Graduação supera pós no ensino a distância

          
 

Opção já chega a 45% do total de alunos em cursos não presenciais
 

Pela primeira vez desde o surgimento do ensino a distância no Brasil, há mais estudantes inscritos em cursos de graduação do que de especialização nessa modalidade. Lançada inicialmente por instituições públicas, como a Universidade de Brasília (UnB), a graduação a distância já soma 349 credenciados pelo Ministério da Educação (MEC). São 430 mil alunos, que representam 45% do total de pessoas que fazem algum tipo de curso não presencial. Em 2000, comparativamente, havia só 10 cursos e cerca de 8 mil matriculados.

Na pós-graduação, são 255 cursos, com 390 mil alunos. Os dados estão no Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância (AbraEAD), que será divulgado na quarta-feira (23/4). Os números indicam uma mudança de perfil nessa modalidade de ensino, tradicionalmente aceita e difundida na pós-graduação lato sensu, conhecida como especialização ou extensão universitária. Isso porque esses cursos estão sujeitos a um número menor de exigências para funcionarem e têm duração mais curta, geralmente de um ano.

“O crescimento da graduação indica uma maturidade do sistema de ensino a distância”, diz Fábio Sanches, coordenador do anuário. “A graduação é a base de uma universidade e seus alunos são diferenciados, portanto, a adesão mostra que o sistema ganhou credibilidade.”

Apesar de ainda ser visto com certas dúvidas, avaliações do sistema têm mostrado bons resultados. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), órgão ligado ao MEC, mostrou que estudantes a distância se saíram melhor do que alunos presenciais em 7 de 13 graduações avaliadas no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), incluindo Administração, Biologia, Ciências Sociais e Física. Nos outros 6 cursos, entre eles Ciências Contábeis, História e Geografia, as notas dos grupos são semelhantes.

Parte da explicação para o bom desempenho pode estar no próprio perfil do aluno: média de 30 a 35 anos, casado, com filhos, oriundo da escola pública, com renda até três salários mínimos e que trabalha durante o dia.

“Os alunos já estão no mercado de trabalho, não conseguiram concluir uma faculdade quando eram mais jovens ou já estão formados em outra área”, afirma Luciano Sathler, pró-reitor de Educação a Distância da Universidade Metodista de São Paulo, que oferece 11 cursos a distância. “Em geral, é um público mais disciplinado, mais dedicado, porque o ensino a distância é a oportunidade que ele tem”, diz.

Formada em Matemática na primeira turma de ensino a distância da Universidade Federal Fluminense (UFF), Dayselane Pimenta, de 31 anos, trabalha como professora numa escola estadual e já engatou um mestrado na Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF).

Ela conta que, na época que decidiu estudar, morava na zona rural e trabalhava numa escola local. Se quisesse tentar uma graduação presencial, teria de andar de bicicleta até a zona urbana e pegar um ônibus de mais de uma hora até Itaperuna, a cidade mais próxima onde havia faculdade. Casada, ela tem dois filhos e conta que, mesmo que tivesse tempo para isso, não teria como pagar uma instituição particular.

“O curso é muito apertado. Às vezes, as pessoas pensam que é um curso por correspondência. Não tem nada a ver. Exige muita disciplina, tem de cumprir os cronogramas. O tutor só esclarece as dúvidas. Você precisa se organizar”, diz.

Durante a semana, Dayselane estudava com as apostilas e pela plataforma na Internet. Nos finais de semana, ia aos pólos presenciais. “Hoje, eu vejo como as pessoas que fizeram cursos presenciais muitas vezes ficam admiradas ao ver que a gente sabe as coisas com profundidade. Como não temos a figura do ‘professor da disciplina’, precisamos entender tudo para ir bem nas provas.”

A maior parte dos cursos no Brasil funciona nesse modelo: uma plataforma na Internet na qual os alunos acessam as aulas e os conteúdos, complementados por apostilas ou livros impressos, e pólos presenciais com a presença de professores tutores para tirar dúvidas.

Em boa parte dos casos, como na Universidade Metodista, os tutores são também professores dos cursos presenciais da instituição e os pólos se espalham para todas as cidades em que há alunos. O sistema de avaliações muda bastante de instituição para instituição, mas 58% delas usam provas escritas presenciais.

Formação de professor

Várias universidades federais já oferecem graduação a distância, principalmente para cursos de licenciaturas. O modelo também é adotado pelo próprio MEC, na Universidade Aberta do Brasil, para formar professores para a rede pública de educação básica. Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), há dois tipos de ensino a distância: um para professores da rede estadual, financiado pelo Estado, e outro aberto para todos, financiado pelo governo federal e prefeituras.

“Nos dois programas, o objetivo principal é atender a grande demanda de professores. Algo que seria impossível só com a educação presencial”, analisa Carmela Maria Polito Braga, pró-reitora adjunta de graduação da UFMG. “Como uma professora que é casada, tem filhos e mora no interior pode vir para a capital e cursar uma faculdade? Também não podemos levar os professores para lá.Consideramos que é um compromisso da universidade formar essas pessoas.”

Na UFRJ, os primeiros cursos nasceram em meio a polêmica e críticas. “Houve resistência de alguns professores porque pensavam que não seria possível garantir a qualidade do ensino. Demorou dois anos e meio para o projeto ser aprovado”, conta Masako Massuda, presidente da Fundação Cecierj/Consórcio Cederj, órgão do governo do Rio responsável pela educação a distância, que trabalha em parceria com seis universidades públicas, federais e estaduais.

 

Fonte: O Estado de S. Paulo, Simone Iwasso e Alexandre Gonçalves, 21/4/2008.

 


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