“Impunidade, corrupção
e violência andam juntas”
Para o antropólogo, faltam ao país homens públicos que dêem exemplo de ética e honestidade
Ao contrário, segundo ele, os governantes e as autoridades têm sido cúmplices da impunidade no país. Ele criticou o presidente Lula, por não ter condenado publicamente os acusados de corrupção em seu governo. − O senhor já disse que a impunidade é uma das causas da corrupção no país. A corrupção também ajuda a manter a impunidade? Impunidade, corrupção e violência caminham juntas, estão interligadas. A sociedade brasileira está impregnada desses três males. As pessoas que vivem de pilhar o país, de desviar dinheiro público, usam da violência para garantir seus esquemas ilegais, de saque da nação. Por outro lado, para que possam atuar, têm que continuar impunes. − Como os corruptos conseguem se manter impunes e no poder? Em termos antropológicos, o problema é que existem na sociedade brasileira grupos que ocupam posições-chave e que vivem do saque. Isso pode ter começado no Brasil Colônia, mas piora bastante em tempos mais recentes. Houve até momentos ou períodos da história em que havia, por razões institucionais ou pessoais, maior resistência contra a corrupção. Um exemplo é Dom Pedro II, pela posição que ocupava. Ele tentava dar um exemplo de honestidade, de ser contra a corrupção, o abuso do poder. Mas o saque aos cofres públicos é constante na história. Tem o caso das empreiteiras. − Falando em empreiteiras, falta punição também aos corruptores? Claro. Há grandes interesses econômicos em jogo. Qualquer grande empreendimento que se anuncie, aparece para esses grupos como oportunidade de lucro. Infelizmente, a corrupção, a predominância de interesses de pilhagem, a ausência de ética e de espírito público estão disseminados na sociedade. − Voltando às empreiteiras, os esquemas que foram descobertos no governo Collor não foram desfeitos. As empreiteiras tinham papel fundamental no processo de corrupção, estavam infiltradas no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. O PC Farias foi assassinado, a mulher dele morreu em circunstâncias estranhíssimas. Nada foi apurado até hoje. O Brasil está carente de homens públicos que sirvam de exemplo? Existe uma crise generalizada. As nossas elites políticas estão desmoralizadas. Encontramos aqui e ali, no Legislativo, no Judiciário e no Executivo, alguns exemplos. Quando as pessoas não estão envolvidas diretamente em algum escândalo, são cúmplices da impunidade. Quando um governante deixa de investir em segurança, é cúmplice da violência. No Congresso, há uma ação corporativa de proteção, de tentativa de esvaziar as crises. No governo Lula, pessoas foram acusadas de corrupção e o presidente, em vez de condenar, passou a mão na cabeça delas. E agora ainda reclama que falam mal do Brasil no exterior.
* Gilberto Velho possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1968), especialização em Antropologia pela University of Texas System (1971), mestrado em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1970) e doutorado em Ciências Humanas pela Universidade de São Paulo (1975).
Fonte: O Globo, Cláudia Lamego, 20/6/2007. |
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