ENTREVISTA
- Como você avalia os resultados do 28º Congresso? - Minha avaliação é positiva. Tivemos 51 seções sindicais e 248 delegados de 24 estados, 29 observadores e seis convidados. Foram mais de 280 pessoas participando ativamente das atividades. Ficou claro, nas plenárias e nas resoluções tomadas, que grande parte dos participantes havia avaliado previamente os textos que foram debatidos. Conseguimos consolidar um Plano de Lutas que prevê uma atuação mais incisiva nas questões particulares ao movimento docente e da classe trabalhadora como um todo. - Nessa perspectiva, a continuidade da construção da reorganização dos trabalhadores em parceria com outras entidades é um ponto importante, não é? - Sim. Continuaremos contribuindo e trabalhando em conjunto com outras entidades dos movimentos sociais, sindical e popular com perspectiva classista, no sentido de não permitir que as mazelas da crise do sistema capitalista, que sempre organiza a sociedade beneficiando uma pequena parcela dela em detrimento da maioria da população, sejam impostas à classe trabalhadora. Acertadamente, o congresso apontou na direção de fortalecer os vínculos do ANDES-SN com as demais categorias do serviço público na questão específica da educação, inclusive das condições de trabalho nas universidades. Referendou, ainda, agendas e programas que essas entidades estabeleceram no Fórum Social Mundial 2009, em particular a ação coordenada pela Conlutas de lutar junto com outras correntes do setor classista, como a Intersindical e o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra. Essa ação também congrega setores de oposições sindicais e outros ligados até mesmo à CUT, que começa a tomar consciência de que será preciso a unificação das nossas lutas para que os trabalhadores não sejam os principais prejudicados pela atual crise. - A validação das ações da diretoria em defesa do ANDES-SN significa que o sindicato continuará no mesmo rumo? - Houve o entendimento de que as nossas ações em defesa da liberdade de organização sindical foram acertadas e que conseguiram aumentar a compreensão da arbitrariedade da suspensão do registro sindical do ANDES-SN em 2003 na universidade, na sociedade, no parlamento e em setores do próprio governo. Os efeitos dessa ação estão em curso, é preciso continuar nessa iniciativa, mas é hora de canalizar as ações do Sindicato na defesa histórica das pautas para a educação e para a questão das condições de trabalho nas nossas universidades. Embora aqui e ali existam programas de ampliação da infraestrutura instalada e da ampliação de quadros, eles não correspondem a um programa que trate do sistema universitário público como um todo. Tampouco têm segurança orçamentária para as diferentes etapas de sua implantação. É preciso enfrentar a necessidade de financiamento adequado, autonomia universitária e das ações para implementar esse tipo de luta. - Nesse contexto, o que você destacaria no Plano de Lutas específico para as IFES? - O acompanhamento do Reuni em cada universidade. Esse é o principal programa do governo para as universidades federais. Sempre fomos contrários a essa iniciativa porque não consideramos correto que haja uma política de expansão irresponsável, sem os recursos necessários. E sempre fizemos essa crítica. Sabemos que a expansão universitária é essencial ao país, mas também que tem que ser feita com financiamento adequado, para que o aumento no número de vagas não signifique aligeiramento de cursos nem diminuição de qualidade. A expansão adequada é a que permite à universidade trabalhar sempre na perspectiva do ensino ligado a pesquisa e extensão. E entendemos que com as propostas do Reuni os itens de financiamento são insuficientes para gerar o aumento de vagas pretendido sem prejuízo do ensino, pesquisa e extensão. - A crítica à educação a distância também está contemplada no Plano de Lutas... - Num país como o nosso, com sérias limitações ao financiamento da educação em todos os seus níveis, a educação a distância é propagada pelo governo como uma solução. Ora, não existe educação a distância. O processo educacional é interativo, presencial. Será que alguém já conheceu alguma família que educasse seus filhos a distância, por telefone, fax, cartas, ou qualquer outro meio, com sucesso? Podemos, no máximo, falar de ensino a distância, porque ensino se refere a uma parte do processo educacional. E não será com ensino a distância que resolveremos os problemas do Brasil na área da educação. Em outras sociedades que já resolveram parte ponderável de seus problemas no setor da educação, o ensino a distância é complementar, para quem, por algum impedimento, não possa participar de um processo presencial completo numa entidade educacional. Na Inglaterra, por exemplo, quem tem direito a educação a distância são presidiários. Em outros países, esses programas atendem pessoas com problemas específicos de restrição ao acesso, ou então como complemento em tópicos específicos para quem já completou sua formação universitária. Então, querer justificar a “educação a distância” no Brasil como uma forma de resolver problemas específicos como grandes distâncias geográficas em determinadas regiões é um equívoco ou um cinismo muito grande. O governo quer passar para a sociedade que está tratando com seriedade um problema grave por meio de uma técnica e uma perspectiva completamente enganosas. Nesse contexto, nosso Plano de Lutas prevê o acompanhamento também da implantação desse programa, como de outros, para podermos oferecer à sociedade uma crítica robusta, que dê conta de apontar para as reais necessidades a serem superadas, com destaque para a questão do aumento do financiamento. - Sobre a questão salarial dos docentes das IFES, como se dará a luta do ANDES-SN? - Continuaremos lutando por condições de trabalho que sejam compatíveis com o ambiente universitário, que devem ser implementadas por meio de valorização da carreira. Continuaremos reivindicando e pressionando pela anulação dessa política absurda de contratar professores substitutos e de trocar salário por gratificações. Deveria haver apenas o vencimento básico compatível com as responsabilidades e importância da atividade acadêmica para a sociedade. Queremos discutir com a sociedade a planilha de salários que nos foi imposta autoritariamente pelo governo. É preciso denunciar que o que o governo impôs para o funcionalismo público federal em 2009 não compensa perdas salariais anteriores, nem deverá compensar sequer a inflação projetada até 2010, período para o qual estão previstos a implementação dos valores das planilhas salariais divulgadas pelo governo. - O governo e suas entidades apoiadoras divulgam os “reajustes” impostos como positivos. Como desconstruir essa idéia? - Na verdade, essas planilhas desconstroem as carreiras e continuam tratando o vencimento básico apenas como uma pequena parcela dentro de uma remuneração mensal que contempla uma série de gratificações. Essa situação só gera injustiça, instabilidade e uma quebra de isonomia com os aposentados. Sempre lutamos contra isso e vamos continuar lutando. Acredito que com o Plano de Lutas aprovado no Congresso aumentaremos a abrangência dessa discussão na categoria e as possibilidades de mudarmos esse quadro. - Qual sua impressão sobre a participação dos delegados dos setores das estaduais e particulares? - O Setor das Estaduais levou um bom número de delegados ao Congresso. A participação nos debates dos grupos mistos e das plenárias foi rica, até pela diversidade de experiências relatadas. Acredito que o Plano de Lutas específico do setor contempla as questões gerais que servirão de parâmetro para os docentes em sua luta por melhores condições de trabalho e pela melhoria das universidades. Alguns desses pontos são comuns aos professores das IFES, como a necessidade de garantir a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e a defesa da contratação de docentes em regime de dedicação exclusiva, por exemplo.. Com relação ao Setor das Particulares, a participação foi de apenas um delegado e dois convidados, situação bastante compreensível quando analisamos as condições impostas pelas instituições aos docentes. A quantidade de representantes, porém, não inviabilizou a qualidade dos debates. A precariedade do regime de contratação e a perseguição dos dirigentes das IPES aos sindicalizados são dois pontos que nos ajudam a entender essa baixa participação, além das demissões em massa nos últimos meses, que os empresários do setor justificam como impostas pela crise. Nesse contexto, um dos pontos essenciais do Plano de Lutas específico desse setor é a luta pela liberdade de organização sindical, questão que, inclusive, motivou o ANDES-SN a denunciar à OIT [Organização Internacional do Trabalho] a perseguição sofrida pelos professores em casos concretos. O desfecho dessa denúncia é público e serviu, inclusive, de modelo para as lutas de outras categorias. Do ponto de vista das condições de trabalho, acho que a luta pelo fim do regime horista é fundamental para esse conjunto de docentes. - Mais uma vez, foi rejeitada a proposta apresentada por um grupo de professores da Apufsc de retirar da base do ANDES-SN os docentes das IPES. Como você analisa essa deliberação? - Essa decisão já havia sido tomada no III Congresso Extraordinário e comprova que o ANDES-SN é o legítimo representante dos docentes das universidades brasileiras. Reflete o entendimento de que esse é um setor importantíssimo para o Sindicato e para o movimento docente como um todo. Para nós, essa deliberação não constituiu uma surpresa, mas, sim, ratificou a unidade da base do Sindicato Nacional. - Outra importante deliberação foi o veto ao voto por procuração. O que você tem a comentar sobre esse ponto? - Sempre nos organizamos com a perspectiva de permitir que o que seja decidido nas instâncias de deliberação corresponda às pautas que efetivamente foram discutidas pela categoria e submetidas ao crivo de deliberações, com possibilidade do contraditório, de discussões. Nesse caso, o voto por procuração é absolutamente contraditório aos princípios que fundamentam nosso sindicato. No momento em que se leva para uma assembléia um voto fechado, tira-se aquele que deu essa delegação do debate e da possibilidade de refletir sobre outras propostas, de se convencer delas ou não, e de dar a sua própria contribuição ao debate na perspectiva de contribuir na deliberação a ser tomada. O congresso apreciou propostas nesse sentido vindas de delegados preocupados com a questão e também da própria diretoria do Sindicato. Os delegados as aprovaram por uma maioria esmagadora [houve apenas um voto contrário e quatro abstenções]. Tomamos essa atitude porque os setores de oposição têm utilizado o voto por procuração justamente para retirar seções sindicais da estrutura do Sindicato sem que o debate seja feito com a categoria e valendo-se de expedientes institucionais para coletar essas procurações. Nesse contexto, a decisão tomada representa uma vitória do movimento. O Código Civil e o ordenamento jurídico deixam claro que onde está previsto que não se aceita voto por procuração ele não poderá vigorar, entendemos que saímos desse congresso com uma estrutura mais robusta para fazer contraposição a esses ataques oportunistas. - Como você avalia a participação de professores ligados aos setores de oposição? - A participação da oposição só enriquece o nosso debate. Mas nesse congresso isso só aconteceu parcialmente, pois a maioria das pessoas que hoje constituem oposição não disputa as instâncias de deliberação e de poder do ANDES-SN. Elas têm optado pela perspectiva de destruir o Sindicato apartando-se dele. Essa perspectiva pode ser legítima quando é levada ao debate democrático na base e ela entende que é preciso sair da entidade. A questão é que essa oposição não se interessa por promover esse debate, optando por mecanismos burocráticos com brechas administrativas ilegais para enfraquecer o ANDES-SN. Os participantes da oposição presentes no congresso levaram o debate para as instâncias do sindicato, ou seja, tiveram absolutamente positiva e enriquecedora que será sempre bem-vinda. - A questão das consignações das contribuições espontâneas dos filiados está realmente resolvida? - Lutamos junto com vários outros setores do movimento sindical contra a Portaria nº 01/08 do Ministério do Planejamento. No contexto desta luta e das ações em defesa do ANDES-SN, acabou sendo criada uma frente parlamentar de apoio ao ANDES-SN, presidida pelo deputado Mauro Nazif. A partir daí, o Ministério do Planejamento entrou em acordo conosco, garantindo o mesmo tratamento dado a outras entidades sindicais no sentido de manter as consignações diante da comprovação de trâmite no Ministério do Trabalho quanto ao registro sindical das entidades. Esse acordo, no entanto, demorou a ser efetivado sob alegação de sobrecarga do Ministério do Planejamento e do recesso de final de ano. No entanto, no final de janeiro, várias seções sindicais receberam um comunicado de que os convênios tinham sido cancelados. Nossos advogados estiveram no Ministério do Planejamento, que informou que havia sido um erro e promoveu imediatamente uma retificação da publicação do Diário Oficial da União com algumas seções sindicais do ANDES-SN que estariam tendo seus convênios de consignação cancelados. Portanto, a situação está resolvida. A assessoria jurídica está acompanhando individualmente cada convênio e nos confirmou que eles estão sendo processados. Tudo indica que ao longo desse mês a situação seja regularizada. Portanto, as seções sindicais que receberam o comunicado do Ministério terão seus convênios respeitados, salvo os casos de falta de encaminhamento de algum dos documentos solicitados para refazer os convênios. Caso isso tenha acontecido, pode ser que alguma seção sindical tenha problema neste mês de fevereiro, mas tão logo encaminhe a documentação, a situação será regularizada. - Qual é sua expectativa com relação à negociação com o governo para a reativação do registro sindical? - Nossa expectativa é positiva. Há evidências de que setores do governo, no bojo das ações que promovemos em nossa defesa, acabaram reconhecendo que, efetivamente, a suspensão do registro foi arbitrária, e estão dando encaminhamentos no sentido de promover o levantamento dos conflitos na perspectiva da sua superação. Além disso, pela primeira desde 2003, o Ministério do Trabalho reconheceu as sentenças transitadas em favor do ANDES-SN no STJ e STF na década de 90. Essas decisões judiciais reconhecem nosso direito ao desmembramento da categoria dos professores do ensino superior da grande categoria genérica dos professores em qualquer nível. Acreditamos que nas próximas semanas recebamos a listagem das entidades que se manifestaram para começarmos a tratar cada um dos problemas junto à SRH. Mesmo que ainda seja necessário enfrentar limitações quanto aos setores onde temos pendências judiciais em curso, ou onde exista sobreposição com registros sindicais outorgados pelo ministério após 2003, temos convicção que é possível reverter a arbitrária suspensão havida em 2003.
Fonte: ANDES-SN, Elizângela Araújo, 20/02/2009.
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