Educação
A
escola campeã no ranking do MEC segue uma cartilha que deu certo em outros
países:
O bom desempenho do Instituto Dom Barreto deve-se, em boa parte, ao investimento na formação e atualização dos professores. Eles não lecionam sem antes assistir a aulas com os próprios autores dos livros didáticos, contratados pela escola para ensiná-los a fazer o melhor uso do material. São obrigados também a reservar uma hora do dia à confecção de um detalhado roteiro para a aula. Uma visita ao Dom Barreto revela um fato ainda mais incomum: longe das lamúrias típicas da classe, os professores de lá se declaram satisfeitos – 80% estão na escola há mais de uma década. Outro termômetro do contentamento geral vem de relatos como o da coordenadora Terezinha Ferreira, 42 anos, há dezoito no colégio. Ela conta que teve duas especializações e um mestrado patrocinados pela escola. Detalhe: ao longo de quatro anos, sua carga horária foi suavizada para que conseguisse dar conta dos cursos. "Eu relatava essa história a colegas de outras escolas e eles achavam que eu estava mentindo", lembra Terezinha. Os professores do Dom Barreto também concorrem a um prêmio anual, dado ao melhor profissional em sala de aula, com base nas notas dos alunos. O campeão deste ano receberá uma viagem à Europa. Ao contrário do que ocorre na maioria das escolas do país, o mérito é reconhecido – e estimulado. Os maus resultados, por sua vez, ficam em evidência.
As escolas de sucesso na prova do MEC são exceção num universo marcado por maus exemplos. Num patamar que se situa entre o "ruim" e o "péssimo", aparecem instituições como o Colégio de Vila Gustavo, na periferia da capital paulista – a última colocada entre as particulares urbanas do estado de São Paulo, com média 30,62 numa escala de 0 a 100. Sim, a melhor escola brasileira está no Piauí, um dos estados mais pobres do país, e uma das piores localiza-se em São Paulo, o mais rico. A diferença entre elas, no entanto, é muito maior. No Colégio de Vila Gustavo, as salas vivem vazias – professores e alunos têm o hábito de matar aula. O geógrafo Carlos Ribeiro, há um ano diretor da escola, reconhece o desânimo geral, problema que ele atribui às aulas, "monótonas" e baseadas na "decoreba". "É uma vergonha", admite Ribeiro. Outras comparações entre a escola de Teresina e a da periferia de São Paulo ajudam a jogar luz sobre o abismo que as separa. Enquanto no Dom Barreto os professores utilizam uma lousa eletrônica para apresentar aos alunos formas geométricas, no Vila Gustavo o laboratório de computação está desativado. A escola do Piauí possui a maior biblioteca do estado. Na escola de São Paulo, os livros ficavam alojados, até pouco tempo atrás, num porão que espantava as pessoas por ser escuro e malcheiroso – agora estão encaixotados à espera de uma nova biblioteca. No Piauí, exige-se dos estudantes a leitura de vinte livros por ano. Em São Paulo, os alunos é que escolhem se lêem – ou não. E é claro que a maioria não lê nada.
Com o relatório do
Enem nas mãos, as diretoras do Instituto Dom Barreto ficariam apavoradas.
Criado em 1998 para medir o nível dos estudantes ao final do ciclo escolar,
o exame do MEC revelou que, além de sofrível, a qualidade do ensino ainda
experimenta uma trajetória de queda desde 2002. A prova, que testa a
capacidade do aluno de aplicar o saber teórico a situações práticas, mostrou
que os estudantes brasileiros estão a léguas de distância disso: enquanto
98% dos alunos da escola campeã do Piauí conseguem vaga nas melhores
universidades do país, quase metade dos jovens no Brasil ainda empaca na
leitura de um texto simples. Diz o ex-ministro da Educação Paulo Renato
Souza: "A educação brasileira só vai deixar de ficar em último lugar quando
for implantado no país um sistema que premie as melhores escolas e penalize
as que oferecem ensino de terceira linha". Por enquanto, o Enem serve apenas
para revelar exemplos solitários de sucesso, como o Instituto Dom Barreto –
e dar a dimensão do desastre nacional.
Fonte: Rev. Veja, Monica Weinberg e Marcos Todeschini, ed. 1997, 28/2/2007. |