A ministra
criacionista
Marina Silva, do Meio Ambiente, mistura religião e ciência e defende o
ensino do criacionismo
A
ministra do meio ambiente, Marina Silva, tem
um dos cargos mais espinhosos do país. O avanço assustador do
desmatamento na Amazônia, a dificuldade em acabar com a corrupção no
Ibama e o trabalho de liberação de obras com impacto ambiental são
desafios desgastantes. Nos últimos dias, porém, Marina se meteu numa
outra polêmica. Ao participar do 3º Simpósio sobre Criacionismo e Mídia,
em São Paulo, ela equiparou o evolucionismo, a teoria mais aceita entre
os cientistas para explicar a evolução da vida na Terra, ao
criacionismo, a crença religiosa em que a vida foi criada por Deus
exatamente como descreve a Bíblia. Depois, em entrevista a um blog de
jovens adventistas, Marina – uma ex-candidata a freira que se tornou
evangélica e é missionária da igreja Assembléia de Deus desde 2004 –
defendeu o ensino nas escolas do criacionismo ao lado do evolucionismo.
O evolucionismo é
a teoria elaborada pelo naturalista britânico Charles Darwin
(1809-1882). Ela postula que todos os seres vivos têm um ancestral
comum, do qual derivaram todas as outras formas de vida por meio de um
processo que envolveu, ao longo de bilhões de anos, mutações graduais e
a seleção dos espécimes mais bem adaptados ao ambiente em que viviam. |
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A FÉ E ...
A ministra Marina Silva afirma
que “é impossível crer em Deus
sem acreditar que Ele criou tudo”. |
Diante das
evidências de registros fósseis e das pesquisas genéticas, a comunidade
científica aceita o evolucionismo como a melhor forma de descrever a
história da vida na Terra. Eis o que afirmou a respeito o geneticista
americano Francis Collins, um dos líderes do projeto Genoma Humano, que
desvendou a estrutura dos nossos genes: “Como alguém que assistiu à
emergência de nossa seqüência genética ao longo dos últimos anos e viu
como ela é semelhante a de outras espécies, a evidência é
avassaladoramente favorável a uma origem única da vida, em um processo
perfeitamente consistente com a visão de Darwin”. Detalhe: Collins
também é um religioso cristão. E ele afirma que o evolucionismo de
Darwin é perfeitamente compatível com a crença em Deus. |
... A CIÊNCIA
O naturalista britânico Charles Darwin, criador
da Teoria da Evolução
das Espécies. |
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Os defensores do
criacionismo ou do “design inteligente” – sua versão moderna, difundida
por grupos religiosos americanos – dizem que a teoria de Darwin é apenas
uma “teoria” entre outras possíveis para explicar a origem da vida. Eles
acreditam que apenas uma “força maior” seria capaz de criar seres tão
complexos quanto o homem. Para cientistas como Collins, afirmar – como
afirma a ministra Marina Silva – que o evolucionismo é uma “teoria”
entre tantas outras é fazer uma perigosa confusão semântica. “Em
ciência, uma teoria é uma coleção de observações reunidas numa visão
consistente”, diz Collins. “A teoria eletromagnética é um exemplo. O
termo ‘teoria’ não significa que ela ainda seja hipotética ou que não
esteja correta. A biologia não faz quase sentido algum sem o
evolucionismo para sustentá-la.” |
Ao dar ao criacionismo
o mesmo status do evolucionismo, Marina Silva comete uma perigosa confusão
entre fé e ciência. “Marina Silva está pura e simplesmente errada ao dizer
que não podemos explicar a natureza pela evolução darwiniana”, afirmou em
seu blog o jornalista Marcelo Leite, especializado em ciência e meio
ambiente. “Ela é a melhor explicação científica que existe. Nem a Bíblia nem
o ‘design inteligente’ podem ser colocados no mesmo plano como
conhecimento.”
Marina é um dos
símbolos do governo Lula. Filha de seringueiros, ela foi semi-analfabeta até
os 16 anos. Foi empregada doméstica, formou-se em História pela Universidade
Federal do Acre e tornou-se a mais jovem senadora do país. É uma
ambientalista respeitada e, por seu trabalho à frente do Ministério do Meio
Ambiente, o jornal britânico The Guardian a incluiu na lista das 50
personalidades que podem salvar o planeta de catástrofes ambientais
provocadas pelo aquecimento global.
No debate com os
criacionistas, Marina afirmou que há um conjunto de preceitos bíblicos de
proteção à natureza. Respondendo às perguntas do blog de jovens adventistas,
Marina disse que “é impossível crer em Deus sem acreditar que Ele criou
todas as coisas. E, se nós não sabemos explicar, não devemos ter a pretensão
de dizer que elas não existem. A fé é crermos mesmo sem entender (sic).
No espaço da fé, a ciência tem todo o acolhimento. Eu gostaria que a fé
tivesse o mesmo acolhimento da ciência”. Depois, ela afirmou que “não há
demérito” no ensino do criacionismo. As duas filhas mais novas da ministra
estudam em colégios adventistas, que ensinam o criacionismo.
Na gestão de Marina,
ela contratou o pastor Roberto Firmo Vieira, da Assembléia de Deus, como
consultor do ministério, por intermédio de um contrato mantido com o
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Segundo o site
Eco, Vieira usa a estrutura do ministério para cultos, alguns com a presença
da ministra. Na semana passada, ÉPOCA procurou a ministra para ouvi-la. Por
meio de sua assessoria, Marina informou que não falaria por problema de
agenda. Informou também que viajou a São Paulo com as despesas pagas pela
Assembléia de Deus.
Fonte: Rev. Época, thomas traumann, ed. 506,
28/1/2008.
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