Como mudar de carreira sem traumas
Bárbara Paludeti
 

 

Histórias de gente que deu uma guinada profissional

Você teria coragem de jogar um emprego estável, com um salário satisfatório e um futuro promissor pela janela para tentar o sucesso em algo totalmente novo e diferente? Mesmo estando infeliz ou acreditando que será mais realizado se der essa guinada, bate um friozinho na barriga. Principalmente se analisarmos a situação econômica do país, o desemprego e a dificuldade de colocação no mercado de trabalho.

Apesar da insegurança, a hoje jornalista Luciana Perecin resolveu largar uma próspera carreira de técnica química para se aventurar nos meios jornalísticos. Por um ano e meio ela atuou no laboratório de esmaltação de chapas metálicas para a produção de fogões em uma grande empresa desse ramo. "Meu trabalho era um tanto metódico, fazia análises químicas e controles de produção. Gostava de atuar na área química, mas não sentia que tinha vocação especial para isso", conta.

"Se fosse dar continuidade à carreira que havia iniciado, deveria estudar Engenharia Química ou de Materiais. Depois de pensar, pensar e pensar, percebi que nunca me sentiria plenamente satisfeita se optasse por uma carreira de Exatas. Não que eu não goste de números ou me assuste com fórmulas, mas sempre fui apaixonada por leitura, escrita, línguas... Enfim, minha cara era mesmo a Comunicação. Conversei com minha mãe, conselheira de todas as horas, e ela me apoiou na decisão de pedir as contas e começar de novo do zero", descreve Luciana.

Para a professora do Ibmec São Paulo e gerente do Ibmec Carreiras, Jaqueline Giordanos, a decisão de fazer uma mudança na carreira tem que ser cautelosa e a pessoa deve ter muito claro qual é o objetivo. "Se você se conhece, sabe o que está buscando, quais são suas metas de vida, não só de carreira, as decisões que tomar a partir daí têm uma direção, porque senão a pessoa fica muito ao léu", destaca.

O engenheiro mecânico Paul Michael Sanner trabalhou durante 14 anos nas áreas de Engenharia de Produção e Logística de uma grande montadora de automóveis. Há um ano e meio deixou o cargo de Supervisor de Logística e Importação para trás para se dedicar a uma grande paixão da adolescência: treinamento e desenvolvimento de pessoas. Hoje ele atua com Programação Neurolingüística em consultoria pessoal e treinamento para empresas, instituições de ensino e público em geral.

"Adorei ter cursado Engenharia Mecânica, mas quando iniciei meus estudos de Programação Neurolingüística em 1999, me apaixonei pelo tema e percebi que ali estaria a chance de realizar meu sonho da adolescência. No final de 2004 resolvi abraçar o que considero hoje a minha missão de vida, que é de contribuir para o desenvolvimento das pessoas e a sua realização", afirma Sanner.

O consultor de Recursos Humanos e vice-presidente do Grupo Prime, Fernando Possari, lembra que talvez a vontade de mudar o foco profissional tenha a ver com a decepção da pessoa com a empresa. "Por isso tem que pensar com muita calma antes de tentar fazer essa viagem. A dificuldade dela em satisfação não é porque ela está numa área financeira e queria estar numa área comercial, por exemplo, é a estrutura que é proporcionada, o modo como a empresa coordena as atividades faz com que ela pense em mudar de área", alerta.

Desafios

Jaqueline não acredita em carreira planejada, ela se apóia muito em uma frase do guru da Administração, Peter Drucker: "Carreiras de sucesso não são planejadas, mas são carreiras de pessoas que aproveitam as oportunidades porque conhecem suas forças e os seus valores e estão preparadas".

"Acredito no planejamento do desenvolvimento, que é diferente de planejar a carreira e esse é o equívoco que as pessoas cometem. Se a pessoa fica muita presa a algo que planejou previamente, não percebe outros caminhos. Se você opta por alguma coisa que gosta, vai perceber, durante sua trajetória, oportunidades que vão surgir e vai tomar decisões coerentes com o seu objetivo maior", ressalta a gerente do Ibmec Carreiras. 

É possível uma pessoa se arrepender da tomada de decisão dos rumos da sua carreira. Você se forma em uma área, começa a trabalhar e vê que não é bem aquilo. Se a pessoa conseguir fazer essa transição vai ter um sentimento de alívio, porque saiu da área em que estava e não estava dando prazer para ela e vai ser uma pessoa muito mais leve, bem sucedida e, certamente, vai ganhar muito mais dinheiro com isso. Fazer o que não gosta é terrível e pesado.

Para Luciana o início foi complicado, principalmente porque ela ainda não tinha certeza se o jornalismo era a opção certa e tinha medo de não conseguir um emprego na área, mas não foi bem o que aconteceu. "Não sei se foi sorte ou o quê, mas na minha primeira tentativa em conseguir um emprego fui parar exatamente em uma revista técnica. Era uma publicação da área de papel e celulose, na qual estou até hoje, e a editora ficou admirada em encontrar alguém com minha formação técnica. Consegui o emprego e realmente o conhecimento que tinha foi muito útil para escrever as matérias e fazer as entrevistas. O engraçado é que nem queria colocar essa minha experiência anterior no currículo, afinal iriam pensar que não sabia o que queria da vida e esse foi justamente o diferencial", acredita.

Trocar de carreira não é algo simples, o melhor é que isso seja trabalhado paulatinamente, as mudanças não devem ser abruptas. Possivelmente, para que uma pessoa opte por determinada área, é porque já tinha certo interesse por ela. Se for feita uma reflexão levando em conta o que se gosta, as chances de sucesso são grandes. Para Possari, a reação do mercado pode ser complicada. "Não digo que haverá uma hostilidade, mas, com certeza, as empresas vão querer investigar a fundo o que levou a fazer essa transição. Quem garante que ela não vai querer novamente fazer essa mudança?", coloca.

"A principal dificuldade no início dessa nova etapa foi de estabelecer uma nova identidade profissional. Esse processo que, externamente pode ocorrer em um minuto, internamente é um pouco mais demorado, exige que abandonemos a velha identidade ou o velho papel desempenhado, aproveitando todos os aprendizados conseguidos até então para poder abraçar de uma forma completa a nova identidade que começa a se formar", afirma o engenheiro mecânico.

Porém, nem tudo é um mar de rosas. A parte financeira é um dos grandes problemas no início de qualquer novo profissional. Hoje em dia, Luciana já se considera estável também no jornalismo, mas recorda que financeiramente essa mudança não compensou. "Quando comecei a trabalhar com jornalismo, ganhava praticamente metade do que recebia antes. Isso foi um pouco desanimador. Mas logo a situação foi mudando, fui promovida e hoje estou satisfeita com o salário e as oportunidades que tenho por aqui", completa.

No mercado de treinamento e consultoria há menos de dois anos, Sanner acredita que mesmo não tendo a mesma estabilidade financeira que tinha antes, valeu a pena. Além da vantagem de ser o seu próprio gestor, conta que tem uma satisfação muito grande em auxiliar o desenvolvimento das pessoas e a sua realização. "Ainda estou na etapa inicial, onde plantar é muito mais importante do que colher, mas, observando os sucessos de colegas que começaram a atuar como consultores antes do que eu, sei que compensa", prevê.

Satisfação

Estar infeliz profissionalmente pode acontecer com qualquer um e para isso a melhor solução pode ser mudar de área. Dentro desse contexto, a escolha de uma nova atuação não deve se basear em fatores externos como, por exemplo, ganhar melhor. Ela deve ser baseada em interesses, motivações e valores pessoais, caso contrário, fatalmente a insatisfação chegará do mesmo modo.

"É muito provável que, cada vez mais, a gente tenha pessoas com duas diferentes atuações profissionais, já que a carreira, como um todo, está sendo estendida. Aposenta-se mais tarde. E isso tem que ser visto com mais naturalidade. Não há garantias de que a mudança será bem sucedida, vai depender de como a pessoa consegue fazer o equilíbrio entre os pontos fortes, os diferenciais e os pontos de desenvolvimento, e se vale a pena desenvolvê-los ou não", expõe Jaqueline.  

A medida de sucesso é pessoal. E toda decisão tem ônus e bônus. Uma maneira menos arriscada de fazer essa mudança é enquanto a pessoa está trabalhando e tem fôlego financeiro, mas é necessário paciência para procurar emprego. Jaqueline ressalta: a carreira é uma só, o que muda é a atuação profissional. "Carreira significa trajetória, e ela vem sendo construída desde o nosso nascimento", diz.

"Mesmo que nada desse certo daqui para frente como consultor, digo que a mudança já foi válida devido a todo o aprendizado e o crescimento pessoal que alcancei nesse um ano e meio", finaliza Sanner. "Estou bastante satisfeita! Fiz a escolha certa e estou feliz profissionalmente, embora eu já pense em fazer outras coisas no futuro. Mas nada de mudanças bruscas dessa vez!", conclui Luciana.
 

Fonte: Universia Brasil, 02/06/2006.


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