COP-8
Sonho de ver a Lei da
Mata Atlântica definitivamente aprovada pelo Congresso Nacional corre o
risco de ser frustrado mais uma vez pela ação de parlamentares ligados aos
ruralistas, às empresas CURITIBA – Bioma com o mais elevado índice de biodiversidade do Brasil e também o mais ameaçado pela ação devastadora do homem, a Mata Atlântica foi neste fim de semana o principal tema de mobilização das entidades da sociedade civil brasileira que participam em Curitiba da 8a Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-8). A preocupação dos socioambientalistas cresceu nos últimos dias porque o sonho de ver a Lei da Mata Atlântica definitivamente aprovada pelo Congresso Nacional durante a COP-8 corre o risco de ser frustrado mais uma vez pela ação de parlamentares ligados aos ruralistas, às empresas madeireiras e à especulação imobiliária. O projeto de lei que prevê desmatamento zero para os remanescentes de Mata Atlântica (hoje reduzida a 7,5% de sua cobertura original) levou 12 anos para ser aprovado pela Câmara e mais dois para ser aprovado pelo Senado, onde recebeu algumas emendas. Com votação agendada na pauta da Câmara, que precisa apenas confirmar ou não as emendas feitas pelos senadores e aprovar a lei em definitivo, o projeto foi vítima durante toda a semana passada de uma obstrução comandada pelos deputados Ronaldo Caiado (PFL-GO), Rodrigo Maia (PFL-RJ) e Odacir Zonta (PP-SC). A ação dos deputados contradiz o acordo firmado entre as lideranças partidárias para que a nova lei fosse aprovada a tempo de ser anunciada pela ministra Marina Silva (Meio Ambiente) na COP-8. Uma última tentativa de aprovação da lei será feita na sessão da próxima terça-feira (28), mas a possibilidade de que nova obstrução aconteça está exasperando as entidades que atuam em defesa da Mata Atlântica: “Não podemos continuar a tolerar a chantagem de um pequeno grupo de ruralistas. Estes deputados estão usando uma lei em defesa da vida para chantagear a sociedade brasileira. Trata-se de uma ação dissimulada de pessoas que estão se valendo de seu poder de segurar e atrasar o processo para evitar a aprovação imediata da lei”, disse Mário Mantovani, que é diretor de Mobilização da Fundação SOS Mata Atlântica. Mantovani afirma que, apesar das resistências, acredita na aprovação do projeto de lei: “O lado positivo é que o projeto não ficou adormecido nesses 14 anos de espera, pois seu texto foi sendo atualizado ao incorporar coisas de outras leis referentes aos crimes ambientais, aos recursos hídricos e à biossegurança”, disse. O ambientalista convida toda a sociedade civil a fazer pressão sobre os parlamentares na próxima semana: “Precisamos de todos mobilizados neste momento. Precisamos proteger um bioma que está presente em 3.400 municípios que concentram 60% da população do Brasil”, disse. Coordenadora-geral da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), Miriam Prochnow afirmou ser “lamentável” que “os mesmos políticos de sempre” estejam trabalhando contra a aprovação do projeto de lei: “É um absurdo que esse lobby esteja atuando novamente mesmo após o acordo feito entre os partidos. Classifico essa atitude como uma birra de um setor que não quer a proteção da Mata Atlântica e que não tem o apoio da grande maioria da sociedade”, disse. Miriam quer que os deputados que são contra o projeto de lei revelem abertamente sua posição para a opinião pública: “Vamos fazer um esforço para mostrar à população quem são esses políticos. Mostrar que quem vota num político desse tipo está votando na destruição da natureza”, disse. DEFESA DOS BIOMAS O imbróglio no Congresso fez com que a Mata Atlântica fosse o tema mais quente da manifestação em defesa dos biomas brasileiros que aconteceu no sábado (25). Com cerca de 300 pessoas, que participaram de um ato e depois saíram em passeata pela rua XV de Novembro, no Centro de Curitiba, a manifestação teve direito à encenação teatral, alegoria representando um rio poluído e coreografia da “dança da Araucária”, tornando-se a mobilização de rua promovida pela sociedade civil que até agora mais apoio recebeu dos curitibanos nessa COP-8. Foram feitas intervenções em defesa da Amazônia, do Cerrado, da Caatinga, do Pantanal, dos Pampas e da biodiversidade marinha. Dirigente do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá) e liderança histórica da RMA, Renato Cunha exortou os manifestantes à “vencer as madeireiras e os políticos corruptos” e lembrou outros demônios que aterrorizam a Mata Atlântica: “Precisamos continuar nossa luta contra os megaprojetos públicos e privados e defender o que resta da Mata Atlântica da destruição causada pela carcinicultura, pela expansão da celulose e pelas hidrelétricas e barragens", disse. PAULADAS EM LUIZ HENRIQUE A principal “estrela” da manifestação, entretanto, foi um boneco do governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira (PMDB) que, tal qual um Judas de Semana Santa, recebeu pauladas e mais pauladas dos manifestantes durante todo o trajeto da passeata. O motivo da homenagem foi a Ação Direta de Inconstitucionalidade 3646, movida pelo governador em novembro do ano passado contra novas Unidades de Conservação (UCs) que haviam sido criadas em seu estado. Se for acatada, a ação de Luiz Henrique pode colocar em risco todo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC): “A sociedade está perplexa com este absurdo. Um governador ligado às empresas madeireiras está questionando o SNUC. É mais um político que precisa ser desmascarado”, afirmou Miriam Prochnow.
Na contramão de Luiz
Henrique, foram publicados no Diário Oficial os atos de criação de mais duas
UCs no Paraná: o Parque Nacional dos Campos Gerais e a Reserva Biológica das
Araucárias. Ecossistema típico da Mata Atlântica na Região Sul, a Floresta
de Araucárias está atualmente reduzida a 1% de sua cobertura original que um
dia já ocupou cerca de 250 mil quilômetros quadrados. A floresta é habitat
do animal-símbolo do Paraná, a gralha-azul, além de abrigar animais de
grande porte como o lobo-guará, a anta e a onça-pintada. Mesmo com a criação
das novas UCs, somente 0,2% dos remanescentes da Floresta de Araucárias está
localizado em área protegida. Quantidade insuficiente, segundo o Ministério
do Meio Ambiente, para garantir sua sobrevivência. Fonte: Ag. Carta Maior, Maurício Thuswohl , 26/03/2006. |