas espera por votação dos deputados – a que impõe limite de gasto federal com funcionários por dez anos. A outra ainda está em gestação no governo, mas já desperta polêmica – a definição de regras para greve dos servidores. As duas idéias enfrentam forte oposição do funcionalismo e deverá encontrar no mínimo olhares desconfiados em algo como um terço dos parlamentares. 

Para as centrais sindicais e entidades que representam servidores, os projetos enfraquecem os funcionários estatais e ameaçam a prestação de serviços com um mínimo de qualidade à população. Acham também que as duas propostas formam uma combinação perversa. O governo quer que a despesa com pessoal cresça ao ritmo de inflação mais um adicional de 1,5% ao ano até 2016, reajuste que tido como insuficiente. E, ao mesmo tempo, pretende limitar a greve dos servidores, diminuindo o poder da categoria em negociações salariais. 

“O governo quer dar um pouquinho de aumento e proibir o trabalhador de reclamar e fazer greve. É um absurdo”, disse o deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, presidente da Força Sindical, em uma audiência pública na Câmara que debateu a proposta da folha salarial nesta terça-feira (17). “Que negociação vai haver, se as regras já vão estar definidas?”, questionou Leia de Souza Oliveira, da Coordenação Nacional das Entidades de Servidores Federais, no mesmo debate. 

Protestos pelo país

A insatisfação dos servidores com os dois projetos, especialmente o que trata de salário, que está mais próximo de virar lei, fez com que a categoria realizasse manifestações em pelo menos nove estados nesta terça-feira (17). No Rio, por exemplo, houve passeata pelas ruas do centro. Em São Paulo, um ato público na Avenida Paulista. 

Em Brasília, servidores e carros de som percorreram a Esplanada dos Ministérios e protestaram em frente à pasta do Planejamento. Cobraram do governo a retirada do Congresso da proposta sobre folha salarial, elaborada pelo Planejamento, e que o direito de greve do funcionalismo seja mantido – o mesmo ministério é quem prepara a proposta de regulamentação para envio ao Legislativo; a regulamentação está prevista na Constituição desde 1988, mas nunca foi votada no Congresso. 

O projeto sobre o gastos com pessoal faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). E, para a CUT, a quem está filiada a maioria dos sindicatos de servidores, contradiz o espírito do PAC e o discurso que ajudou o presidente Lula a ser reeleito. O PAC tem por trás a idéia de que o Estado possui papel importante no desenvolvimento, algo que não se consegue com enfraquecimento dos serviços públicos, diz a CUT. Além disso, na campanha, o governo acusou o PSDB de querer a volta do Estado mínimo.  

“Com o limitador não dá para resolver problemas crônicos do país, especialmente em áreas como educação e saúde”, afirmou o presidente da CUT, Artur Henrique da Silva Santos, também na audiência pública. Para ele, com o limitador, o governo pode até arrumar dinheiro para construir escolas, por exemplo, mas faltaria recurso para professores. Também reclamou de o governo não ter ouvido os servidores, ao elaborar o projeto. 

Reação no Congresso

A avaliação dos sindicatos de servidores de que os projetos do gasto com pessoal e a idéia de limitar o direito de greve da categoria sensibilizou cerca de um terço dos parlamentares, que decidiram criar uma frente em defesa do serviço público. A frente foi lançada nesta terça-feira (17) com o apoio de algo em torno de 200 congressistas, dos 594. 

O presidente da frente, deputado Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), deixou clara a posição do grupo. Para ele, reajuste salarial 1,5% ao ano é “insuficiente” e precisa ser ampliado pelo Congresso. Rollemberg também defendeu que o governo ouça as centrais e os sindicatos, ao regulamentar o direito de greve. “É um tema complexo que precisa ser aprofundado. Não pode ficar como está, mas não pode vir para o Congresso sem debate. Qualquer regulamentação tem de passar por uma ampla discussão do governo com as entidades”, disse. 

Para parlamentares que integram a frente, a iniciativa também vai tentar contrapor-se à imagem freqüentemente difundida pelos órgãos de comunicação de que os servidores públicos ganham muito, trabalham pouco e têm privilégios que atrapalhariam a economia brasileira. “A mídia diz que o servidor público é o bode expiatório do ajuste fiscal, que precisa enxugar o Estado. Mas nós precisamos é de mais Estado, para levar serviços públicos a milhões de brasileiros”, afirmou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP).
 

Fonte: Ag. Carta Maior, André Barrocal, 17/4/2007.

 

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