Lula defende reforma sindical 

 

No pátio da Volkswagen, o presidente chama os sindicalistas para
debater com ele mudanças na legislação trabalhista.
Contrariando PTB e centrais, diz que legislação
 é cópia do modelo fascista
 

 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu encarar os setores trabalhistas que se posicionam contra a reforma sindical. Ao participar de uma festa na Volkswagen, em comemoração à marca de 15 milhões de veículos fabricados no país atingida pela montadora, Lula fez uma veemente defesa das modificações que seu governo está propondo. “Não é mais possível que alguém defenda a atual estrutura sindical brasileira”, disse o presidente. Ao lado de várias autoridades, como o ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, e o governador de São Paulo, o tucano Geraldo Alckmin, Lula disse que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), elaborada por Getúlio Vargas, é uma cópia da Carta del Lavoro, assinada pelo ex-ditador italiano Benito Mussolini durante o regime fascista. O presidente convidou os sindicalistas para debater o tema com ele. “As reformas são necessárias e espero que o movimento sindical me convoque para discutir as coisas que precisam ser feitas”, afirmou.

O tamanho da polêmica é tão grande que há oposição quanto ao tema dentro do próprio PT. Em resposta a Lula, o ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), disse que trazer esse tema à discussão agora “não é conveniente” (leia abaixo). Durante seu discurso na Volkswagen, Lula ouviu protestos dos trabalhadores da empresa, que, por meio de faixas, cobravam a correção da tabela do Imposto de Renda (IR) e uma reforma sindical e trabalhista que preserve os direitos dos trabalhadores. Lula não perdeu a pose.

Disse que o PT e o governo ajudaram a consolidar o processo democrático. E é por isso que os trabalhadores podiam levantar faixas para serem vistas por todos. Ficou clara, no entanto, a dificuldade política da aprovação da reforma.

O projeto que foi entregue ao Congresso por Berzoini, propõe pontos polêmicos como o fim da unicidade sindical (a obrigatoriedade de haver apenas um sindicato por categoria em cada base) e o fim do imposto sindical. Embora o PT tenha pregado tais pontos ao longo da sua história, o projeto sofre oposição dentro do partido e em setores das duas principais centrais sindicais, Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Força Sindical. E é bombardeado pelos partidos que seguem a doutrina de Vargas, o PDT, oposicionista, e o PTB, aliado. Ontem à noite, inclusive, o PTB criticou a reforma, em seu programa eleitoral na TV.

Além da defesa da reforma sindical, o presidente apoiou o cooperativismo. Literalmente. Ele e sua mulher, Maria Letícia, filiaram-se à Cooperativa de Crédito dos Metalúrgicos do ABC (CredABC). A adesão pouco antes da festa na Volkswagen (a montadora fica praticamente ao lado da sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campos). Ao falar da adesão à Cooperativa de Crédito dos Metalúrgicos do ABC, o presidente Lula disse que pretendia, com essa atitude, estimular as pessoas a fazerem o mesmo. Sou amante das cooperativas e o meu sonho é que o Brasil tenha a predominância de várias cooperativas, disse ele, citando como exemplo as cooperativas empresariais e de trabalhadores.

Câmbio

Aos empresários da Volkswagen, o presidente falou do câmbio brasileiro com relação ao dólar. Foi uma resposta ao próprio presidente da montadora, Hans-Christian Maergner, que classificou a atual cotação do real frente ao dólar como “uma catástrofe”, uma vez que leva o país a exportar menos. Lula reconheceu que existem muitas queixas dos setores industriais com relação ao atual patamar do câmbio. Porém, ele destacou que este não é um problema que pode ser resolvido do jeito que alguns imaginam, porque é um problema da política americana, que vem forçando uma baixa no valor da moeda.  

“Apesar do câmbio que muita gente fala, acho que deveríamos fazer uma comitiva para se queixar do câmbio aonde efetivamente é a razão da desvalorização do dólar, que é um problema com a política americana e não é um problema que nós podemos resolver do jeito que alguns imaginam.”, disse Lula. “Mesmo com o câmbio da forma que está, salvo alguns setores da indústria brasileira, o restante está exportando bem e o resultado é a balança comercial (divulgada hoje, com superávit de US$ 3,876 bilhões em abril).”

A respeito das exportações, Lula, em seu programa de rádio Café com o Presidente, disse que pretende abrir caminho para novos mercados exportados na viagem que fará à Coréia e ao Japão ainda este mês. “O Brasil estava há 28 anos tentando vender manga para o Japão. E o Japão não comprava manga porque tinha o bicho da mosca”, afirmou.

“Agora, quero convidar o primeiro-ministro para comer um churrasco. E oferecer uma boa picanha, uma boa costela, uma boa maminha, para ele falar: puxa vida, essa carne aqui é extraordinária. Não tem por que o Japão não comprar a carne do Brasil.”, concluiu.

A busca de novos mercados, como Japão e Coréia, faz parte de uma estratégia, segundo o presidente, para encontrar alternativas aos compradores tradicionais. “É preciso convencer outros mercados a comprar os produtos brasileiros”. 
 


João Paulo contesta
 

Veio de um petista a reposta mais rápida à defesa feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva da reforma sindical. Enquanto Lula pregava o enfrentamento do tema, o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) posicionava-se contra. Para João Paulo, este não é o melhor momento para se discutir uma reforma polêmica como essa. “Apesar de a estrutura sindical precisar ser renovada, não é bom para o partido e para o governo tocar o assunto à frente”, disse João Paulo.

Para o deputado, o governo não pode simplesmente ignorar o clima conturbado que vive hoje com sua base de sustentação no Congresso. “Há uma certa instabilidade política no Congresso e não é hora, portanto, de querer insistir que um assunto que não agrega, divide”, defendeu João Paulo. O ex-presidente da Câmara lembrou que o assunto não tem consenso nas centrais sindicais e também não tem alcançado a compreensão da sociedade. Sofre, inclusive, a oposição do próprio presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE).

O presidente do PT, José Genoino, também reconheceu que o tema espinhoso. Mas, ao contrário de João Paulo, defende que a reforma seja enfrentada, uma vez que, na sua opinião, a atual estrutura sindical brasileira é “pelega e antiquada”. Para Genoino, o PT deve ajudar o governo a enfrentar esse tema.

Momento tenso

A diferença de posicionamentos entre João Paulo e Genoino revela o tenso momento vivido pelo PT, diante da possibilidade de antecipação das discussões em torno das candidaturas do partido aos governos estaduais. No meio petista, avalia-se que, desde que foi preterido para a Coordenação Política na reforma ministerial, João Paulo percebeu que não será o candidato da cúpula governista na disputa. Esse posto pertence ao líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Por isso, João Paulo tem procurado acentuar uma posição de contraponto ao governo, buscando ampliar seus apoios nas bases partidárias. Além de João Paulo e Mercadante, ambiciona também o posto de candidata à sucessão do tucano Geraldo Alckmin a ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy.

Os mesmos problemas podem acontecer em outros estados. Por isso, foram necessárias seis horas de reunião da executiva do PT e a presença do ministro da Casa Civil, José Dirceu, para tentar convencer as lideranças do partido a evitar a antecipação eleitoral na disputa pelos governos estaduais, que pode minar os planos do PT de ampliar a aliança em torno da candidatura à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.  

O pacto de adiamento será redigido pelo próprio Genoíno, como uma recomendação da executiva a ser votada na reunião do diretório nacional marcada para 21 e 22 de maio. O esboço do texto traçado ontem sugere que seja impedida a realização de prévias estaduais até 18 de setembro (data da eleição do próximo presidente nacional) e que seja evitado qualquer lançamento de pré-candidatura também por partidos aliados.

 

Fonte: Correio Braziliense, 03/05/2005.


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