Educação
Prestígio zero

 

 

 

Pesquisa mostra que os bons alunos não querem mais seguir o magistério - um desastre
para o ensino

 

Mario Rodrigues
"Meu pai não quer"
Alunos de ensino médio: eles são desencorajados em casa de optar pelo curso de pedagogia

 

Um bom termômetro para aferir o prestígio de uma profissão é o número de jovens que a assinalam como primeira opção na hora do vestibular. Por esse medidor, a carreira de professor, que décadas atrás foi um símbolo de status, nunca esteve tão em baixa. Uma nova pesquisa, conduzida pela Fundação Carlos Chagas a pedido da Fundação Victor Civita, chama atenção para o problema, trazendo à luz um dado preocupante: às vésperas de ingressarem na universidade, apenas 2% dos estudantes brasileiros pretendem seguir o magistério – opção que os outros 98% já descartaram. No levantamento, baseado numa amostra de 1500 alunos de ensino médio em escolas públicas e particulares de todo o país, o curso de pedagogia patina na 36ª colocação, entre as sessenta carreiras que hoje mais exercem fascínio sobre os jovens – lista encabeçada pelas áreas de direito, engenharia e medicina. Agrava o cenário saber que esses poucos que ainda optam pela docência se concentram justamente no grupo dos 30% de alunos com as piores notas na escola. Pouco disputado, o curso de pedagogia significa, para a imensa maioria dos estudantes, a única porta de entrada possível para o ensino superior – e não uma carreira de que realmente gostam. Conclui a especialista Bernardete Gatti, coordenadora da pesquisa: "Sem atrair as melhores cabeças para as faculdades de pedagogia, o Brasil jamais conseguirá deixar as últimas colocações nos rankings de ensino". 

A situação de desprestígio da carreira de professor é o retrato final de um processo deflagrado na década de 70, quando se iniciou no país uma acelerada massificação do ensino público. Sem profissionais em número suficiente para suprir a galopante demanda, as escolas passaram a recrutar até leigos para dar aulas. Foi aí também que as faculdades de pedagogia e as licenciaturas proliferaram à revelia da qualidade acadêmica, e os salários começaram a cair. A remuneração dos professores é, por sinal, o segundo fator elencado pelos jovens de hoje para nem sequer cogitarem o magistério, atrás de um item que se refere à completa falta de identificação com o ofício, segundo mostra a pesquisa da Fundação Carlos Chagas. Os estudantes contam ainda que são desencorajados pelos próprios pais de fazer essa opção. Boa parte dos entrevistados chega a afirmar que a família "jamais aceitaria tal escolha profissional". 

Países onde o ensino prima pela excelência, como Coréia do Sul e Finlândia, encontraram bons caminhos para atrair os alunos mais brilhantes às faculdades de pedagogia – experiência que pode ser útil também ao Brasil. Ela indica que elevar o salário dos professores é apenas uma das estratégias eficazes, mas não a de maior impacto. O que realmente suscita o fascínio dos melhores alunos pela docência diz respeito, acima de tudo, à possibilidade descortinada pela carreira de verem seu talento reconhecido e sua capacidade intelectual estimulada. Nesse sentido, distinguir os profissionais de melhor desempenho em sala de aula, com iniciativas como bônus no salário e mais responsabilidade na escola, tem sido, há décadas, um potente motor de atração para a carreira de professor mundo afora. O Brasil precisa aprender a lição.

 

 

 

Fonte: Rev. Veja, Marcelo Bortoloti, ed. 2151, 10/2/10.

 


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