O jogo sujo da Petrobras na América Latina
Denúncias de
danos a comunidades e ao ambiente revelam
práticas Danos ao meio ambiente, desrespeito a comunidades indígenas e camponesas e violação dos direitos dos trabalhadores. Uma folha corrida como essa poderia ser facilmente atribuída a qualquer transnacional atuante em países em desenvolvimento. Mas tal histórico de abusos agora deve, também, ser contabilizado na conta da Petrobras. A Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), por meio do Projeto Brasil Sustentável e Democrático, lançou recentemente o livro-denúncia Petrobras: integración o explotación? (Petrobras: integração ou exploração?), obra em cujas 130 páginas estão descritos os impactos decorrentes da atuação da estatal brasileira de petróleo em cinco países da América do Sul: Argentina, Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. A idéia do livro surgiu com as denúncias recebidas pela Rede Brasileira de Justiça Ambiental, da qual a Fase faz parte. Movimentos sociais equatorianos revelaram que a Petrobras vinha causando danos ao ambiente e às populações locais com atividades de exploração de petróleo. As organizações temiam também a pretensão da empresa em atuar no Parque Nacional Yasuni, onde há uma reserva do povo indígena Huaorani. A partir daí, Rede quis saber das demais organizações sul-americanas com as quais tinha contato de que maneira viam a atuação da Petrobras em seus respectivos países. DUAS CARAS Julianna Malerba, técnica da Fase e uma das organizadoras do livro, diz que a estatal brasileira utiliza, nos países sul-americanos, um padrão diferente do adotado no Brasil, terceirizando, aproveitando-se de brechas na legislação. “E o mais importante, não dando atenção necessária aos conflitos com as populações afetadas e não se importando com conflitos potenciais que podem acontecer em áreas frágeis, como territórios indígenas”, aponta Julianna. A explicação? Na opinião de Julianna, a política de integração equivocada do governo brasileiro. “A integração energética e a de transportes têm sido prioridade, mas com o objetivo de exportar recursos naturais. Por exemplo: abrem-se hidrovias para exportação de soja”, diz. Segundo a técnica da Fase, o papel da sociedade civil organizada é o de reivindicar outro tipo de política, que privilegie “não uma integração de mercado, mas uma integração de projetos socioculturais, que não desconsidere grupos que tenham uma outra percepção, uma outra relação com o ambiente”. Elizabeth Bravo, pesquisadora da Oilwatch, do Equador, e uma das autoras do livro, disse ao Brasil de Fato que o início da atividade da Petrobras no bloco 31 - onde se encontram o Parque Nacional Yasuni e o território indígena Huaorani - irá afetar algumas comunidades da região, já que será preciso construir algum tipo de infra-estrutura. “A operação petroleira nunca pode ser compatível com a conservação de uma área protegida, muito menos com os direitos coletivos e a sustentabilidade das comunidades indígenas, sobretudo de povos da selva, que há 50 anos não tinham contato com o mundo exterior”, diz. FLEXIBILIZAÇÃO Em julho de 2005, o Ministério do Meio Ambiente equatoriano suspendeu a licença ambiental para a exploração da área, concedida à Petrobras no governo anterior, de Lucio Gutiérrez. De acordo com Elizabeth, existe um documento de agosto do mesmo ano dizendo que o governo do Brasil estava pressionando o do Equador para que este liberasse a licença ambiental. Na Argentina, a atuação vai além dos danos ao ambiente. Os movimentos sociais daquele país acusam a estatal brasileira de também violar os direitos de seus funcionários. Trabalhadores de uma refinaria da empresa em Bahía Blanca denunciam, por exemplo, a flexibilização das relações trabalhistas e a terceirização de algumas operações. Além disso, há relatos de acidentes de trabalho e de fadigas causadas pela exigência de turnos rotativos. Laura Calderón, estudante de filosofia da Universidade de Buenos Aires, e Hernán Scandizzo, jornalista do Colectivo Pueblos Originarios de Indymedia Argentina, também autores do livro, afi rmaram ao Brasil de Fato que a forma de atuação da Petrobras na Argentina se explica pelos lucros que a empresa brasileira alcança no país. Ou seja, persegue os mesmos objetivos de qualquer transnacional: “Aumentar permanentemente sua rentabilidade a qualquer preço, seja este flexibilizar seus trabalhadores, terceirizar a produção ou não tomar os cuidados ambientais necessários na exploração, refino e transporte de seus produtos”, relatam. HEGEMONIA BRASILEIRA Além disso, para eles, o controle de boa parte do petróleo argentino pela Petrobras traz também um grave problema geopolítico, uma vez que se “acentua a relação assimétrica entre ambos países e demonstra uma vez mais que a integração regional não se dará em termos de paridade, mas consolidará a hegemonia brasileira sobre o restante dos integrantes do Mercosul”. Na Colômbia, a Petrobras é acusada de perfurar poços próximos a nascentes de rios e superexplorar as águas do Rio Sumapaz, na região de Melgar. Na Bolívia, uma planta de produção de gás da empresa vem causando impactos devido às aberturas de poços e à contaminação do Rio San Alberto por resíduos da operação de processamento. No Peru, a estatal brasileira pretende explorar o gás em áreas próximas à reserva indígena Nahua Kugapaori, pondo em risco o espaço usado por povos que vivem isolados. Em nota enviada à Agência Brasil, a Petrobras negou todas as acusações feitas no livro. Afirma que suas atividades não causam danos ao ambiente e que mantém bom relacionamento com as comunidades adjacentes às áreas de exploração, inclusive com investimentos em projetos sociais. O livro custa R$ 5 e pode ser adquirido, por enquanto, somente em espanhol, pela página da Fase na internet: <http://www.fase.org.br/loja>. Uma versão em pdf pode ser baixada pelo endereço:
<http://www2.fase.org.br/acervo_fase_rits/petrobras.pdf>. Fonte: Ag. BrasildeFato, Igor Ojeda, 23/03/2006. |