Mobilidade acadêmica não é uma opção, é uma necessidade
Diretor científico da Fapesp defende que a mobilidade tanto de pesquisadores
quanto de alunos de graduação é necessária para o desenvolvimento e
descentralização da pesquisa no país Nesta quarta-feira [16], a 60ª Reunião Anual da SBPC foi palco de debate sobre a necessidade ou não de se promover a mobilidade acadêmica, tanto para graduandos como para pesquisadores. A visão do diretor científico da Fapesp, Carlos Henrique de Brito Cruz, é pragmática: a mobilidade acadêmica não é uma opção, é uma necessidade. "A ciência é um ato social e não individual. Neste sentido, é essencial a comunicação entre os cientistas. Ela acontece no café, nos congressos, quando se lê um paper, mas também quando você vai para um novo departamento, uma nova Universidade ou um novo país. Essa mobilidade é fundamental, mas ela ainda é pouco praticada no país", diz ele. Outra importância da mobilidade, a seu ver, é a desconcentração da produção científica. "A nossa ciência é muito heterogênea, 75% da produção está concentrada na região Sudeste e, principalmente, em SP. A mobilidade de pesquisadores é fundamental para o país e também para SP, devemos incentivar os cientistas da capital a partirem para o interior, mas para o sucesso dessas iniciativas é preciso ter oferta de vagas e condições para fixação dos pesquisadores". A Fapesp, diz ele, investe no programa Jovem Pesquisador em Centros Emergentes, que visa incentivar a mobilidade no começo da carreira científica, quando o pesquisador ainda não está estabilizado numa determinada posição. "Desde 97, já apoiamos cerca de mil bolsistas. 60% deles não foram para centros emergentes, mas foram alocados em novas linhas de pesquisa, os outros 40% foram atuar em centros ainda não consolidados e, ao contrário de previsões catastróficas, os resultados foram muito satisfatórios", disse. Uma forma de atratividade do programa é a facilidade de financiamento. "Esses bolsistas conseguem financiamentos mais vultosos do que pesquisadores titulares, porque eles precisam de mais recursos para montar laboratórios". A mobilidade entre pesquisadores não deve se restringir ao país, na visão de Brito Cruz. Ele defende que sejam atraídos para o país pesquisadores estrangeiros. "Se quisermos que a ciência brasileira progrida num ritmo ainda mais rápido, precisamos trazer os melhores cérebros de fora também. É importante este assunto ter entrado em pauta". Tão importante quanto a mobilidade de pesquisadores é a mobilidade de graduandos, que pode ser o início da solução do problema. "Se o estudante faz a graduação, o mestrado e o doutorado no mesmo lugar, fica mais difícil convencê-lo a procurar uma nova instituição. A Fapesp tenta que seus bolsistas façam estágios fora, mas ainda não tivemos muito sucesso". Uma das ações adotadas pela Fapesp para incentivar a mobilidade estudantil foi estabelecer que o período que um bolsista de mestrado passa fora do país não conta para o período de dois anos de bolsa, então ele poderia receber a bolsa por mais tempo. Também não é mais necessária uma prova de inglês para o estudante que quiser morar fora, basta a concordância do seu orientador. Antes restritas ao doutorado, essas novas regras valem também para os bolsistas de mestrado da fundação. Apesar de defender a necessidade da mobilidade, Brito Cruz enxerga uma série de gargalos que ainda precisam ser resolvidos. "Um problema sério é a falta de apoio institucional, uma infra-estrutura adequada de pesquisa para receber novos pesquisadores. Mesmo que eles recebam apoio do CNPq para montar um laboratório, como será depois de três anos? Como comprar reagentes, consertar equipamento, contratar técnicos e ter bons estudantes em seu grupo de pesquisa?". Ele cita ainda a falta de uma estrutura contábil e de administração para apoiar as prestações de contas de projetos contemplados em editais. "O pesquisador vai ter uma caixa de sapato onde ele guarda as notinhas e depois manda pra Fapesp? Não pode ser assim, ele precisa de uma infra-estrutura para que se preocupe apenas com a sua função, que é de pesquisar, fazer ciência." Outra questão é o ambiente acadêmico, diz ele. "Faz enorme diferença para o pesquisador se a Universidade valoriza o mérito ou se o amigo do chefe vai ganhar mais, ou se tem uma turma que monopoliza tudo". Ponto semelhante foi abordado por Clotilde Ferreira, professora titular aposentada da USP. Ela também falou contra o corporativismo, muitas vezes presente no ambiente universitário. "Estamos formando cada vez mais doutores, mas os concursos têm sido cada vez mais específicos e corporativos. Numa época em que estamos defendendo a interdisciplinaridade, há concursos que pedem perfil muito específico". Um exemplo dado por ela foi o de uma pesquisadora que teve sua inscrição num concurso rejeitada porque apesar de ter estudado educação infantil no mestrado e doutorado, área da vaga em disputa, o nome do programa é na área de psicologia. Outro exemplo são as áreas de farmacologia e fisiologia, diz ela. "O corporativismo está formando grupos monolíticos e isso vai acabar com a nossa ciência". Outro ponto abordado por ela foi a mobilidade de grupos e não só de indivíduos. "O estudante não aprende com um pesquisador, mas com um grupo, com a massa crítica, cada um é melhor em algo diferente. Uma andorinha só não faz verão e um cientista isolado não faz ciência", defendeu. Ela citou como exemplo a criação do Instituto Internacional de Neurociência de Natal. Segundo Clotilde, lá está havendo a preocupação de se formar um grupo de pesquisa. "É importante levar a infra-estrutura laboratorial e de recursos humanos para que a mobilidade tenha sucesso".
Fonte: SBPC, JC e-mail n. 3556, Luís Amorim, 17/7/08.
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