MEC reprova 31% do ensino superior

 

 

3 em cada 10 instituições do país obtêm desempenho considerado inadequado; rede privada puxa a nota para baixo

 

O raio-X do ensino superior, divulgado ontem pelo Ministério da Educação, permite duas importantes conclusões: 

a) De cada dez instituições de ensino superior -ou seja, universidades, centro universitários e faculdades-, três têm nível inadequado (nota 1 ou 2). 

b) É a rede privada que puxa o resultado para baixo, com quase a totalidade (96%) das instituições com desempenho considerado insatisfatório. 

O raio-X faz parte do primeiro ranking oficial de instituições superiores, apresentado em Brasília pelo ministro Fernando Haddad (Educação). 

De todas as 1.448 instituições avaliadas, foram dadas notas baixas a 454 delas (31%). A que obteve a melhor nota é a Ebef (Escola Brasileira de Economia e Finanças), do Rio, que pertence à Fundação Getulio Vargas. 

Considerando apenas as universidades, a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) é a que obteve o melhor desempenho no levantamento. 

Outras 400 instituições não foram analisadas por serem novas e não terem turmas formadas ou porque pertencem à rede estadual e não aceitaram participar da avaliação -caso da USP (Universidade de São Paulo) e da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

Para chegar ao novo ranking, o MEC (Ministério da Educação) avaliou o nível de aprendizado dos formandos nos três últimos Enades (antigo Provão), a qualidade dos cursos de graduação e de pós (quando foi o caso), a titulação dos professores, a opinião dos alunos e a infra-estrutura física.

No final, chegou-se ao chamado IGC (índice geral de cursos. São notas que vão de zero a 500 e que, como resultado, enquadram as instituições em faixas de 1 (as piores, com nota de 0 a 94) a 5 (as melhores, com nota 395 a 500). As instituições consideradas ruins são as que ficaram nas faixas 1 e 2.

Fiscais 

O IGC será utilizado pelos fiscais do MEC que visitam as instituições periodicamente para avaliar se elas têm condição de abrir novos cursos e se os cursos que já são oferecidos podem seguir funcionando.

Até agora, de acordo com o governo, esses fiscais tinham poucos critérios objetivos para a fazer avaliação. Eles agora chegarão às instituições com dados concretos.

Dessa forma, para abrir um curso novo, a instituição não terá apenas a sua proposta de curso considerada. Se a instituição como um todo for ruim, ela, diz o governo, dificilmente terá sucesso na ampliação.

"Por que vamos dar nova autorização se ela está fazendo mau uso das que já têm?", diz Haddad. "No limite, as instituições mal avaliadas poderão ser descredenciadas."

A situação é pior entre as faculdades. Das 1.144 avaliadas, 429 tiveram nota 1 ou 2. De 131 centros universitários, 16 foram mal avaliados. E, de 173 universidades, só nove tiveram nível crítico.

USP e Unicamp

Haddad lamentou o fato de a USP e a Unicamp não participarem das avaliações do MEC. Elas não são obrigadas a isso, pois pertencem à rede estadual. Respondem ao MEC as instituições federais e as privadas.

"Lamento a ausência delas, pois teriam um excepcional desempenho e se tornariam referência", afirmou Haddad.

O ex-presidente do Inep (órgão do MEC responsável pelas avaliações) Otaviano Helene diz que o critério mais fidedigno de avaliação é o de cursos, não o de instituições.

"Numa região pobre, por exemplo, o curso pode ser ótimo, mas os alunos são fracos, já que tiveram uma formação escolar deficiente. O curso não deixa de ser bom por isso."

FGV do Rio obtém a maior nota no ranking do MEC 

As faculdades privadas com foco em uma determinada área foram as que obtiveram as quatro maiores notas no índice geral de cursos, indicador do MEC que busca avaliar a qualidade das escolas superiores. 

A líder foi a Escola Brasileira de Economia e Finanças, da FGV do Rio, que ficou com 483 pontos em 500 possíveis, acima dos 439 pontos da Unifesp, líder na categoria universidades. Em seguida vieram a Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic (Campinas), com 482; a Escola de Administração da FGV do Rio (467); e a Escola de Administração da FGV de São Paulo (458).

"Essas escolas são como butiques. Quem pode pagar vai ter um ensino de altíssima qualidade, pois elas têm graduação e pós-graduação muito fortes, com boa infra-estrutura e corpo docente", disse o pesquisador Oscar Hipólito, do Instituto Lobo e ex-diretor do Instituto de Física da USP-São Carlos.

Em geral, as mensalidades passam dos R$ 1.000 - a Escola de Economia da FGV do Rio, por exemplo, cobra R$ 1.320; o curso de administração da FGV de SP, mais de R$ 2.000.

"Elas conseguem alto grau de especialização por serem focadas. Por outro lado, os alunos não têm um convívio com outras áreas, como em uma universidade", disse Hipólito.

Segundo Carlos Ivan Simonsen Leal, presidente da FGV, os resultados não surpreendem. No caso da escola com melhor avaliação (economia e finanças), ele diz que o vestibular é rigoroso. "Poderíamos ter mais alunos, mas fazemos um processo de seleção rigoroso porque o objetivo é formar os melhores. Queremos ser reconhecidos como um curso de excelência internacional", diz ele.

Se por um lado as faculdades estão entre as instituições top do país, 28,1% dessas escolas obtiveram conceitos 1 ou 2 (os mais baixos).

"Esse tipo de organização possui os extremos, pois toda instituição tem de começar como faculdade. Por isso, muitas escolas são novas, sem a devida estrutura", disse Hipólito.

Das 21 instituições que obtiveram conceito 5 (o maior, com notas entre 395 e 500), apenas três são universidades.

As universidades possuem mais autonomia para abrir cursos e vagas, mas têm de cumprir exigências como contar com um terço do corpo docente com a titulação de mestre ou doutor. Já as faculdades não precisam cumprir regras como essa, mas precisam de autorização do MEC para abrir cursos.

As 5 maiores universidades obtêm nota 3 

As cinco maiores universidades do país ficaram entre as 40 últimas no índice geral de cursos. Juntas, elas têm 20% dos alunos do setor. Apesar de estarem no grupo das piores, essas grandes escolas ficaram com conceito 3 (entre 195 a 294 pontos), considerado como mediano pelo governo federal. 

No total, 173 universidades foram avaliadas. Entre as cinco maiores em matrículas, a Estácio de Sá (Rio) foi a mais bem posicionada: segunda maior instituição do país, ela ficou em 132º lugar no ranking. 

A pior do grupo foi a Uniban (quarta em matrículas e 164ª na listagem). A Unip, que possui o maior número de estudantes do Brasil, ficou na 154ª posição. A Uninove é a terceira em matrículas e 145ª no ranking. A Universo, 158ª no ranking, é a quinta em matrículas.

A partir de uma guerra de preços nas mensalidades, o crescimento dessas cinco instituições é quase três vezes maior do que a média das outras escolas, conforme a Folha informou em janeiro passado.

"As universidades maiores têm, por natureza, mais dificuldades para manter o padrão de qualidade. Mas, em um país pobre como o nosso, elas são importantes para ampliar as matrículas", disse o pesquisador Oscar Hipólito, do Instituto Lobo e ex-diretor do Instituto de Física da USP-São Carlos.

Avaliação semelhante tem Nelson Pretto, da Faculdade da Educação da Universidade Federal da Bahia. Ele defende aumento de investimento nas universidades públicas para melhorar a qualidade do ensino. Ele diz, porém, que enquanto isso não ocorre, o setor privado democratiza o ensino.

Por outro lado, afirma que "apenas certificar o jovem, sem que ele tenha uma formação adequada para a cidadania e o trabalho, é lamentável".

Outro lado 

A Uninove disse considerar um fato positivo ocupar a faixa 3 na medição. Para a entidade, se fossem considerados dados mais atualizados, "a instituição teria, certamente, uma pontuação diferenciada por realizar melhorias contínuas".

A Uninove cita como exemplos o crescimento de dois programas de mestrado na época da avaliação para três, atualmente, e dois de doutorado, "salto que reflete o contínuo investimento em pesquisa e produção acadêmica".

A Estácio de Sá disse, em nota, reconhecer o ranking, mas que prefere analisar os resultados quando os dados completos forem divulgados.

A Universo (Universidade Salgado de Oliveira), do Rio de Janeiro, a Unip e a Uniban não responderam até a conclusão desta edição.

 

Fonte: Folha de S. Paulo, 9/9/08

 


Coletânea de artigos


Home