Pé no freio com as cotas nas Universidades
A segunda versão do anteprojeto de reforma universitária, divulgada nesta segunda-feira pelo MEC, altera a proposta de cotas para negros, índios e alunos de escolas públicas em Universidades federais.
O novo texto dá prazo até 2015 para que pelo menos 50% das vagas de cada curso, em cada instituição federal, sejam destinadas a alunos oriundos do ensino médio em escola pública. E deixa as Universidades livres para decidir como atingirão essa meta. Na versão anterior, o anteprojeto estabelecia que já a partir do primeiro vestibular após a aprovação da reforma metade das vagas seria preenchida pelo sistema de cotas. As diferenças não param aí. A nova versão não cita especificamente a reserva de vagas para negros, pardos e índios. O primeiro anteprojeto estabelecia claramente que, do total de 50% de vagas reservadas para alunos da rede pública, haveria um percentual para negros, pardos e índios. Esse percentual seria equivalente ao que esses grupos representam na população de cada estado, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Agora, a nova versão registra genericamente que a reserva de vagas para alunos da rede pública respeitará a “proporção regional de segmentos sociais e étnico-raciais historicamente prejudicados”. Na versão anterior, o sistema de cotas integrava o corpo do projeto de lei que seria enviado ao Congresso. O anteprojeto divulgado ontem propõe mexer no Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado em 2001. A idéia é acrescentar a reserva de vagas na seção de Objetivos e Metas do PNE. O ministro da Educação, Tarso Genro, negou que tenha havido um recuo por parte do MEC. Ele lembrou que, já em 2004, o governo enviou projeto de lei ao Congresso prevendo a reserva de 50% das vagas a partir do próximo vestibular. Segundo o ministro, o governo trabalhará para aprovar a proposta original que já tramita na Câmara. Empenhado em justificar por que, então, o governo incluiu, no primeiro anteprojeto, a reserva de vagas nos termos de projeto já enviado ao Congresso, o secretário-executivo do MEC, Fernando Haddad, disse que o objetivo foi provocar a discussão na sociedade. Segundo ele, a proposta original passou despercebida quando seguiu de forma avulsa para o Congresso, enquanto a reforma universitária despertou a atenção da opinião pública. “Se aquele projeto não for votado, vamos botar (a reserva de vagas imediata) de novo (no anteprojeto de reforma universitária)”, disse Tarso, lembrando que a proposta tramita na Câmara em regime de urgência. A ex-presidente da Andifes Ana Lúcia Gazzola considerou positiva a alteração. Segundo ela, a nova versão do anteprojeto permite que as Universidades adotem outros mecanismos de inclusão de alunos da rede pública que não a simples reserva de vagas. Ana Lúcia, que é reitora da UFMG, citou exemplos como a ampliação de cursos noturnos — que normalmente já atendem mais alunos saídos da rede pública — a oferta de cursos pré-vestibular e a concessão de pontos extras no vestibular, sem, no entanto, reservar vagas. “A nova proposta tem uma meta de inclusão e não cotas, o que permite um avanço gradual. O governo deveria refazer o projeto de lei já enviado ao Congresso”, disse ela. Federais deverão ampliar oferta de cursos noturnos A segunda versão do anteprojeto recebeu sugestões e emendas de 121 entidades e especialistas. Os cem artigos do primeiro texto foram reduzidos para 72. O novo anteprojeto determina que as Universidades federais ampliem a oferta de cursos noturnos, atendendo a uma reivindicação da União Nacional dos Estudantes (UNE). A idéia é que a rede pública de ensino superior ofereça à noite pelo menos um terço de seus cursos. O anteprojeto ressalva que isso deverá ser feito "sempre que pertinente". Candidatos de baixa renda não pagarão taxa de inscrição no vestibular de instituições federais. A nova versão do anteprojeto incorpora outras reivindicações da UNE. As instituições particulares deverão divulgar o índice de reajuste das mensalidades 120 dias antes da data final de matrícula. A idéia é dar espaço para negociação enquanto os alunos estão em aula e não durante as férias. O anteprojeto estabelece ainda que as instituições federais deverão destinar 5% de sua verba de custeio para programas de assistência estudantil, incluindo apoio a transporte, moradia, alimentação, inclusão digital e assistência à saúde. O presidente da UNE, Gustavo Petta, criticara a proposta inicial por não estabelecer de onde sairiam os recursos para a assistência estudantil. O novo anteprojeto, a exemplo do anterior, prevê a realização de sorteio extraordinário de loteria federal para financiar programas assistenciais. Tarso enfatizou que uma terceira versão será preparada com base em nova rodada de discussão em junho. A idéia é enviar a proposta ao Congresso em agosto, após o recesso parlamentar. — Aviso aos navegantes: esta segunda versão não é a definitiva — disse Tarso. O texto divulgado ontem incorpora temas que haviam ficado fora da primeira versão, como o uso de educação à distância no ensino superior e os sistemas estaduais de ensino, que regulam o funcionamento de instituições como a Universidade Estadual do RJ (Uerj) e a USP.
Fonte: O Globo, Demétrio Weber, 31/5/2005 |